A Música De Dunga – Seleção 78 RPM Do Toque Musical Vol. 143 (2015)

E aí vai mais uma edição do Grand Record Brazil, o “braço de cera” do TM, com o número 143, para seus amigos, cultos e associados. Desta vez, focalizamos a obra musical do compositor e pianista Waldemar de Abreu, o Dunga.  Nosso focalizado veio ao mundo no dia 16 de dezembro de 1907, no Rio de Janeiro. Ganhou o apelido de Dunga aos sete anos de idade, de sua professora, que o considerava o mais querido da turma. Fez o curso primário na escola pública do subúrbio de Haddock Lobo, e o ginásio (até o quarto ano) no Instituto Matoso. Em 1928, começou a jogar futebol, em Petrópolis, região serrana fluminense.  Em 1930, ingressou na Leopoldina Railways, trabalhando como conferente, e sempre jogava nos times de futebol e basquete da companhia, sendo campeão da Liga Bancária diversas vezes.  Em janeiro de 1935, sai a primeira música gravada de Dunga, para o carnaval do mesmo ano: o samba “Amar pra quê?”, na voz de Sílvio Pinto. Ainda em 35, acontece o enlace matrimonial de Dunga com Zaíra Moreira, que tiveram dois filhos. Em 1940, entrou para a SBAT (Sociedade Brasileira de Autores Teatrais), exercendo a função de cobrador junto aos teatros, e , um ano depois, ingressou na UBC (União Brasileira de Compositores), onde permaneceria durante anos. Em 1960, assumiu a vice-presidência da ADDAF (Associação Defensora de Direitos Autorais e Fonomecânicos), sem no entanto abandonar a atividade musical. Ao longo de sua carreira, teve mais de oitenta músicas gravadas, nas vozes de grandes astros da MPB, tais como Orlando Silva, Jamelão, Dircinha Batista, Cyro Monteiro,  Déo, etc. Basta lembrar, por exemplo, de “Conceição” (1956), eterno sucesso de Cauby Peixoto, cuja melodia é de Dunga, com letra de Jair Amorim. Eles também fizeram juntos “Maria dos meus pecados”, hit de Agostinho dos Santos em 1957. E Dunga continuaria compondo até sua morte, em 5 de outubro de 1991, aos 83 anos, em seu Rio de Janeiro natal.

