Muraro – O Incrível Muraro (1958)

Boa noite, meus caríssimos amigos cultos e ocultos! Estou aqui cheio de discos interessantes para ‘aplicar’ vocês, mas como sempre me falta o essencial, o tempo. No momento em que estou escrevendo este ‘post’, também estou digitalizando o disco de hoje. Não dá nem para ouvir antes e depois deixar as minhas impressões 🙂 Estou postando aqui este álbum lançado pelo selo SBA, certamente uma coletânea de fonogramas, com o pianista argentino Heriberto Leandro Muraro, figura de destaque no cenário da música nacional nos anos 40 e 50. E conforme nosso resenhista de plantão, Samuel Machado Filho, já o havia nos apresentado na série Grand Record Brazil: Este ilustre “hermano” aportou em terras brasileiras em 1932, logo se apaixonando pela nossa terra. Por décadas a fio percorreu todo o país exercendo sua arte de exímio pianista, excursionando em seguida por Portugal, Espanha, França, Inglaterra e Itália com repertório de música brasileira. No rádio, atuou nas emissoras cariocas Mayrink Veiga, Nacional e Globo, na Record de São Paulo e na Farroupilha de Porto Alegre. Dirigiu a lendária Nacional por 18 anos, impulsionando a carreira de nomes como Dircinha Batista, Nélson Gonçalves, Joel e Gaúcho, e as irmãs Cármen e Aurora Miranda. Gravou seu primeiro disco na Victor, em 1939, solando ao piano, em ritmo de fox, os sambas “O homem sem mulher não vale nada” e “Meu consolo é você”, hits do carnaval daquele ano na voz de Orlando Silva. Foram mais de trinta discos gravados, entre 78 rpm e Lps.
Neste obscuro lançamento deste também pouco conhecido selo, o SBA, vamos encontrar Muraro, acompanhado de orquestra, interpretando obras de Ernesto Nazareth e de Catulo da Paixão Cearense. Sem dúvida, um disco muito interessante que os amigos precisam conferir

cabôca di caxangá
aruê! aruá!
beija flor
ontem ao luar
guerreiro
vesper
luar do sertão
cruz.. prerigo
sagaz
nasci para te amar
pierrot
apollonia pinto
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A Música De Wilson Batista (Parte 1) – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 77 (2013)

Em sua edição de número 77, o Grand Record Brazil inicia uma retrospectiva dedicada a um dos maiores compositores que o Brasil já teve, cujo centenário de nascimento é comemorado neste 2013 que ora finda: Wilson Batista. Batizado como Wilson Batista de Oliveira, nosso focalizado nasceu na cidade de Campos, litoral fluminense, no dia 3 de julho de 1913. Filho de um humilde pintor de paredes, funcionário da guarda municipal da cidade, João Batista de Oliveira, e de Isaurinha Alves de Oliveira, ainda menino participou, tocando triângulo, da Lira de Apolo, banda organizada por seu tio, o maestro Ovídio Batista. Era mulato, tinha 1,65m de altura, cabelos ondulados e rosto fino. Ainda em seu berço natal, participou do Bloco Corbeille de Flores, para o qual fez várias composições. Ainda frequentou o Instituto de Artes e Ofícios de Campos, visando se habilitar no ofício de marceneiro, mas sem oportunidade de adquirir muita instrução.  Assinava seu nome com grande esforço, e a coisa ficava ainda mais difícil na hora de escrever um bilhete. No entanto, era capaz de escrever poemas com grande facilidade. Em 1929, mudou-se sozinho para o Rio de Janeiro, disposto a ganhar a vida como compositor, e indo morar por algum tempo com seu tio, que era funcionário da limpeza pública. Logo que chegou ao Rio, chegou a trabalhar como acendedor de lampiões da Light, mas por pouco tempo, pois tinha dificuldade de se adaptar a empregos. Nessa ocasião, passou a frequentar os cabarés da Lapa e o bar Esquina do Pecado, na Praça Tiradentes, pontos de encontro de marginais e compositores, tornando-se amigo dos irmãos Meira, malandros famosos da época, o que lhe rendeu várias prisões. A seguir, começa a trabalhar como eletricista e auxiliar de contra-regra no Teatro Recreio.  