Para esta edição do GRB, foram escolhidas músicas de exclusiva autoria de Dunga, ou seja, obras que ele compôs sem parceria. São 29 faixas, interpretadas pelos melhores cantores e instrumentistas de sua época, quase todas sambas. (Uma boa lembrança e colaboração do amigo Hélio Mário Alves, quem nos enviou boa parte desse material). Para começar, temos “Antes tarde do que nunca”, do carnaval de 1940, gravado na Victor por Odete Amaral em 23 de outubro de 39 e lançado ainda em dezembro, disco 34537-B, matriz 33187. Em seguida, um sucesso inesquecível de Orlando Silva, “Chora, cavaquinho”, outra gravação Victor, esta de 27 de agosto de 1935, lançada em dezembro do mesmo ano, disco 33998-B, matriz 80011. Edna Cardoso, cantora que só gravou dois discos com quatro músicas, pela Continental, aqui comparece com as três obras de Dunga que constam dos mesmos. Para começar, temos “Confessei meu sofrer”, lado A do disco 15428, o segundo e último de Edna, lançado em setembro de 1945, matriz 1199. Depois desta faixa, Aracy de Almeida comparece com “Dizem por aí”, gravação Victor de 20 de abril de 1938, lançada em junho seguinte sob número 34321-B, matriz 80761. Em seguida, o delicioso arrasta-pé “Espiga de milho”, executado pelo regional do violonista Canhoto (Waldiro Frederico Tramontano), em gravação RCA Victor de 21 de maio de 1954, lançada em agosto do mesmo não, disco 80-1325-B, matriz BE4VB-0462. Depois, mais três imperdíveis faixas com Orlando Silva. “Esquisita” é da safra do Cantor das Multidões na Odeon, por ele gravado em 23 de junho de 1947 e lançado em setembro do mesmo ano, disco 12797-A, matriz 8246. Voltando à Victor, temos um verdadeiro clássico da carreira de Orlando: o samba-canção “Eu sinto vontade de chorar”, que ele canta acompanhado pela Orquestra Carioca Swingtette, sob a direção de Radamés Gnattali. Gravação de 13 de junho de 1938, lançada em setembro seguinte sob número 34354-B, matriz 80826. “Foi você”, outra das melhores gravações de Orlando, foi feita em 17 de setembro de 1936 e lançada pela marca do cachorrinho Nipper em outubro seguinte com o número 34100-A, matriz 80221. O samba-canção “Justiça”, grande sucesso na voz de Dircinha Batista, foi por ela gravado na Odeon  em 20 de junho de 1938, com lançamento em agosto do mesmo ano, disco 11628-B, matriz 5871. Logo depois, temos “Meu amor”, samba do carnaval de 1949, na interpretação de Jorge Goulart, lançada pela Star em fins de 48 sob número 79-A. Nuno Roland interpreta, em seguida, o samba-canção “Meu destino”, gravação Todamérica de 8 de março de 1951, lançada em abril do mesmo ano, disco TA-5053-A, matriz TA-101. Dircinha Batista volta em seguida com “Moleque de rua”, lançado pela Continental em setembro de 1946, disco 15691-A, matriz 1639. Roberto Paiva interpreta depois “Não sei se voltarei”, em gravação Victor de 13 de julho de 1944, lançada em setembro do mesmo ano, disco 80-0211-A, matriz S-078018. Déo lançou em janeiro de 1945, na Continental, para o carnaval desse ano, o samba “Nunca senti tanto amor”, matriz 912. Em junho do mesmo ano, ele lançou pela mesma marca outro samba de Dunga, “Orgulhosa”, disco 15356-A, matriz 1128. Em seguida, volta Edna Cardoso, desta vez cantando “Pandeiro triste”, lançado em agosto, também de 1945, e pela mesma Continental, abrindo seu disco de estreia, número 15408, matriz 1201. Alcides Gerardi aqui comparece com “Perdoa”, gravado por ele na Odeon em 29 de agosto de 1946, com lançamento em outubro do mesmo ano, disco 12730-A, matriz 8092. “Quando alguém me pergunta”, samba destinado ao carnaval de 1939,  tornou-se um clássico na voz de Castro Barbosa, que o gravou na Columbia em 12 de janeiro desse ano, com lançamento bem em cima da folia, em fevereiro, disco 55015-B, matriz 125. Cyro Monteiro, em seguida, interpreta “Que é isso, Isabel?”, gravação Victor de 3 de junho de 1942, lançada em agosto do mesmo ano, disco 34950-B, matriz S-052544. Poderemos apreciá-lo ainda em “Quem gostar de mim”, que gravou na mesma Victor em 8 de julho de 1940, com lançamento em setembro do mesmo ano, disco 34646-B, matriz 33461. Janet de Almeida, irmão de Joel de Almeida, falecido ainda jovem, interpreta depois “Quem sabe da minha vida”, batucada do carnaval de 1946, lançada pela Continental em janeiro desse ano, disco 15582-B, matriz 1397. Em seguida, Aracy de Almeida interpreta “Remorso”, gravação Odeon de 30 de março de 1943, lançada em maio do mesmo ano, disco 12305-B, matriz 7244. Temos depois novamente Edna Cardoso, desta vez interpretando “Se ele me ouvisse”, lado B de seu segundo e último disco, o Continental 15428, lançado em setembro de 1945, matriz 1198. Orlando Silva registrou “Soluço de mulher” na Odeon em 6 de agosto de 1944, com lançamento em outubro do mesmo ano, disco 12503-B, matriz 7645. A bela valsa “Sonho” é executada pelo clarinetista Luiz Americano, acompanhado por Pereira Filho ao violão elétrico, em gravação lançada pela Continental em maio de 1945, disco 15337-B, matriz 1105. O choro “Tic tac do meu relógio” foi lançado pela Continental, na interpretação de Carmélia Alves, ao lado do Quarteto de Bronze, acompanhados por Fats Elpídio e seu Ritmo, em março-abril de 1949, sob número de disco 16048-B, matriz 2067, por sinal marcando o início definitivo da carreira fonográfica de Carmélia, seis anos após sua estreia na Victor. O samba “Trapaças de amor” foi gravado na RCA Victor por Linda Batista em 5 de maio de 1947, com lançamento em junho do mesmo ano, disco 80-0519-A, matriz S-078750. Primeiro ídolo country brasileiro, Bob Nélson aqui comparece com “Vaqueiro apaixonado”, marchinha do carnaval de 1951, devidamente acompanhado de “rancheiros” músicos que, mais competentes, não existiam nem mesmo no Texas ou na Califórnia. Gravação RCA Victor de 12 de outubro de 50, lançada ainda em dezembro, disco 80-0726-A, matriz S-092786. Para encerrar, temos “Zaíra”, valsa cuja musa inspiradora foi certamente a esposa de Dunga. É executada ao saxofone por Luiz Americano, em gravação Continental de 5 de abril de 1948, só lançada em março-abril de 49, disco 16015-A, matriz 1831. Enfim, esta é uma justa homenagem do GRB a um dos maiores compositores que o Brasil já teve: Waldemar “Dunga” de Abreu!

* Texto de Samuel Machado Filho

Nuno Roland – Seleção 78 RPM Do Toque Musical Vol. 107 (2014)

A centésima-sétima edição do Grand Record Brazil é dedicada a um dos maiores cantores da era de ouro do rádio brasileiro. Estamos falando de Nuno Roland. Nosso focalizado veio ao mundo na cidade de Joinville, Estado de Santa Catarina, no dia primeiro de março de 1913, batizado com o nome de Reinold Correia de Oliveira. Ainda menino, ele tocava tarol e caixa na banda da cidade de Teixeira Soares, no Paraná. Aos 13 anos, mudou-se com a família para outra cidade catarinense, Porto União, tendo trabalhado como balconista, telegrafista e bancário. Após servir o exército, em 1931, transferiu-se para a cidade gaúcha de Passo Fundo, onde começou sua carreira, conseguindo emprego de cantor e baterista em um cassino, e apresentando-se com seu nome verdadeiro, Reinold de Oliveira. Em 1932, alistou-se como voluntário no Sétimo Batalhão de Caçadores de Porto Alegre, para entrar em combate na Revolução Constitucionalista daquele ano. Veio com sua tropa para São Paulo, e na ocasião fez amizade com outro soldado, então crooner da jazz band do batalhão: nada mais nada menos que Lupicínio Rodrigues, posteriormente célebre compositor. Encerrada a Revolução, o cantor voltou a Porto Alegre, e, com apenas 19 anos, assinou seu primeiro contrato profissional, com a Rádio Gaúcha, posto ter se destacado como cantor em uma apresentação radiofônica da jazz band do batalhão em que estava lotado. Em 1934, muda-se para São Paulo, onde fez sucesso apresentando-se inicialmente na Rádio Record (então “a maior”), recebendo pequenos cachês. Mais tarde,com o apoio do violonista Garoto, consegue um contrato com a Rádio Educadora Paulista.  E é nessa ocasião que passa a adotar o nome artístico pelo qual ficou conhecido em todo o Brasil: Nuno Roland.  Ainda em 1934, grava seu primeiro disco, na Odeon, com duas composições de Sivan Castelo Neto (pseudônimo de Ulysses Lelot Filho):  a valsa “Pensemos num lindo futuro” e a canção “Cantigas de quem te vê”.  Dois anos mais tarde, Nuno muda-se para o Rio de Janeiro e torna-se um dos pioneiros da PRE-8, Rádio Nacional, onde estreia no dia de sua inauguração, 12 de setembro de 1936. Durante onze anos foi também crooner da orquestra do Copacabana Palace Hotel.  Em cerca de quarenta anos de carreiro, Nuno Roland gravou ainda nos selos  Columbia, Victor, Belacap, Carroussel, Caravelle, Todamérica  e Continental. Nesta última marca, ele viveu a melhor fase de sua carreira, registrando inúmeros sucessos, no carnaval e no meio-de-ano. Seu currículo também inclui duetos com Cármen Miranda, Linda Batista e Emilinha Borba. Integrou ainda, juntamente com Albertinho Fortuna e Paulo Tapajós,o Trio Melodia, formado na Nacional para apoio do superprograma “Um milhão de melodias”, e as carreiras individuais de seus integrantes prosseguiriam sem quaisquer problemas. As participações de Nuno nos programas musicais da emissora da Praça Mauá eram consideradas de alta qualidade artística. Sua atividade artística declinou na década de 1960, gravando esporadicamente nesse período. Em 1968, participou, ao lado de Marlene e Blecaute, do espetáculo “Carnavália”, que ficou em cartaz no Rio por quase um ano.  Nuno Roland faleceu em 20 de dezembro de 1975, também no Rio, aos 62 anos. De sua gloriosa trajetória fonográfica, o GRB foi buscar dezoito faixas, notáveis exemplos de sua arte, assinadas por alguns de nossos maiores compositores populares.  Pedro Caetano, por exemplo, assina a faixa de abertura, “Guarapari”, célebre canção que homenageia a cidade do litoral do Espírito Santo famosa pelas suas praias com areias monazíticas. Nuno Roland a imortalizou na Todamérica em 8 de março de 1951, com lançamento em abril seguinte sob n.o TA-5053-B, matriz TA-102.  A faixa seguinte é um clássico imortal do carnaval brasileiro: a marchinha “Pirata da perna de pau”, uma das mais expressivas contribuições do grande João de Barro, o Braguinha, para o repertório momesco , aliás Nuno Roland  foi um dos melhores intérpretes do compositor. Imortalizada por ele na Continental em 3 de setembro de 1946, com lançamento em novembro seguinte sob n.o 15727-A,matriz 1591, “Pirata da perna de pau” foi merecido sucesso no carnaval de 47, sendo lembrada até hoje com muita, muita justiça. “Cai, sereno”, a faixa 3,é um batuque assinado por outro mestre, Assis Valente: “Cai, sereno”, que Nuno registrou na Odeon em 18 de maio de 1939, com lançamento em julho do mesmo ano, disco 11734-A, matriz 6094. O samba “Covardia”, que encontraremos logo em seguida, é de uma dupla “braba”, Ataulfo Alves e Mário Lago. Foi, aliás,o primeiro trabalho conjunto deles, de uma série de oito, entre eles os clássicos “Ai, que saudade da Amélia” e “Atire a primeira pedra”. Nuno gravou “Covardia”,também na Odeon, em 16 de agosto de 1938, com lançamento em outubro seguinte sob n.o 11646-B, matriz 5903. E quem nunca entoou aquela famosa música do “Lobo mau” (“Eu sou o lobo mau, lobo mau,lobo mau”…), da história de Chapeuzinho Vermelho, tão bem adaptada e musicada por Braguinha? Pois ele a reaproveita, junto com Antônio Almeida, na faixa 5, como marchinha para o carnaval de 1951, que Nuno Roland, à frente do já citado Trio Melodia, lançará na Continental em janeiro desse ano, disco 16344-A, matriz 2475. Outro presente de Ataulfo Alves para Nuno, agora tendo Jorge Faraj na parceria, é essa joia de valsa, “Mil corações”, que o cantor grava na Odeon em  28 de março de 1938,com lançamento em julho do mesmo ano, disco 11603-A,matriz 5747. O beguine “Ballerina”, de Carl Sigman e Bob Russell, foi publicado nos EUA em 1947, tendo merecido gravações por Nat King Cole e Bing Crosby, entre outros.  Dois anos mais tarde, Oswaldo Santiago escreve a letra brasileira, com o título de “Bailarina” mesmo, para Nuno Roland gravar na Continental, com lançamento entre julho e setembro de 1949,sob n.o 16087-A, matriz 2102. Raridade absoluta é também o samba  “Dia dos meninos”,  da parceria Wilson Batista-Jorge de Castro, provavelmente gravado por Nuno Roland em 1960, numa etiqueta de curta duração, a Popular, tendo o disco recebido o número 0011-A,matriz DPM-21. “Peixe vivo”, motivo do folclore mineiro, e por sinal a música favorita de Juscelino Kubitschek de Oliveira, político nascido em Diamantina que chegou à presidência da República (governou de 1956 a 1961), é aqui apresentada por Nuno Roland em tempo de baião, ritmo então na moda, num arranjo de Antônio Almeida. Gravação Todamérica de 26 de junho de 1951, lançada em agosto seguinte com o número TA-5084-A, matriz TA-169. A dupla Alcebíades “Bide” Barcellos-Armando Marçal , responsável por clássicos como “Agora é cinza”, “Ando sofrendo” e “Barão das cabrochas”, aqui comparece com o samba “Perdão, meu bem”, que Nuno Roland grava na Odeon em 3 de novembro de 1939 para o carnaval de 40, sendo lançado um mês antes da folia, em janeiro, com o número 11807-B, matriz 6245. O famoso tango “Por ti eu me rasgo todo (Por vos yo me rompo todo)”, do uruguaio Francisco Canaro  (que, a exemplo do francês Carlos Gardel, fez carreira na Argentina), ganha aqui uma versão em ritmo de samba, com letra brazuca de César Siqueira, que Nuno Roland irá registrar também na Odeon em 5 de setembro de 1939, indo para as lojas em novembro com o n.o 11781-A,matriz 6191. Em seguida, por intermédio de Luiz Bittencourt e Murilo Caldas (irmão de Sílvio), Nuno Roland pergunta em ritmo de samba: “Quem  é que está com a razão?” Gravado na Continental em 3 de setembro de 1946, permaneceu, no entanto, quase um ano na gaveta, e só saiu em julho de 47 sob n.o 15787-A, matriz 1590. O samba do lado B, que vem logo em seguida, foi gravado em 2 de maio de 1947, matriz 1655, é mais um clássico imortal de Braguinha, aqui com seu inseparável parceiro Alberto Ribeiro: o belíssimo “Fim de semana em Paquetá”, sob medida para a notável interpretação de Nuno Roland, devidamente acompanhado pela orquestra de cordas de Eduardo Patané (a mesma do registro original de “Copacabana”, com Dick Farney). Até hoje é bastante conhecido e tem inúmeras regravações. Também de Braguinha e Alberto Ribeiro é outra antológica marchinha carnavalesca: “Tem gato na tuba”, da folia de 1948, que Nuno Roland imortaliza na mesma Continental em 23 de setembro de 47, com lançamento ainda em dezembro sob n.o 15843-B, matriz 1727. Vencedora do concurso oficial da prefeitura do Rio de Janeiro, “Tem gato na tuba” foi também interpretada por Nuno Roland no filme “Esta é fina”, e jamais seria esquecida, tendo regravação até mesmo pela Turma do Balão Mágico!  Outra raridade é “Volta”, samba-canção de Radamés Gnattali e Luiz Bittencourt, que Nuno Roland lança em 1953 no LP coletivo de dez polegadas “Show”, da Musidisc  de Nilo Sérgio, por sinal uma das gravadoras pioneiras do vinil, e que encerrou definitivamente suas atividades em 2013. Braguinha, agora sem parceiro, é o responsável por outra imortal página carnavalesca:  a marchinha “Serenata chinesa”, um dos hits da folia de 1949, que Nuno imortaliza na Continental em 13 de outubro de 48 e vai para as lojas um mês antes do carnaval, em janeiro, com o número 15971-A, matriz 1983. Da santíssima trindade Wilson Batista-Claudionor Cruz-Pedro Caetano é o samba “Senhor do Bonfim te enganou”, dueto de Nuno Roland com Dircinha Batista, em gravação Odeon de 5 de outubro de 1939, só lançada em maio de 40, disco 11834-B, matriz 6240. Para encerrar com chave de ouro, outro grande hit carnavalesco de João “Braguinha” de Barro: “Tem marujo no samba”, em que Nuno Roland tem a notável companhia da eterna “Favorita”, Emilinha Borba.  Um dos hits do carnaval de 1949, por sinal um dos mais ricos musicalmente, foi gravado na Continental em 13 de outubro de 48, com lançamento um mês antes da folia, em janeiro, sob n.o 15980-B, matriz 1994, tendo sido também apresentada no filme “Estou aí?”, de Moacyr Fenelon. Não poderia haver melhor fecho para esta brilhante retrospectiva que o GRB dedica a Nuno Roland. Divirtam-se e até a próxima!
Texto de Samuel Machado Filho

A Era Getúlio Vargas – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol.19 (2012)

Nenhum outro presidente da República no Brasil ficou tanto tempo no poder quanto o gaúcho Getúlio Dornelles Vargas (São Borja, RS-1882-Rio de Janeiro, 1954). Ele chegou à presidência em 1930, após a deposição de Washington Luís, de quem ironicamente havia sido ministro da Fazenda, e consequente fim da “política café com  leite”, em que São Paulo e Minas Gerais se.alternavam no comando da Nação. Daí em diante, ficou quinze anos ininterruptos, até ser deposto em 1945. Em 1951, Getúlio voltou ao poder, desta vez pelo voto direto, mas em virtude de forte oposição a seu governo (no qual inclusive foi criada a Petrobrás), acabou se suicidando no dia 24 de agosto de 1954, provocando comoção geral em todo o país. Somando-se esses dois períodos, Getúlio ficou no poder durante dezoito anos e sete meses, um recorde absoluto.
O Grand Record Brazil começa hoje a nos transportar para esse que foi um dos mais importantes períodos da História brasileira: a era getulista. Tudo começa com a derrota de Getúlio Vargas para Júlio Prestes, na eleição de 1930. A 26 de julho daquele ano, João Pessoa, candidato a vice na chapa derrotada, foi assassinado a tiros na Confeitaria A Glória, do Recife, por seu desafeto João Dantas, por motivos estritamente pessoais. Apesar disso, a oposição transformou o fato em instrumento político, jogando o povo contra o governo. Daí nasce a Aliança Liberal, formada pelos estados do Rio Grande do Sul, da Paraíba e de Minas Gerias, que depõe Washington Luíz e põe Getúlio no poder, a famosa Revolução de 30.
O disco que abre nossa seleção musical desta semana é o Columbia 5117, lançado em dezembro de 1929, com duas marchinhas de Hekel Tavares e Luiz Peixoto (parceiros na clássica canção “Casa de caboclo”) para o carnaval de 30, interpretadas pelo paulistano Jayme Redondo (1890-1952), com acompanhamento de grupo regional, e que refletem muito bem os momentos acirrados da sucessão de Washington Luís.  No lado A, a matriz 380430 apresenta “Harmonia! Harmonia!”, e o verso, matriz 380431, “Comendo bola”. Nessas duas músicas, há todo um rico documentário político de fatos e personagens: Barbado (Washington Luís), Antônio Carlos (então governador mineiro), as cartas turcas, 17 Estados a favor de Prestes e só três contra, etc. “Comendo bola” é nitidamente a favor de Júlio Prestes: “Getúlio, você tá comendo bola/ Não te mete com seu Júlio/ Não te mete com seu Júlio/ que seu Júlio tem escola”.
Evidentemente, por questão de bom senso, mostramos aqui também o outro lado, ou seja, o dos getulistas. Vitoriosa a Revolução de 30, com Getúlio já no poder, Lamartine Babo lança, para o carnaval de 1931, a marchinha “G-E-Gê (Seu Getúlio)”, fazendo velada propaganda do novo chefe da nação, com a exaltação da nova ordem para o povo brasileiro, a mudança custe o que custar. Possivelmente teria sido executada como “jingle” político na construção do apoio ao golpe contra Prestes. Almirante e o Bando de Tangarás ficaram incumbidos de lançá-la, pela Parlophon, em janeiro de 1931, no disco 13274-B, matriz 131057, com acompanhamento da Orquestra Guanabara.
Seis anos mais tarde, durante o chamado “governo provisório” getulista, fala-se na possibilidade de eleições para a escolha do sucessor de Getúlio na presidência, com dois fortes candidatos: o então governador de São Paulo Armando Salles de Oliveira (o seu Manduca), este com a candidatura já lançada, e o ministro Osvaldo Aranha (o seu Vavá), que na verdade nem sequer chegou a se candidatar. A 28 de novembro de 1936, Sílvio Caldas grava na Odeon, para o carnaval de 37, com lançamento em janeiro (11450-A, matriz 5468), a marchinha “A menina presidência”, de Nássara e Cristóvão de Alencar, vencedora de um concurso chamado “Quem será o homem?”, antecipando o desfecho nos versos finais do estribilho: “Na hora H quem vai ficar é seu Gegê”. E, de fato, as eleições não aconteceram, pois a 10 de novembro de 1937, Getúlio implanta no país o Estado Novo, com maior centralização do poder, ficando na presidência até sua deposição, em 1945.
Do Estado Novo já é a faixa seguinte, a marchinha “Glórias do Brasil”, de Zé Pretinho e Antônio Gilberto dos Santos. Foi gravada na Odeon em 16 de agosto de 1938, com lançamento em outubro seguinte com o número 11646-A, matriz 5902, na interpretação de Nuno Roland (Reinold Correia de Oliveira, 1913-1975), catarinense de Joinville, então em princípio de carreira. É uma verdadeira exaltação de cunho patriótico ao então chefe da Nação.
Mais tarde, seguindo o exemplo do governo fascista italiano, Getúlio decreta o aumento do imposto de renda dos solteiros, e incentiva com benefícios as famílias numerosas. Isso inspira o  poeta de Miraí, Ataulfo Alves, a compor com Felisberto Martins o samba “É negócio casar!”, que ele próprio grava na Odeon em 12 de junho de 1941, com acompanhamento da orquestra do maestro Fon-Fon (Otaviano Romero Monteiro), sendo o disco lançado em outubro seguinte com o número 12047-A, matriz 6686. Uma autêntica e interessante crônica.
Um ano mais tarde, foi lançado um sem número de canções patrióticas, refletindo a tensão provocada pela Segunda Guerra Mundial, iniciada em 1939  e que já preocupava e afetava o Brasil, visando levantar o orgulho e a consciência nacionais. Dessa época é o samba “Brasil brasileiro”, gravado por Carlos Galhardo na Victor com acompanhamento da orquestra do maestro Passos, em 9 de junho de 1942, com lançamento em agosto seguinte, disco 34951-A, matriz S-052546. Pouco tempo antes, em maio de 42, a Columbia lançou, na voz de Déo (Ferjallah Rizkallah, “o ditador de sucessos”), acompanhado por Chiquinho e seu ritmo, o samba “O sorriso do presidente”, de Alcyr Pires Vermelho e Alberto Ribeiro, disco 55336-A, matriz 525. Nesse mesmo ano, por força do torpedeamento de navios mercantes brasileiros, o Brasil declarava guerra aos países do Eixo, Alemanha, Itália e Japão, assim entrando no conflito.
Finalizando esta primeira parte, temos o grande Moreira da Silva, o eterno Kid Morenguera, inimitável rei do samba de breque, interpretando, de Henrique Gonçalez, “Diplomata”, gravado na Odeon em primeiro de outubro de 1942, com a declaração brasileira de guerra já consumada,  e lançamento em janeiro de 43 sob número 12252-A, matriz 7075. Devidamente acompanhado pelo regional do multi-instrumentista Garoto (Aníbal Augusto Sardinha, 1915-1955, autor de “Duas contas”, “São Paulo quatrocentão” e “Gente humilde”), Moreira exalta a figura de Getúlio, um “homem de fibra”, e conclama o povo brasileiro à luta.

Enfim, são autênticas crônicas musicais desse período importante de nossa História. E fiquem ligados, pois semana que vem tem mais. Até lá!


TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO

Show (1953)

Olá, amigos cultos e ocultos! Aqui vai mais um disquinho que eu comprei do catador de papel. Alguns desses álbuns eu estou tendo, também, o prazer de conhecer e ouvir só agora. É o caso deste lp de 10 polegadas, um dos primeiros lançados pela Musidisc. Trata-se de uma coletânea, obviamente, de artistas da gravadora. Nomes como os que (quase) podemos ler na estampa da capa: Britinho; Léo Peracchi; Nuno Roland; Trio Surdina; Nilo Sérgio (cantando); Djalma Ferreira com Helena de Lima, que só aparece nos créditos do selo, a atriz Renata Fronzi como cantora e ainda a mexicana Elvira Rios. Realmente um show para a época. A qualidade da gravação é muito boa, comparada a de outras gravadoras naquele tempo. Porém, alguns arranhões e estalos são inevitáveis. São marcas de um disco com 58 anos de idade!

se eu morresse amanhã – renata fronzi
joaozinho boa pinta – trio surdina
volta – nuno roland
pensando em ti – leo peracchi
desencuentro – elvira rios
definição – nilo sergio
tarde demais – djalma ferreira e helena de lima
lilian – leal brito

Carnaval De Ontem E De Hoje (1964)

Mais uma pérola resgatada que merece a maior atenção. Este disquinho foi lançado em 1964, como podemos ver pela capa, trazendo os “hits” do carnaval daquele ano juntamente com alguns outros sucessos do passado. O repertório é dos mais interessantes. A primeira faixa “Mag, Inês e Ana” já vale o disco e merecia estar presente no nosso próximo carnaval. Deveria ser adotada pelo governo na campanha de prevenção e conscientização no próximo carnaval. Tem tudo a ver, não é, presidente Lula?

mag, inês e ana – nuno roland
no balanço da cabrocha – nelson guimarães
cuidado matusquela – nelson guimarães
o futuro a deus pertence – helio cavalcanti
tudo pode acontecer – helio cavalcanti
falta tudo – kleber e o côro do clube do guri
não posso mais – nuno roland
a maria tá – walter levita
frevo n.1 dos vassourinhas – orquestra e côro do bloco dos vassourinhas
mané garrincha – côro do clube do guri
sem razão – anisio silva
cara boa – lucy rosana
um coração que chora – anisio silva
rei pelé – côro do clube do guri