Fez seu primeiro samba aos 16 anos, “Na estrada da vida” (nesta seleção), que Aracy Cortes lançou no Recreio e Luiz Barbosa gravou em 1933. O samba “Lenço no pescoço”, lançado por Sílvio Caldas no mesmo ano, deu origem a uma famosa polêmica musical com Noel Rosa, que respondeu com “Rapaz folgado”, contestando  a identificação do sambista com o malandro, e por aí foi.  Apesar dessa longa “briga”, ambos depois se tornaram amigos…  Sua primeira música gravada foi o samba “Por favor, vai embora”, em 1932 (nesta seleção).  No mesmo ano, Wilson Batista passou a atuar como crooner e pandeirista da orquestra de Romeu Malagueta. Sempre vendendo sambas e fazendo parcerias ditas “comerciais”, Wilson conheceu, no lendário Café Nice (Avenida Rio Branco esquina com Rua Bittencourt da Silva), o cantor e compositor Erasmo Silva, com quem forma a Dupla Verde-Amarela (depois Verde e Amarelo). Ambos realizam apresentações no Brasil e em Buenos Aires, a capital da Argentina. A dupla seria desfeita em 1939, justamente com a ida de Erasmo Silva para a Argentina. Reencontraram-se em 1948, e quatro anos mais tarde acontece a dissolução definitiva da dupla. Nas composições de Wilson Batista, com ou sem parceiros,  predominam temas populares, como carnaval, futebol, jogo do bicho, e entre elas destacamos: “Acertei no milhar”, “Nêga Luzia”, “O bonde São Januário”, “Emília”, “Dolores Sierra”, “Louco (Ela é o seu mundo)”, “Samba rubro-negro”, “A mulher que eu gosto”, as marchinhas “Balzaquiana”, “Sereia de Copacabana” e “Pedreiro Waldemar”, “Boca de siri”, “Ganha-se pouco mas é divertido”, “Cabo Laurindo”, “História da Lapa”, “Rosalina”, “Esta noite eu tive um sonho”, “Mundo de zinco”, etc. Embora fanático torcedor do Flamengo, compôs para o carnaval de 1946 a marchinha “No boteco do José”, sobre a conquista do Campeonato Carioca de Futebol pelo Vasco da Gama, hit na voz de Linda Batista. Boêmio durante quase toda a vida, trabalhou nos últimos anos de existência como fiscal da UBC (União Brasileira de Compositores), entidade que ajudou a criar. Foi casado e pai de dois filhos, mas a vida boêmia carioca o fazia ficar longe de casa até três dias (!), para desespero da esposa. Apesar dos inúmeros hits como compositor, Wilson Batista morreu pobre, no dia 7 de julho de 1968, quatro dias depois completar 55 anos, de problemas cardíacos. E seu corpo foi sepultado na tumba da UBC, no cemitério  do Catumbi. Nesta primeira parte da retrospectiva que o GRB oferece por ocasião do centenário de nascimento de Wilson Batista, foram escolhidos onze de seus trabalhos, interpretados por grandes nomes da MPB de seu tempo. Nossa seleção começa com o samba ‘Vinte e cinco anos”, parceria de Wilson com o “amigo velho”, Cristóvão de Alencar, gravado por outro grande compositor, Newton Teixeira (aquele da “Deusa da minha rua”, por exemplo), em 12 de agosto de 1940, sendo lançado pela Odeon em dezembro do mesmo ano, sob n.o 11925-A, matriz 6450, evidentemente visando o carnaval de 41. Newton, por sinal, acabara de com-pletar 25 anos quando gravou a música, daí o título. Em seguida, Murilo Caldas, irmão de Sílvio, interpreta o samba “Refletindo bem”, parceria de Wilson Batista com J. Cascata, em gravação Victor de 21 de agosto de 1939, lançada em novembro do mesmo ano com o n.o 34511-B, matriz 33143. A faixa seguinte é justamente a estreia de Wilson Batista em disco, em parceria com Benedito Lacerda e Osvaldo Silva: o samba “Por favor, vá embora”, que Patrício Teixeira, então já veterano, imortalizou na mesma Victor em 14 de novembro de 1932, com lançamento em dezembro seguinte para o carnaval de 33, por certo, disco 33600-A, matriz 65594. O samba “O bonde São Januário”, de Wilson com outro mestre, Ataulfo Alves, sucesso no carnaval de 1941 na voz de Cyro Monteiro, vem aqui em uma curiosa gravação instrumental do pianista Heriberto Muraro, em ritmo de fox, feita também na Victor em 27 de maio do mesmo ano de 1941, com lançamento em julho seguinte, disco 34762-A, matriz 52163. Em seguida vem o primeiro samba feito por Wilson Batista, sem parceiro, “Na estrada da vida”, rotulado no selo como samba-canção, mas nem parece. A gravação coube a Luiz Barbosa (1910-1938), na Victor, em 28 de abril de 1933, com lançamento em dezembro seguinte, disco 33732-A, matriz 65722. A marchinha ‘Grito das selvas”, parceria de Wilson Batista com Augusto Garcez, é outra gravação Victor, de 14 de novembro de 1940, lançada em dezembro seguinte com o n.o 34694-B, matriz 52047, visando, é claro, o carnaval de 41. Quem canta é Silvino Neto, compositor (“Valsa dos namorados”, ‘Cinco letras que choram” etc.)e também humorista de prestígio no rádio, apresentando o programa ‘Pimpinela Escarlate”, onde fazia imitações de políticos famosos da época e contava piadas. Era pai do também humorista Paulo Silvino, figurinha carimbada dos humorísticos da TV Globo nos anos 1970/80. Outra obra-prima do samba é “Estás no meu caderno”, mais uma parceria de Wilson Batista com Benedito Lacerda e Osvaldo Silva, magistral criação de Mário Reis na Victor em 11 de maio de 1934, lançada em agosto do mesmo ano, disco 33810-A, matriz 79640. “Emília”, outro samba clássico, em que Wilson tem outro ilustre parceiro, Haroldo Lobo. É uma exaltação à então denominada mulher ideal, prendada e submissa, surgida um pouco antes da não menos clássica Amélia de Ataulfo Alves e Mário Lago. Foi imortalizado na Columbia por Vassourinha (Mauro Ramos de Oliveira) em 23 de junho de 1941, sendo lançado em outubro do mesmo ano com o n.o 55302-A, matriz 441. Talento promissor, revelado pela Rádio Record de São Paulo, Vassourinha, entretanto, morreria prematuramente, aos 19 anos, vítima de osteomielite, deixando apenas seis discos 78 com doze músicas (“Emília” é do segundo deles), que mereceriam mais tarde reedições em LP e CD. Depois vem um trio “brabo”: Francisco Alves, Murilo Caldas e Castro Barbosa, interpretando o samba “Desacato”, feito também a três mãos (Wilson Batista, Murilo Caldas e Paulo Vieira). Foi gravado na Odeon em 18 de julho de 1933 e lançado em agosto do mesmo ano com o n.o 11042-B, matriz 4699, atingindo sucesso “desacatador”, conforme diz com bom humor a partitura impressa. Em seguida, o samba-exaltação “Cidade de São Sebastião”, parceria de Wilson Batista com Nássara, gravado na mesma Odeon por Francisco Alves em 10 de julho de 1941, e lançado em agosto do mesmo ano, disco 12028-A, matriz 6710. Foi feito para a segunda edição da peça musical “Joujoux e Balangandãs”, levada a cena, a exemplo da primeira, de 1939, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Por iniciativa da então primeira dama do Brasil, Darcy Vargas, “socialites” da época apresentavam seus dotes artísticos no palco e mostrar generosidade na bilheteria, em prol de suas obras assistenciais. No palco, “Cidade de São Sebastião” foi  interpretado em dueto por Jenny Hime e Roberto Rocha, e a gravação de Chico Alves foi mais tarde relançada com o n.o 12950-B. Para finalizar, a divertida marchinha “As pupilas do senhor Bocage”, parceria de Wilson Batista com Arnaldo Paes, lançado para o carnaval de 1939 pela Columbia, em fevereiro desse ano, na interpretação do também comediante Barbosa Júnior (que marcou época no rádio brasileiro com o programa infantil “Picolino”), com o n.o 55016-B. O título cita o romance ‘As pupilas do senhor reitor”, do escritor lusitano Júlio Diniz (que no Brasil virou até telenovela) e demonstra claramente a errônea associação do poeta Bocage (1765-1805), também português, a piadas eróticas, maliciosas e picantes, isso pelo fato de ele ter escrito poemas eróticos e satíricos. E esta seleção é apenas o começo: vem mais Wilson Batista por aí. Aguardem!
* Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Muraro – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 11 (2012)

E chegamos à décima-primeira edição do Gran Record Brazil. Aqui apresentamos algumas das melhores gravações do pianista, maestro e compositor Heriberto Leandro Muraro (La Plata, Argentina, 1903-Rio de Janeiro, 1968). Este ilustre “hermano” aportou em terras brasileiras em 1932, logo se apaixonando pela nossa terra. Por décadas a fio percorreu todo o país exercendo sua arte de exímio pianista, excursionando em seguida por Portugal, Espanha, França, Inglaterra e Itália com repertório de música brasileira. No rádio, atuou nas emissoras cariocas Mayrink Veiga, Nacional e Globo, na Record de São Paulo e na Farroupilha de Porto Alegre. Dirigiu a lendária Nacional por 18 anos, impulsionando a carreira de nomes como Dircinha Batista, Nélson Gonçalves, Joel e Gaúcho, e as irmãs Cármen e Aurora Miranda. Gravou seu primeiro disco na Victor, em 1939, solando ao piano, em ritmo de fox, os sambas “O homem sem mulher não vale nada” e “Meu consolo é você”, hits do carnaval daquele ano na voz de Orlando Silva. Foram mais de trinta discos gravados, entre 78 rpm e Lps. Nesta edição do GRB, um pouco da arte deste talentoso pianeiro portenho-brasileiro, em doze fonogramas. Pra começar, o disco Continental 15887, gravado em 18 de março de 1948 e lançado em maio-junho do mesmo ano, com duas conhecidas marchinhas do mestre João de Barro, o Braguinha, em ritmo de fox. No lado A, matriz 1813, “A mulata é a tal”, parceria com Antônio Almeida, e no verso, matriz 1812, “Tem gato na tuba”, que Braguinha fez com Alberto Ribeiro. Em seguida, registros certamente realizados fora do país. O Odeon 2987 apresenta no lado A, matriz 14719, o fox “Dragões canadenses” (“Canadian capers”), dos americanos Gus Chandler, Bert White e Henry Cohen, composto em 1915. No verso, matriz 14466, e igualmente como fox, “Estudo em vermelho” (“Study in red”), do também americano Larry Clinton, trompetista, trombonista e bandleader. De volta ao Brasil, a interpretação de Muraro para o fox “Narcissus”, do americano Ethelbert Nevin, lançada pela Continental em agosto de 1944 com o número 15182-A, matriz 835. No verso, matriz 836, outra interpretação de Muraro em tempo de fox para “Gigolette”, trecho da opereta homônima de Franz Lehar, nascido na cidade de Komárom, no antigo Império Austro-Húngaro, e hoje situada na Eslováquia, com o nome de Komarno. Prosseguindo, mais um disco gravado no exterior, o Odeon 2947. Abrindo-o, matriz 15662, “Linda flor” (na verdade o famoso “Ai, ioiô”, de Henrique Vogeler, cuja letra mais famosa foi a de Luiz Peixoto e Marques Porto, gravada por Aracy Cortes em 1929). No verso, matriz 15578, o chorinho “Tangará na dança”, de autoria de Lina Pesce, compositora, cantora, bandolinista e pianista, lançado em 1946 pelo acordeonista George Brass. Portanto, este disco, assim como outros dois aqui incluídos, deve ser de 1947, mais ou menos. Em seguida, mais um disco de Muraro aqui gravado, o Odeon 13043, de 22 de maio de 1950, lançado em setembro do mesmo ano. De um lado, matriz 8704, o famoso “Baião”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, e no verso, matriz 8705, o célebre “Moto perpétuo”, de Paganini, que mais tarde recebeu outra ótima interpretação, a cargo de Edu da Gaita. Finalizando, mais duas gravações internacionais de Muraro, em disco Odeon 2912, apresentando dois chorinhos muito conhecidos. No lado A, matriz 14573, “Não me toques”, do mestre Zequinha de Abreu, e no verso, matriz 14465, “Bem-te-vi atrevido”, outra composição de Lina Pesce. Enfim, um resgate mais que oportuno, deste grande músico que foi o argentino-brasileiro Heriberto Muraro. Bom divertimento!

* TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO