Francisco Alves 2:2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 62 (2013)

Estamos de volta com a segunda parte da  retrospectiva que o Grand Record Brazil dedica ao inesquecível Francisco Alves, o Rei da Voz (1898-1952). Desta feita, mais treze gravações preciosas e imprescindíveis para colecionadores, pesquisadores e apreciadores em geral.
Abrindo nosso roteiro, três sambas de Sílvio Fernandes, o Brancura, histórico malandro carioca, de quem falamos na edição anterior. O primeiro é “Coração volúvel”, lançado pela Odeon em junho de 1929, disco 10399-A, matriz 2532, do qual também foi escalado o lado B, matriz 2531, “Mulher venenosa”, na faixa 3, ambas com acompanhamento da Orquestra Pan American de Simon Bountman. Antes dele virá “Você chorou”, subintitulado “Me admiro é você”, primeiro verso da letra, gravação Victor de 8 de julho de 1935 (ano do falecimento de Brancura), lançado em agosto seguinte com o número 33959-A, matriz 79968, e incluído na burleta teatral “Da Favela ao Catete”, de Freire Júnior. O acompanhamento é da Orquestra Diabos do Céu, formada e dirigida pelo mestre Pixinguinha.Voltando à Odeon, o samba “Olê-lê-ô”, da santíssima trindade Francisco Alves-Ismael Silva-Nílton Bastos, gravado em 27 de novembro de 1930 e lançado em janeiro de 31 para o carnaval, disco 10745-B, matriz 4068 (o lado A é “Nem é bom falar”, da nossa edição anterior). Ismael e Nílton faziam parte do grupo Bambas do Estácio, que acompanha Chico Alves neste registro. Neto da lendária Tia Ciata,  Bucy Moreira assina em parceria com Norival Reis, o Nazinho (ou Nozinho), o samba “Em uma linda tarde”, que Chico Alves gravou com os Diabos do Céu na Victor em 16 de abril de 1935, com lançamento em julho seguinte sob n.o 33946-B, matriz 79877. Autêntica raridade vem em seguida, o samba “Meu batalhão”, também da trindade Chico (acompanhado de seu “Esquadrão”)-Ismael Silva-Nílton Bastos, lançado pela Odeon em janeiro de 1931 para o carnaval com o n.o 10748-B, matriz 4091. E quem não conhece a marchinha junina “Pula a fogueira”? Só quem nunca foi numa festa junina… Da parceria Getúlio “Amor” Marinho-João Bastos Filho, foi imortalizada pelo Rei da Voz na Victor em 21 de maio de 1936, matriz 80163, com lançamento em julho seguinte (o que tem sua lógica, pois as festas juninas em algumas cidades costumam se estender até esse mês) sob n.o 34068-A. A marchinha “Você gosta de mim”, da parceria Francisco Alves-Ismael Silva, saiu pela Parlophon em dezembro de 1931, disco 13377-B, matriz 131307, visando o carnaval de 32. Outro clássico é o samba “Para me livrar do mal”, da parceria de Ismael Silva com Noel Rosa, imortalizado por Chico Alves na Odeon em 29 de junho de 1932, disco 10922-B, matriz 4467, e que ele também interpretou no segundo show da série “Broadway cocktail”, um espetáculo palco-tela encenado no recém-inaugurado Cine Broadway, do qual também participaram Cármen Miranda, Almirante e Noel. Destaque, na gravação, para o piano de Nonô (Romualdo Peixoto), tio dos cantores Cyro Monteiro e Cauby Peixoto. “Choro, sim”, samba de Ismael Silva sem parceiro, foi gravado por Chico na Victor com os Diabos do Céu em 21 de novembro de 1934, matriz 79784. Destinava-se ao carnaval de 1935,  segundo consta da edição, mas só foi para as lojas em julho desse ano, com o número 33946-B. Dando um salto no tempo, vem em seguida outro samba, “Cidade de São Sebastião”, de Wilson Batista e Nássara, gravação Odeon de 10 de julho de 1941, lançada em agosto do mesmo ano com o número 12028-A, matriz 6710, com acompanhamento da orquestra do maestro Fon-Fon (Otaviano Romero Monteiro, 1908-1951). A música fez parte do segundo espetáculo da série “Joujoux e Balangandãs”, levado à cena no Teatro Municipal do Rio, no qual a então primeira-dama da Nação, Darcy Vargas, convocava a alta-sociedade carioca a apresentar seus dotes artísticos no palco e demonstrar generosidade na bilheteria, em prol de suas obras assistenciais. Nele, “Cidade de São Sebastião” foi interpretado por Jenny Hime e Roberto Rocha. “Fica de lá” é de Ernâni Alvarenga, “o samba falado da Portela”, e este aqui destinou-se ao carnaval de 1939, lançado pela Odeon bem em cima da folia, em fevereiro, com o número 11700-A, tendo sido gravado em 16 de dezembro de 38, matriz 5995. Por fim, uma marcha natalina do mestre Ary Barroso em parceria com nosso Chico Alves, “Meu Natal”, da safra do Rei da Voz na Victor, com o devido apoio instrumental dos Diabos do Céu de Pixinguinha & Cia., gravada em 19 de outubro de 1934 e lançada, claro, em dezembro, com o número 33857-A, matriz 79762. Ela encerra, e com chave de ouro, esta retrospectiva que o GRB dedica ao imortal Francisco de Moraes Alves, e entrega com muita alegria aos amigos cultos, ocultos e associados do GRB. Até a próxima e obrigado pelo prestígio!
Texto de  SAMUEL MACHADO FILHO.

Francisco Alves 1:2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 1 (2013)

Vejam vocês, amigos cultos, ocultos e associados do TM: já estamos na sexagésima-primeira edição do Grand Record Brazil! Sinceramente, eu e o Augusto não esperávamos que a coisa fosse tão longe, o que muito devemos ao apoio e ao prestígio de vocês. Esta semana, apresentamos a primeira de duas partes de uma nova retrospectiva dedicada ao eterno Rei da Voz, Francisco de Moraes Alves.
Nascido no Rio de Janeiro em 19 de agosto de 1898 e tragicamente falecido em acidente automobilístico na Rodovia Presidente Dutra, na altura de Pindamonhangaba, SP (seu carro, um Buick, chocou-se com um caminhão que entrara na contramão, e se incendiou), em 27 de setembro de 1952, Francisco Alves deixou a maior discografia em 78 rpm da história de nossa música popular, e gravou somente nesse formato: foram 524 discos com 983 fonogramas! Uma carreira que começou em 1919, numa modesta gravadora de fundo de quintal, a Disco Popular, para a qual foi levado pelo compositor Sinhô. Em sua estreia, Chico gravou três músicas de Sinhô: a marchinha “O pé de anjo” (sucesso no carnaval de 1920) e os sambas “Fala, meu louro” e “Alivia estes olhos”. O cantor só teria nova oportunidade em disco na Odeon, em 1924, gravando quatro músicas, também carnavalescas, que não obtiveram êxito. E é a partir de 1927, com a implantação do sistema elétrico de gravação, substituindo o mecânico, que Chico Viola desponta de vez para a popularidade. Aliás, gravava na Odeon como Francisco Alves e na Parlophon, sua subsidiária, como Chico Viola. É na “marca do templo” que se passará quase toda a sua carreira fonográfica, com breves saídas para a RCA Victor (1934 a 1937) e para a Columbia, futura Continental (1939 a 1941).
Desta longa e vitoriosa trajetória de Chico Alves em disco, foram escaladas para este primeiro volume catorze joias de seu repertório. Abrindo-a, o samba “Me faz carinhos”, lançado pela Odeon em janeiro de 1928 para o carnaval, disco 10100-B, matriz 1480, dado como sendo de exclusiva autoria de Chico, mas que na verdade é de Ismael Silva, de quem o Rei da Voz o comprou (Ismael queria o dinheiro no ato, por necessidade imediata), e ele também o interpretaria na revista “Você quer é carinho”, encenada no Teatro Carlos Gomes. No acompanhamento, a Orquestra Pan American do Cassino Copacabana, dirigida pelo palestino Simon Bountman, e também conhecida como Orquestra Copacabana, Simão Nacional Orquestra e Orquestra Parlophon (tudo a mesma coisa…). A faixa 2 é “Não é isso que eu procuro”, outra parceria de Chico Alves com Ismael Silva,dedicada ao maestro Martinez Grau, lançada em setembro do mesmo ano com o número 10251-B, matriz 1876, tendo no acompanhamento a Orquestra Rio Artists. O cantor também interpretou esse samba em duas revistas encenadas no Teatro Carlos Gomes: “Eu quero é nota”, em dueto com Célia Zenatti, sua primeira mulher, e outra também chamada “Não é isso que eu procuro”. “Deixa essa mulher chorar” faz parte da antológica série de gravações que Chico fez em dupla com Mário Reis, datada de 9 de setembro de 1930 com lançamento em dezembro do mesmo ano, disco 10715-A, matriz 3969. Oficialmente o samba é de Sílvio Fernandes, o Brancura (c.1908-1935), malandro histórico do Estácio, que ganhou seu apelido por sua cor negra reluzente, mas segundo Bucy Moreira, era de Maciste da Mangueira, que deu parceria a Brancura. “Apanhando papel”, gravação de 30 de janeiro de 1931, lançada em março do mesmo ano com o número 10767-A, matriz 4124, é de Getúlio Marinho da Silva, o Amor (Salvador, BA, 1889-Rio de Janeiro, 1964) e Ubiratan da Silva. Foi escalado também o lado B, “Ironia”, do próprio Chico Alves em parceria com Ismael Silva e Nílton Bastos, matriz 4136. Nesse disco, o acompanhamento é dos Bambas do Estácio, e o bandolim é provavelmente do mestre Luperce Miranda. “Nem é bom falar”, que vem antes de “Ironia” em nossa seleção, é do mesmo trio de autores e com o mesmo acompanhamento, gravação de 27 de novembro de 1930, lançada em janeiro de 31 com o número 10755-A, matriz 4067, e um dos hits do carnaval desse ano. Ao ouvir o verso “Eu quero uma mulher bem nua”, durante apresentação do cantor na Rádio Sociedade, seu proprietário, Roquette Pinto, também pioneiro da radiodifusão no Brasil, comentou: “Todos nós queremos, mas não é preciso dizer”…  A santíssima trindade Chico Alves-Ismael Silva-Nílton Bastos também assina “É bom evitar”, samba lançado pela “marca do templo” em setembro de 1931 com o número 10837-A, matriz 4271. A marchinha “Gosto mas não é muito” saiu pela Parlophon em dezembro de 1931, com vistas ao carnaval de 32, com o número 13375-A, matriz 131302. É creditada a Francisco Alves e Ismael Silva, mas sua segunda parte foi composta por Noel Rosa, não creditado nem no disco nem na edição. Nessa época, o governo provisório de Getúlio Vargas admitia milhares de correligionários no serviço público, a ponto de, para brecar novos pedidos, em tempos de crise profunda, ser exigido dos postulantes requerimento estampilhado, com foto e selos, daí o verso “Traz o retrato e a estampilha”. Temos também o lado B, matriz 131308: “Amar”, samba do próprio Chico mais Ismael Silva e Nílton Bastos, este último não creditado na edição. Do Parlophon 13377, também lançado em dezembro de 1931 para o carnaval de 32, temos o lado A, matriz 131306: o samba “Sonhei”, do mesmo trio de autores da faixa anterior. Chico Alves e Ismael Silva assinam a faixa seguinte, o samba “Gandaia”, gravação Odeon de 23 de março de 1932, lançada em maio do mesmo ano, disco 10906-B, matriz 4420. Da parceria Noel Rosa-Ismael Silva é o samba “Ando cismado”, gravação de 27 de outubro de 1932, lançada em dezembro seguinte com o número 10936-A, matriz 4532. Para encerrar, duas faixas do período final de Chico Alves na Odeon, ambas canções visando as festas natalinas, e gravadas em 5 de dezembro de 1950, porém só lançadas um ano mais tarde, dezembro de 51, com o número 13198: “Sinos de Natal” (lado B, matriz 8877), de Victor Simon (autor dos clássicos “Bom dia, café” e “O vagabundo”) e Wilson Roberto, e a “Canção de Natal do Brasil”, parceria do próprio Rei da Voz com David Nasser e Felisberto Martins, na época diretor artístico da “marca do templo” (lado A, matriz 8876). Embora ainda estejamos longe do Natal, as faixas são apropriadas para encerrar a primeira parte deste nosso retrospecto. Semana que vem a gente se encontra com mais Chico Alves. Até lá!
Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Januário E Luiz Gonzaga – Seleção 78 RPM Do Toque Musical (2013)

O Grand Record Brazil chega à sua sexagésima edição apresentando uma seleção musical com dois grandes nomes da cultura popular nordestina: Luiz Gonzaga e seu pai Januário.
Lavrador, sanfoneiro e consertador de sanfonas, Januário José dos Santos, autêntico rei dos oito baixos, nasceu em 25 de setembro de 1888, não se sabe se em Flores ou Pajeú das Flores, em Pernambuco. Adolescente, fugindo da seca, ele chegou, em 1905, à Fazenda Caiçara, nascente do Riacho da Brígida, a 12 quilômetros de Exu, na Serra do Araripe, bem na divisa Norte de Pernambuco com o Ceará, ao lado de seu irmão Pedro Anselmo. Era motivo de alegria e admiração para quem escutava a sua sanfona, sendo sempre respeitado por onde quer que passasse. Só falava o necessário e tinha grande entendimento intelectual, apesar de nunca ter sentado em um banco de escola. Além de exímio sanfoneiro, foi durante toda a vida um homem dedicado à família. Ao lado da primeira esposa, Dona Santana, soube muito bem educar seus nove filhos (Gonzagão foi o segundo) na tradição religiosa e no respeito humano.
O “Vovô do Baião” sempre amou seu querido Araripe. Prova disso é que, em 1960, com o falecimento de Dona Santana e já com os nove filhos radicados no Rio de Janeiro, ficou morando sozinho por lá de junho a novembro, quando contraiu segundas núpcias com Dona Maria Raimunda de Jesus. O novo casal adotou, em 1962, um bebê com três dias de nascido, e registrado como filho legítimo com o nome de João Batista Januário, ainda hoje residindo em Exu.
Grande exemplo de pai e bom vizinho, “seu” Januário partiu para a eternidade no dia 11 de junho de 1978, deixando imensa saudade em todos que o conheceram lá em Exu, apreciando suas performances sanfoneiras todo final de tarde. As tradições religiosas do município forma preservadas por muito tempo recebendo a colaboração do “Vovô do Baião”.
Já Luiz Gonzaga do Nascimento nasceu, a 13 de dezembro de 1912, lá mesmo na Fazneda Caiçara, onde ele e seus irmãos foram criados, e ainda menino se interessou pelos oito baixos do pai, a quem ajudava na animação de forrós e festas. Aos 17 anos, saiu de casa e se alistou como voluntário no Exército, em Fortaleza, Ceará, e em 1930 rumou com seu batalhão de caçdores, o 22, para a Paraíba, agitada com a revolta de Princesa. Com a vitória de Getúlio Vargas, a tropa se desloca para Belém do Pará, Teresina, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, a fim de pacificar os resistentes. Corneteiro, recebeu em BH o apelido de “Bico de Aço”. E soprando a corneta seguiu para São Paulo, em 1932, no movimento constitucionalista, e para Mato Grosso, a fim de proteger nossa fronteira da Guerra do Chaco, entre Paraguai e Bolívia. Já em tempos mais clamos, Gonzagão serviu em Juiz de Fora e Ouro Fino, em Minas Gerais, e deu baixa em 1939, após dez anos de Exército (uma nova lei impedia o reengajamento além desse tempo). Em vez de voltar a sua Exu, resolve ficar no Rio de Janeiro, onde desembarcara na companhia de uma sanfona branca comprada em São Paulo pouco antes. Nas ruas, nos bares e no Mangue, passando o pires, apresentava um repertório bem ao gosto dos marinheiros e suas acompanhantes: tangos, boleros, valsas, canções, foxes. Certa noite, um grupo de universitários cearenses pede para ele tocar alguma coisa lá do Nordeste. Aí, Gonzagão tira da memória xaxados, cocos, xotes, xamegos, e é aí que alimenta o ideal de um dia tocar tudo isso para todo o povo do Sul. Inscreve-se no programa de calouros do temível Ary Barroso tocando seu xamego “Vira e mexe”, sendo aplaudidíssimo pela plateia e obtendo nota máxima! Em 1941, é levado à RCA Victor para acompanhar Genésio Arruda na gravação de “A viagem do Genésio”, e tem a oportunidade de tocar seu “Vira e mexe” para o diretor artístico, sendo de pronto escalado para gravar dois discos como acordeonista-solo: “Véspera de São João”/”Numa serenata” e “Saudades de São João del Rey”/”Vira e mexe”. A oportunidade de gravar como cantor só aparece em 1945, com “Dança, Mariquinha”, mazurca sua e de Miguel Lima. Em pouco tempo tornou-se ídolo nacional, de ponta a ponta, também como compositor, tendo parceiros expressívos: Miguel Lima, Humberto Teixeira, Zé Dantas, e sucessos sem conta, seja como autor, seja apenas como intérprete: “Baião”, “Asa branca”, ‘Vozes da seca”, “Chofer de praça”, “Paraíba”, “Macapá”, “Lorota boa”, “Riacho do Navio”, “Boiadeiro”, “Cigarro de páia”, “Xanduzinha” e muitos, muitos mais. Com o aparecimento do rock e da bossa nova, Gonzagão ficou praticamente esquecido no Sul do País, sobretudo no eixo Rio-São Paulo, mas continuou a se apresentar pelo interior do Brasil, onde sempre teve grande público. Em 1968, o espertíssimo Carlos Imperial planta um boato de que o quarteto britânico The Beatles iria gravar “Asa branca”. Isso, claro, não aconteceu, mas chamou a atenção das novas gerações de então para sua obra, sendo então redescoberto e novamente experimentando o sucesso em discos e shows nos grandes centros urbanos, tendo inclusive se apresentado no exterior. O trono de Rei do Baião é e sempre será seu. Gonzagão morreu em 2 de agosto de 1989, no Recife, de osteoporose seguida de pneumonia (sofria também de câncer na próstata), deixando um legado imortal que até hoje influencia a MPB. Seu corpo foi sepultado, conforme seu desejo, ao lado de seus pais, em Exu.
Nesta edição do GRB, apresentamos uma seleção dedicada a Januário e Gonzagão, pai e filho, com oito fonogramas originais RCA Victor. Para começar, quatro gravações do mestre Januário, com participação expressiva dos filhos, inclusive, claro, Luiz Gonzaga: o xote dele mesmo “Januário vai tocar”, gravação de 3 de agosto de 1955, lançada em outubro do mesmo ano com o número 80-1498-A, matriz BE5VB-0823. No verso, matriz BE5VB-0824, o “Calango do Irineu”, também do próprio Januário, que apresentamos logo em seguida. Depois, as faixas do disco 80-1322, gravado em 18 de maio de 1954 e lançado em agosto: o baião “O balaio de Veremundo”, da parceria Luiz Gonzaga-Zé Dantas, espirituosa  alusão a um “coronel” da cidade pernambucana de Salgueiro, famosa por suas carnes de bode salgadas, e inventor da dança do balaio. Da mesma parceria é o lado B, matriz BE4VB-0456, outro baião: “Pronde tu vai. Luí?”, com solo vocal do próprio Gonzagão, “of course”. Completando este pequeno grande programa, quatro expressivas gravações de Gonzagão de seu início como cantor-solo. Na faixa seis, exatamente sua estreia nessa área, após 24 discos como solista de sanfona: a mazurca “Dança, Mariquinha”, gravada em 11 de abril de 1945 e lançada em maio seguinte, matriz S-078152. Luiz Gonzaga chegou a dizer ao então diretor artístico da RCA Victor, Vittorio Lattari, brincando, que a Odeon queria lançá-lo como cantor em disco. Mas Vittorio, claro, decidiu que ele ficaria na Victor, e perguntou: “Como é? Já tem repertório pra cantar?” Isso, claro, não faltava… Na faixa oito, o chamego “Penerô xerem”, chamego da parceria Luiz Gonzaga-Miguel Lima, gravação de 13 de junho de 1945, lançada em agosto do mesmo ano (80-0306-A, matriz S-078189). A 6 de setembro do mesmo ano, Gonzagão grava, de sua autoria mais Miguel Lima e J. Portela (o jota é de Jeová), outra mazurca de sucesso, “Cortando pano”, expressiva homenagem aos alfaiates, que a Victor lançara em novembro seguinte com o número 80-0344-B, matriz S-078283. Nessa época, quase todos os cantores brasileiros costumavam lançar músicas para o carnaval, pois, como então se dizia, eram “da fuzarca”. E mostrando o lado carnavalesco do Rei do Baião, foi escalada a faixa 7 desta nossa edição do GRB, a marcha-tarantela “Festa napolitana”, do compositor Sereno, para a folia de 1946, que a Victor lançou em janeiro desse ano, em gravação de 14 de novembro de 45, disco 80-0374-A, matriz S-078389. Enfim, uma pequena grande amostra que certamente irá agradar aos fãs de Luiz Gonzaga, de seu pai Januário e da boa música nordestina, deixando na boca aquele irresistível gostinho de quero-mais…
* Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Elvira Pagã – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 59 (2013)

E eis de volta o Grand Record Brazil, para alegria dos amigos cultos, ocultos e associados do TM. Nesta quinquagésima-oitava edição, estamos trazendo de volta, mais uma vez graças ao esforço do amigo e colecionador Beto de Oliveira, parcela substancial da carreira-solo de Elvira Pagã.
Nossa biografada, cujo nome de batismo era Elvira Olivieri Cozzolino, nasceu na cidade paulista de Itararé, divisa de São Paulo com o Paraná, no dia 6 de setembro de 1920. Ainda pequena, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, onde estudou num colégio de freiras, o Imaculada Conceição. Ainda estudante, organizava com a irmã, Rosina, inúmeras festas onde travariam inúmeras relações com o meio artístico da então Capital da República, sobretudo com os integrantes do Bando da Lua. Ainda na década de 1930, Rosina e Elvira atuaram em um espetáculo de inauguração do Cine Ipanema, ao lado dos Anjos do Inferno. Nessa ocasião receberam, de Heitor Beltrão, o apelido de Irmãs Pagãs (como a dupla ainda não tinha nome, Heitor a considerava “pagã”), que adotariam para o resto da vida.
As Irmãs Pagãs se apresentaram em inúmeras emissoras de rádio, como a Mayrink Veiga, e gravaram juntas um total de treze discos. Por quatro meses, excursionaram pela Argentina, Peru e Chile. Atuaram nos filmes  “Alô, alô, carnaval”(1935), “O bobo do rei”, “Cidade-mulher” (ambos de 1936), “Favela” (1939), “Laranja da China” (1940) e a produção argentina “Trés anclados em Paris” (1938).
A dupla encerrou-se em 1940, com o casamento de Elvira, e ambas passam a seguir carreiras independentes. Elvira Pagã tornou-se uma das maiores estrelas do teatro de revista, disputando com Luz del Fuego (Dora Vivacqua, Cachoeiro de Itapemirim, ES, 1917-Rio de Janeiro, 1967) o papel de destaque entre as mulheres brasileiras mais ousadas de seu tempo: foi a primeira a trajar biquini em Copacabana e, nos anos 1950, posou nua para uma foto, que distribuiu, vejam vocês, como cartão de Natal! Elvira foi também responsável direta por uma das tentativas de suicídio do compositor Assis Valente (ele cortou os pulsos, mas foi salvo), ao cobrar dele uma dívida escandalosa de 4.000 cruzeiros. Sua beleza e sensualidade lhe fizeram a fama (e lhe causaram até mesmo inúmeras prisões), tornado-a uma das “sex symbols” mais cobiçadas da época. Seu fã mais ardoroso era o perigosíssimo bandido Carne Seca, cuja cela na prisão estava abarrotada de fotos de Elvira, com destaque para uma na qual a vedete estava deitada sobre uma pele de onça, e onde se lia a dedicatória: “Para Carne Seca, um consolo de Elvira Pagã”.  Foi a primeira rainha do carnaval carioca – uma inovação nos festejos de Momo, que até hoje se mantém. No cinema, participou dos filmes “Carnaval no fogo” e “Dominó negro”, ambos de 1949, e “Aviso aos navegantes”, de 1950, também fazendo pontas em “Vegas nights” (1948) e “Écharpe de seda” (1950).
A partir dos anos 1970, passou a dedicar-se à pintura, adotando um estilo esotérico, mas não obteve muito destaque nessa atividade. Com a maturidade, Elvira foi se tornando misantropa e temperamental, evitando qualquer tipo de contato pessoal, principalmente com jornalistas e pesquisadores.
Elvira Pagã faleceu no Rio de Janeiro, em 8 de maio de 2003, fato este só divulgado três meses depois pela irmã, Rosina, então residindo nos EUA.
Como cantora-solo, Elvira gravou, em 78 rpm, doze discos com vinte e três músicas, onze delas de sua própria autoria (sendo a primeira delas o samba-jongo “Batuca daqui, batuca de lá”), entre 1944 e 1959. Desta produção, o GRB apresenta 16 preciosíssimos fonogramas. Para começar, as músicas de seu disco de estreia como solista, o Continental 15174, lançado em junho de 1944, apresentado os sambas “Arrastando o pé”, de Peterpan e Afonso Teixeira, matriz 829, e “Samburá”, de Gadé e Walfrido Silva, matriz 830. Em seguida,, os sambas de seu terceiro disco, também na então “marca dos três sininhos”, lançado em junho de 45 sob número 15353: “Na Feira do Cais Dourado”, de Nélson Teixeira e Nélson Trigueiro, matriz 1112, e “Um ranchinho na lua”, de Babi de Oliveira, matriz 1111. Em dezembro de 1949, Elvira lança pela Star, para o carnaval de 50, disco 169, duas composições de Sebastião Gomes e Nélson Teixeira: a “Marcha do ré” e o samba “Sangue e areia”. Ainda de 1950, apresentamos o disco Star 217, com o baião “Vamos pescar”, da própria Elvira mais Valentim, e o baião “Sururu de capote”, de José Cunha e Ramiro Guará, referência a uma iguaria gastronômica muito apreciada em Alagoas, em que o sururu, um molusco, é cozido ainda dentro da concha com leite de coco, tomate, cheiro verde e outros temperos. Depois, retira-se o caldo e serve-se o sururu, tanto como petisco como refeição, acompanhado de muita pimenta, pirão e purê de macaxeira (“Sururu de capote” deu título até mesmo a uma música do alagoano Djavan, por ele gravada em seu primeiro álbum, e à banda que o acompanhava em seus shows).
Para a folia de 1951, Elvira lança sob o selo Carnaval, da Star, disco 038, a marchinha “A rainha da mata”, dela própria com Valentim (referência direta à sua eleição para rainha do carnaval carioca, a primeira de longa dinastia) e o samba “Pau rolou”, de Sátiro de Melo e Manoel Moreira. Ainda em 51, a mesma Star lança, com o número 269, duas composições da própria Elvira: no lado A, o samba ”Cassetete, não!”, sem parceiro, ironizando os maus-tratos por ela sofridos em uma delegacia depois de uma de suas muitas passagens pela polícia, dada sua postura, então considerada imoral e agressiva por muitos. A música fez tanto sucesso que era cantada por travestis, que sofriam (como ainda hoje sofrem) perseguições policiais. Os “travecos”, quando davam as caras com os homens da lei, cantavam a música imitando os trejeitos de Elvira! No verso desse disco, apareceu o baião “Saudade que vive em mim”, parceria dela com Valentim.

Apresentamos depois as músicas do único 78 de Elvira Pagã no selo Ritmos, para o carnaval de 1956, número 20-0060, com duas composições próprias: a marchinha “Marreta o bombo” e o samba “Condenada”. Por fim, as músicas de seu penúltimo disco, o Marajoara MA-10009, para o carnaval de 1959, também da própria Elvira: a marchinha “Papel pintado”, matriz M-17, com parceria de Orlando Gazzaneo, e o samba “Você partiu”. Matriz M-18, que ela fez com Airão Reis e Nélson de Oliveira. Enfim, é com muita alegria que apresentamos esta retrospectiva de Elvira Pagã, e quem tiver as cinco músicas que ainda faltam para completar sua discografia-solo, entre em contato com o amigo Beto pelo email:betodec39@yahoo.com.br, que ele está no aguardo!

* Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Linda Rodrigues 3 1/2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 58 (2013)

Como vocês bem se recordam, os três últimos volumes do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil apresentaram a discografia quase completa em 78 rpm da cantora Linda Rodrigues, fruto de esforçadíssimo trabalho do nosso amigo e colaborador Alberto de Oliveira. Pois bem: para este último volume, reservamos uma surpresa bastante agradável: as cinco gravações de Linda que faltavam! Afinal, quem deve tem que pagar, e só agora é que o Beto conseguiu essas faixas, porém nunca é tarde, não é mesmo? Portanto, é com muita alegria que completamos a coleção de Linda Rodrigues em 78 rpm com estas cinco faixas: “Enxugue as lágrimas”, samba lançado em janeiro de 1945, de Elpídio Viana e Carneiro da Silva, lado A do primeiro disco da cantora, o Continental 15222, matriz 892; “Os dias que lhe dei”, samba-canção de Newton Teixeira e Ayrton Amorim, lado A do disco Star 243, de 1951; “De mão em mão”, samba de Lecinho e Jaú, lançado também pela Star em dezembro de 1951 para o carnaval de 52 (disco 308-B); “Fique em casa”, samba-canção de Raymundo Olavo e Benê Alexandre, lançado em abril de 1954 (disco 16944-A, matriz C-3327); e “Chorar pra quê?”, samba de Aldacir Louro e Silva Jr., gravado na RCA Victor em 9 de outubro de 1957, com lançamento em janeiro de 58 para o carnaval (disco 80-1901-A, matriz 13-H2PB-0265). E, como complemento, apresentamos uma das últimas gravações da cantora: o samba-canção “Maldade”, extraída do primeiro dos dois compactos simples por ela gravados em esquema de produção independente. Aliás, o Beto conseguiu essa faixa graças a uma sugestão que dei a ele: o Beto viu no canal do MC Paulinho, no YouTube, um vídeo com essa gravação, e sugeri a ele que baixasse o vídeo, convertendo o áudio para mp3. Deu certo, como vocês ouvirão. Enfim, serviço completo para nossos amigos cultos, ocultos e associados! Afinal, quem espera sempre alcança… Lembrando que as músicas “Parceiro de Schubert” e “Escrava Isaura”, que revivemos no primeiro volume desta retrospectiva, são de Paulo Marques e Aylce Chaves, sendo que na “Isaura” eles têm Napoleão Alves como parceiro. Até a próxima, pessoal!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

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Linda Rodrigues 3 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical Vol. 57 (2013)

E chegamos, nesta edição do Grand Record Brazil, a de número 57, à terceira e última parte da retrospectiva por nós dedicada à cantora e compositora Linda Rodrigues. E, de acordo com reportagem publicada pela “Revista do Rádio” em 1963, Linda era mesmo carioca, do bairro da Tijuca. Formou-se em enfermagem pela Escola Ana Nery, atendendo a um pedido de sua mãe, mas jamais exerceu a profissão. Linda se apresentou artisticamente como cantora pela primeira vez em 1935, na Rádio Transmissora carioca, sob a orientação de Renato Murce, atuando com outros futuros astros da MPB e então também amadores como ela: Emilinha Borba, Ciro Monteiro, Orlando Silva e Odete Amaral. Linda atuou dois anos na Rádio Clube do Pará, em Belém, cidade onde também iniciou seus estudos de enfermagem, e ao regressar a seu Rio de Janeiro natal, cantou na Rádio Cruzeiro do Sul. Em 1939, fez sua primeira viagem artística, atuando na Feira de Amostras do Recife (PE), e também passou dois meses na Bahia. Voltando ao Rio, foi contratada pela lendária Rádio Nacional. Também atuou em São Paulo, na PRG-2, Rádio Tupi (então “a mais poderosa emissora paulista”) e em shows, no ano de 1940. De volta a seu Rio natal, foi contratada para cantar nos cassinos da Urca e Icaraí. Em 1943, Linda transfere-se para a PRG-3, Rádio Tupi do Rio (“o cacique do ar”) e troca a Urca pelo Cassino Atlântico. Volta mais tarde ao Icaraí, onde fica até a proibição do jogo no Brasil, em 1946. De 1945 a 1957, com uma interrupção durante um período em que adoecera, Linda atuou na Rádio Mayrink Veiga, para a qual voltou em 1962, desta feita ficando um ano, transferindo-se para a Rádio Mauá, onde encerrou sua trajetória radiofônica.

E é com este volume que encerramos o retrospecto da carreira de Linda Rodrigues em disco, iniciada, como vocês bem se lembram, em 1945. Desta feita, apresentamos 13 preciosas e históricas gravações. Abrindo nossa seleção da semana, as faixas de seu segundo 78 rpm na RCA Victor, n.o 80-1798, gravado em 21 de março de 1957 e lançado em junho seguinte, ambas sambas-canções: “Pianista”, de Irany de Oliveira e Ari Monteiro, matriz 13-H2PB-0067 (curiosamente regravado por Cauby Peixoto em 1989), “Comentário barato”, de autoria do violonista Jayme Florence, o Meira dos regionais, e J. Santos, matriz 13-H2PB-0068. De seu terceiro disco na marca do cachorrinho Nipper, destinado ao carnaval de 1958, n.o 80-1901, apresentamos o lado B, o samba “Quando o sol raiar”, de Mirabeau Pinheiro (também co-autor dos clássicos “Cachaça”, “Jarro da saudade” e “Tem nêgo bebo aí”, entre outras), Sebastião Mota e Urgel de Castro. Gravado em 9 de outubro de 1957 e lançado em janeiro de 58, matriz 13-H2PB-0272, também fez parte do LP coletivo “Carnaval RCA Victor – volume 1” (não esquecendo de que esta era uma época de transição de formatos, do 78 para o vinil, que desbancou de vez a quebradiça bolacha de cera em 1964). A 28 de janeiro de 1958, Linda grava “Sereno no samba”, de Aldacir Louro  e Dora Lopes, matriz 13-J2PB-0345, e, fiel à dor-de-cotovelo que era sua especialidade, um bolero dela mesma em parceria com o mesmo Aldacir, “Nada me falta”, matriz 13-J2PB-0346. Gravações estas que foram para as lojas em abril do mesmo ano com o n.o 80-1935.  Já para o carnaval de 1959, a primeiro de outubro de 58, Linda Rodrigues grava duas composições próprias com parceiros: o samba “Tem areia” (com José Batista), matriz 13-J2PB-0499, e a “Marcha da folia” (com Aldacir Louro e Silva Júnior), matriz 13-J2PB-0500, lançadas um mês antes da folia, em janeiro, com o n.o 80-2025. Em 27 de janeiro de 1959, Linda grava seu último disco na RCA Victor, n.o 80-2054, lançado em abril seguinte. Abrindo-o, um bolero que fez com Aldacir Louro, “Meu romance”, matriz 13-K2PB-0577 (regravado por Francisco Carlos em 1985). No verso, matriz 13-K2PB-0578, o samba-canção “Mesa discreta”, de Elias Cortes. Em seguida, por causa de mudanças na direção artística da RCA Victor, Linda Rodrigues teve rescindido seu contrato com a empresa. Um ano mais tarde, lança seus dois últimos 78 rpm, pela Chantecler: em agosto, sai o disco 78-0297, que abre com o clássico samba-canção “Negue”, de Adelino Moreira em parceria com o radialista Enzo de Almeida Passos (criador dos programas “Telefone pedindo bis” e “A grande parada Brasil”), matriz C8P-593, lançado em janeiro do mesmo ano por Roberto Vidal e inúmeras vezes regravado (em 1978, Maria Bethânia o reviveu com sucesso em seu LP “Álibi”). No verso, matriz C8P-594, um samba-canção da própria Linda mais um certo Castelo: “Tenho moral”. E, em novembro de 1960, sai o disco 78-0357, que abre com o samba-canção “Companheiras da noite”, dela mesma com Aylce Chaves e William Duba, matriz C8P-713, e no verso, matriz C8P-714, apareceu a segunda gravação que fez para o clássico “Lama”, de Paulo Marques e Aylce Chaves. “Companheiras da noite”, por sinal, deu título àquele que, ao que parece, seria seu único LP gravado (Chantecler CMG-2119), editado em 1961, e no qual as três outras faixas que gravou na “marca do galinho madrugador” também apareceram, sendo a regravação de “Lama” a faixa de abertura. Enfim, é com muita satisfação e a alegria do dever cumprido, que encerramos esta retrospectiva que o GRB dedicou a Linda Rodrigues, agradecendo a imprescindível colaboração do amigo Alberto Oliveira. Como percebem vocês, um esforço que valeu a pena, e muito!

Texto de Samuel Machado Filho

Linda Rodrigues 2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical Vol. 56 (2013)

Em sua quinquagésima-sexta edição, o meu, o seu, o nosso Grand Record Brazil apresenta a segunda de três partes que resgatam parcela substancial do legado da cantora Linda Rodrigues, uma personagem tão fascinante quanto misteriosa da história de nossa música popular. Ninguém sabe por que razão pouco ou nada se sabe a respeito desta talentosa cantora-compositora. Mas o GRB aqui está para oferecer tudo o que foi possível reunir das gravações de Linda em 78 rpm, por iniciativa do amigo e colaborador Alberto Oliveira.

Nesta segunda parte de nosso retrospecto, oferecemos vinte preciosos fonogramas de Linda. Abrindo-a, o bolero “Nossos caminhos”, de Ayrton Amorim e Nogueira Xavier, gravado na Continental em 10 de abril de 1952 e lançado em maio-junho seguintes, matriz C-2840, o lado B do disco 16559 (cujo lado A, o clássico “Lama”, encerrou nosso volume anterior). Na sequência, os dois lados do Continental 16742,  lançado em maio-junho de 1953: os sambas-canções, ambos de Paulo Marques, “Fui amigo”(parceria de David Barcelos, matriz C-3065) e “Mesa de bar” (parceria da notável Dora Lopes, matriz C-3066). No Continental 16822, lançado em setembro-outubro de 1953, Linda interpreta o fox “O homem que eu amo”, matriz C-3178, versão de Mayu Atty (quem seria?) para o standard americano “The man I love”, dos irmãos Ira e George Gershwin, publicado em 1927 e desde então muito gravado, e o samba-canção “Flor do lodo”, de Ary Mesquita, matriz C-3179, cuja gravação original saiu em março do mesmo ano, na interpretação da já veterana Aracy Cortes. Em seguida, vêm duas músicas que Linda gravou na Sinter para o carnaval de 1953, e lançadas em janeiro desse ano com o número 00-00.182: o samba “Sombra e água fresca”, de Ruço do Pandeiro e Geraldo Mendonça, matriz S-391, e a marchinha “Bambeio mas não caio”, de seus inseparáveis amigos e parceiros Paulo Marques e Aylce Chaves, mais a vedete Elvira Pagã, que formou dupla de sucesso com a irmã Rosina (eram as famosas Irmãs Pagãs), matriz S-392.  Vem mais carnaval em seguida, agora o de 1954, no Continental 16888, lançado em janeiro desse ano: o samba “Sereno cai”, de Raul Sampaio (cantor e compositor que integrou a terceira formação do Trio de Ouro, ao lado de seu fundador, Herivelto Martins, e de Lourdinha Bittencourt) em parceria com Ricardo Galeno, matriz C-3224, e a marchinha “Tá tão bom”, assinada por um trio chamado Os Três Amigos (quem seriam?), matriz C-3223. Do Continental 16944, lançado em abril de 1954, apresentamos o lado B, o samba-canção “Farrapo de calçada”, matriz C-3328, composição da própria Linda Rodrigues sem parceria, mais tarde regravado pelo cantor Roberto Muller. Em seguida, as duas faixas do Continental 17058, lançado em janeiro de 1955, ambas sambas-canções. Abrindo-o, “Ninguém me compreende”, matriz C-3456, de autoria de Peterpan (José Fernandes de Almeida, Maceió, AL, 1911-Rio de Janeiro, 1983). Autor de clássicos como “Última inspiração”, “Se queres saber” e “Fita meus olhos”, Peterpan era cunhado da cantora Emilinha Borba, que, curiosamente, regravaria “Ninguém me compreende” em 2003, em seu último disco, o CD independente “Emilinha pinta e Borba”. No verso, matriz C-3457, outro hit de Linda Rodrigues, por ela composto em parceria com José Braga, “Vício”, regravado em 1980 por Cármen Costa. Depois temos os dois lados do Continental 17158, gravado em 18 de março de 1955 e lançado em outubro do mesmo ano. Abrindo-o, matriz C-3604, o samba “Olha no espelho”, da dupla Zé e Zilda (José Gonçalves, o Zé da Zilda, havia falecido em outubro de 1954, de AVC). No verso, matriz C-3606, o fox “Aquilo que eu vejo”, de Vicente Paiva e Chianca de Garcia, amigos e colegas desde os tempos do Cassino da Urca. Para o carnaval de 1956, Linda Rodrigues grava na Todamérica, a 18 de outubro de 55, com lançamento ainda em novembro sob número TA-5591, a marchinha “Rico é gente bem”, de Ari Monteiro, A  Rebelo e J. Rupp, matriz TA-889, e o samba ‘Folha de papel”, também de Ari Monteiro em parceria com Paulo Marques e Sávio Barcelos, matriz TA-890. Linda despediu-se de vez da Continental com o disco 17279, editado em abril-maio de 1956. De um lado, um samba-canção dela própria em parceria com Aylce Chaves, “Farrapo humano”, matriz C-3796, certamente inspirado no filme americano de mesmo nome (no original, “The lost weekend”), de 1945, produzido pela Paramount e estrelado por Ray Milland. No verso, matriz C-3797, um samba de Noel Rosa (1910-1937) em parceria com Henrique Brito, seu companheiro no Bando de Tangarás, “Queimei teu retrato”, até então inédito em disco e cujo ano de composição é ignorado. Para finalizar, apresentamos as faixas do disco de estreia da cantora na RCA Victor, número 80-1705, gravado em 13 de setembro de 1956 e lançado em novembro seguinte, visando o carnaval de 57, ambas marchinhas: “A dona da casa”, de Arnô Canegal (Rio de Janeiro, 1915-idem, 1986) e uma certa Dina, matriz BE6VB-1301, e “Barca da Cantareira”, de Arnaldo Ferreira e J. Rupp, matriz BE6VB-1302. A barca do título fazia na época o trajeto do Rio de Janeiro a Niterói, antes da construção da ponte fixa. Das duas faixas, “A dona da casa” foi a única a chegar também ao LP, no álbum coletivo “Carnaval RCA Victor”. Na próxima semana, encerraremos esta nossa retrospectiva dedicada a Linda Rodrigues. Até lá!

*Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Linda Rodrigues – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 55 (2013)

Esta semana, o Grand Record Brazil, em sua edição de número 55, apresenta a primeira parte, de uma série de três, em que iremos focalizar o trabalho de uma cantora excelente, que teve sua época, mas que infelizmente foi esquecida com o passar do tempo. Refiro-me a Linda Rodrigues.
Nossa focalizada recebeu, na pia batismal, o nome de Sophia Gervasoni, e veio ao mundo no dia 11 de agosto de 1919, provavelmente no Estado do Rio de Janeiro. Embora seu primeiro disco tenha sido lançado para o carnaval de 1945, pela Continental, Linda Rodrigues é considerada uma das intérpretes da música popular brasileira que melhor representa e celebra a chamada dor-de-cotovelo. Linda também foi compositora, e fez trabalhos para outros artistas, em parceria com nomes do quilate de J. Piedade e Aylce Chaves, entre outros. Sua discografia, além da Continental,  inclui passagens pelos selos Star, Carnaval, Sinter, Todamérica, RCA Victor e Chantecler. Nesta última, em 1961, lançou aquele que parece ter sido seu único LP, “Companheiras da noite”. Seu maior sucesso foi o samba-canção “Lama”, de Paulo Marques e Aylce Chaves (que está neste volume), e outros hits da cantora foram os sambas-canções “Vício”, dela própria com José Batista, e “Negue”, clássico de Adelino Moreira e Enzo de Almeida Passos, que apresentaremos nos próximos volumes deste nosso retrospecto. Em 78 rpm, Linda gravou um total de 30 discos com 59 fonogramas, além do LP já mencionado, e alguns compactos de produção independente, e faleceu no Rio de Janeiro, em 16 de novembro de 1995, aos 76 anos, de infecção pulmonar e problemas cardíacos (miocardiopatia e arritmia).
Neste primeiro volume que o GRB dedica a Linda Rodrigues, apresentamos 21 preciosos fonogramas, correspondentes aos primeiros anos de sua carreira. Trabalho esse resultante do esforço do amigo e colaborador Alberto Oliveira, que reuniu as gravações de Linda em 78 rpm que iremos apresentar nestes 3 volumes. Ficaram faltando cinco delas, mas o esforço dele valeu a pena, como vocês irão constatar.
De seu 78 de estreia, o Continental 15222, lançado em janeiro de 1945 para o carnaval, está o lado B, o samba “Abaixo do nível”, de Alvaiade e Odaurico Mota, matriz 893. O disco seguinte, o Continental 15280, lançado em março de 1945, vem com as duas faixas, também sambas: “Você não sabe amar”, de João Bastos Filho e Antônio Amaral, matriz 1028, e “…E Odete não voltou”, de Paquito e José Marcílio, matriz 1027. Em setembro de 1945, saíram mais dois sambas, no disco 15423: “Arma perigosa”, de Paquito e Paulo da Portela, matriz 1136, e “Cantora de samba”, de Amado Régis, matriz 1137. Para o carnaval de 1946, Linda lança quatro músicas, todas aqui incluídas: no Continental 15554, lançado ainda em dezembro de 45, o samba “Sublime perdão”, de Amado Régis, matriz 1315, e a marchinha “Quando a gente fica velho”, matriz 1316, dela própria com Aylce Chaves e o mesmo Amado Régis que assina a música do lado ª Em janeiro de 46 sai o disco 15585, com a marchinha “Atchim!”, de J.Piedade e Príncipe Pretinho, matriz 1381, e o samba “Claudionor”, de Cândido Moura e Miguel Baúso, matriz 1382. Em março de 1946, Linda lança o samba “Não adianta chorar”, de Ari Monteiro e Felisberto Martins, no Continental 15591-A, matriz 1399 (o outro lado é com Emilinha Borba, apresentando a batucada “Ai, Luzia!”, de Guaraná e Jararaca). Em junho de 1946, no Continental 15644, saem dois sambas de Paquito (Francisco da Silva Fárrea Júnior, 1915-1975), consagrado compositor de sucessos carnavalescos: “Banco de jardim”, parceria dele com Dorival Aires e Jaime de Souza, matriz 1444, e “Banco de praça”, que ele assina junto com Carlos de Souza e João Bastos Filho, matriz 1443. A primeiro de julho de 1948, Linda grava a rumba “Jack, Jack, Jack”, de Haroldo Barbosa e Armando Castro, matriz 1900, e o samba “Mais um amor, mais uma desilusão”, de José Maria de Abreu, matriz 1901, que a Continental irá lançar para seu suplemento de julho a setembro desse ano, com o número 15926. A marchinha “Parceiro de Schubert” e o samba “A escrava Isaura” saíram pela Star, para o carnaval de 1948, disco 0009, que não consta nem mesmo na Discografia Brasileira em 78 rpm, e eu próprio não encontrei informações a respeito de quem seriam seus autores, quem souber favor informar pra gente. Para a folia de 1951, Linda grava o disco Carnaval 008, com o samba “Vou partir”, de Aylce Chaves e Paulo Gesta, e a batucada “Batuqueiro novo”, de Tancredo Silva, Rual Marques e José Alcides. Do disco Star 243, também de 1951, vem o lado B, o samba africano “Raça negra”, também de Aylce Chaves e Paulo Gesta. Por essa mesma gravadora, futura Copacabana, Linda lança, para o carnaval de 1952, e ainda em dezembro de 51, o disco 308, do qual apresentamos o lado A, a marchinha “Recruta 23” (referência a programa humorístico da Rádio Mayrink Veiga do Rio de Janeiro, então grande rival da poderosa Nacional, e de grande audiência na época), de autoria do radialista, compositor e pianista  Aloysio Silva Araújo e do comediante Zé Trindade (aquele do bordão “Mulheres, cheguei!”). Por fim, encerrando esta primeira parte, apresentamos aquele que foi o maior sucesso da carreira de Linda Rodrigues: o samba-canção “Lama”, de Paulo Marques e Aylce Chaves, regravado mais tarde por Ângela Maria e Maria Bethânia, entre outros intérpretes, e até hoje um clássico. Linda o imortalizou na Continental em 10 de abril de 1952, com lançamento em maio-junho do mesmo ano sob número 16559-A, matriz C-2839. Um fecho realmente de ouro para a primeira parte desta nossa retrospectiva a respeito de Linda Rodrigues. Até a próxima!
*TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO

Jacob Do Bandolim 6 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 53 (2013)

E aqui vamos nós com a edição de número 53 do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil, a sexta dedicada ao mago do bandolim, mestre Jacob Pick Bittencourt. Desta feita, apresentamos uma seleção de 14 fonogramas preciosos, extraídos de acetatos radiofônicos. O início da gloriosa carreira do mestre foi justamente como calouro no “Programa dos novos”, da Rádio Guanabara, em 1934. Sem pretensões profissionais, alcançou a nota máxima, disputando com 28 concorrentes, e ainda com um júri do qual faziam parte Orestes Barbosa, Francisco Alves e Benedito Lacerda, entre outros. Na mesma emissora, formou o grupo Jacob e sua Gente, revezando-se com o Gente do Morro, de Benedito Lacerda, no acompanhamento dos grandes astros da época (Noel Rosa, Lamartine Babo, Ataulfo Alves, Augusto Calheiros…). Com o sucesso obtido na Guanabara, o mestre Jacob passa a ser presença constante em programas radiofônicos, tocando, em troca de cachê , nas rádios Cajuti, Fluminense, Transmissora, Mayrink Veiga (onde atuava no programa de Ademar Casé, avô da Regina) e Ipanema, depois Mauá, sendo nesta última que Jacob ganhou um programa só seu.
Bem, senhores ouvintes, a PR-GRB tem o prazer de apresentar esta seleção dos melhores momentos das audições radiofônicas de Jacob do Bandolim. Para começar, temos o choro “Dengoso”, de autoria de João Pernambuco (João Teixeira Guimarães, Jatobá, hoje Petrolândia, PE, 1883-Rio de Janeiro, 1947), gravado originalmente por ele mesmo em solo de violão, em 1930. Em seguida temos “Gadu namorando”, de Ladislau Pereira da Silva e Alcyr Pires Vermelho (não anunciado pelo locutor como parceiro). A peça tem inúmeros registros, o primeiro deles feito em 1956 pelo trombonista Raul de Barros. Passando do choro à valsa, temos “Lamento”, de Nestor Monteiro e Gilberto Santos, uma joia rara que, infelizmente, não chegou ao disco comercial. Voltando ao choro, Jacob nos oferece “Soluçando”, de Cândido Pereira da Silva, o Candinho Trombone (Rio de Janeiro,1879-idem, 1960), originalmente gravado em 1916 pelo Grupo o Passos no Choro. Em seguida temos mais uma valsa, “Adelina”, de autoria do cavaquinista Mário Álvares Conceição, o Mário Cavaquinho (Rio de Janeiro, 1861-idem, 1905), cujas primeiras gravações foram feitas ainda na fase mecânica, pela Banda da Casa Edison, sem indicação exata de anos. Depois vem um choro do próprio Jacob, “Carícia”, por ele mesmo gravado na RCA Victor em 1956. O tango “O despertar da montanha”, faixa seguinte, é certamente o mais famoso trabalho do compositor Eduardo Souto, paulista de Santos (ou São Vicente, não há certeza), nascido em 1882 e falecido no Rio de Janeiro em 1942. “O despertar” foi composto em 1919 e sua primeira gravação data de 1931, pela Orquestra Colonial. Tem vários registros, inclusive do próprio Jacob do Bandolim, feito em 1949, e é uma obra conhecida até mesmo a nível internacional. Ganhou letra de Francisco Pimentel em 1946, gravada nesse ano por Sílvio Caldas. Logo depois, os choros “Cristal” e “Diabinho maluco”, do próprio Jacob, por ele gravados, respectivamente, em 1951 e 1956. Compositor, organista e maestro, Henrique Alves de Mesquita (Rio de Janeiro, 1830-idem, 1906) comparece aqui com “Batuque”, rotulado como “tango característico” no selo da primeira gravação, feita em 1910 pela Banda do Corpo de Bombeiros na Victor americana. Já o “Choro da saudade” é de autoria de um… paraguaio! Sim, é do violonista Agustín Barrios (1885-1944), que homenageou a música e o povo de seu Paraguai natalício compondo obras modeladas a partir de canções populares das Américas Central e do Sul. “Saxofone, por que choras?” é o choro mais conhecido do clarinetista Severino Rangel, o Ratinho (Itabaiana, PB, 1896-Duque de Caxias, RJ, 1972), que também formou dupla humorística com Jararaca, de geral agrado. O choro foi lançado pelo próprio Ratinho em 1930, e tem vários registros (o próprio Jacob fez o seu em 1952). “Heróica” é outra composição do mago do bandolim, mas só seria gravada comercialmente em 1980, por outro bandolinista de renome, Déo Rian. E, para terminar, temos uma fala do próprio Jacob do Bandolim, na qual ele exalta a força de vontade e a capacidade de seus músicos acompanhantes, e elogia a acolhida que o público de São Paulo sempre lhe deu, mais que o do próprio Rio de Janeiro natal. Ah, como são as coisas… Não poderia haver melhor encerramento para esta compilação de registros radiofônicos do mestre Jacob, que certamente será muitíssimo bem recebida pelos ouvintes da PR-GRB. E semana que vem tem mais Jacob, hein? Aguardem…
TEXTO SAMUEL MACHADO FILHO

Jacob Do Bandolim 5 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 52 (2013)

Este é o quinquagésimo-segundo volume do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil, e o quinto dedicado ao riquíssimo legado deixado por esse autêntico mestre das cordas que foi Jacob do Bandolim. E com ele, retomamos a apresentação de registros comerciais de Jacob, uma vez que, como os amigos cultos, ocultos e associados do TM se recordam, no volume anterior tivemos gravações domésticas extraídas dos “saraus” que o mago do bandolim promovia em sua casa no bairro carioca de Jacarepaguá.

São doze preciosas gravações, todas evidentemente feitas na RCA Victor. Abrindo nossa seleção desta semana, um choro do próprio Jacob, “Ciumento”, gravação de 14 de março de 1955, lançada em maio do mesmo ano, disco 80-1434-B, matriz BE5VB-0700. Em seguida, outra joia do choro concebida por ele mesmo, “Sempre teu”, gravada em 13 de junho de 1955 e lançada em agosto seguinte com o número 80-1476-A, matriz BE5VB-0769. Depois tem a música do verso desse disco, matriz BE5VB-0770, uma regravação do choro “Um a zero”. Ele foi composto por Pixinguinha em 1919,  por ocasião da conquista do Campeonato Sul-Americano de Futebol pelo Brasil, que derrotou o Uruguai exatamente por essa contagem, gol de Arthur Friendenreich. A primeira gravação, no entanto, só saiu em 1946, com o próprio Pixinguinha ao saxofone em dueto com a flauta de Benedito Lacerda, que entrou como parceiro na música por acordo comercial que existia entre ambos. Jacob recorda logo depois o “tango brasileiro” “Amapá”, de Juca Storoni (João José da Costa Jr., Rio de Janeiro, 1868-idem, 1917), cujo primeiro registro deu-se em 1909, na Victor americana, pela Banda do Corpo de Marinheiros Nacionais. Jacob fez seu registro em 13 de janeiro de 1956, com lançamento em março seguinte sob n.o 80-1565-B, matriz BE6VB-0942, e voltaria a gravar “Amapá” em 1960, no LP “Na roda do choro”. O registro do “ponteado” “De Limoeiro a Mossoró”, do próprio executante, data de 13 de março de 1956, com lançamento em maio seguinte sob n.o 80-1596-A, matriz BE6VB-1015. Outra obra-prima do mestre é “Carícia”, choro que ele gravou em 13 de julho de 1956, com lançamento em setembro do mesmo ano, com o n.o 80-1667-B, matriz BE6VB-1214. Temos em seguida outra demonstração do apreço de Jacob ao carnaval pernambucano, com o frevo “Buscapé”, gravado em 14 de setembro de 1956 e lançado em novembro (certamente com vistas à folia recifense de 57) sob n.o 80-1706-A, matriz BE6VB-1305. Apresentamos também o verso desse disco, matriz BE6VB-1306, outro frevo, só que de Jonas Cordeiro, “Pimenta no salão”. Um clássico do mestre Pixinguinha, o choro “Sofres porque queres” foi por ele composto inspirado em uma briga conjugal! Ele próprio o gravou pela primeira vez com sua flauta, em 1917, e o regravaria ao saxofone junto com o flautista Benedito Lacerda (que recebeu co-autoria) em 1946. Onze anos depois, a 10 de julho de 1957, Jacob do Bandolim gravou esta sua versão, lançada em setembro seguinte com o n.o 80-1845-A, matriz 13-H2PB-0165. Do limiar de 1958, em 17 de janeiro, é a gravação de Jacob para seu choro “Implicante”, lançada em abril do mesmo ano com o n.o 80-1930-A, matriz 13-J2PB-0339. O maxixe “Fubá”, motivo folclórico adaptado por Romeu Silva, surgiu em 1925, em gravação do cantor Fernando Albuquerque, e é revivido por Jacob em registro de 26 de agosto de 1959, lançado em novembro seguinte com o n.o 80-2125-A, matriz 13-K2PB-0736. A voz que se ouve vocalizando o refrão junto com o coro é a do próprio Jacob! Para finalizar, o lado B desse disco, matriz 13-K2PB-0737: o choro “Velhos tempos”, outra composição própria do mestre com a qualidade habitual. E atenção: nas próximas duas semanas, teremos mais tesouros preciosos gravados pelo mestre Jacob do Bandolim. Aguardem!

TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO

Jacob Do Bandolim – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 51 (2013)

E chegamos à edição número 51 do Grand Record Brazil, apresentando a quarta e última parte desta retrospectiva dedicada a este mestre das cordas que foi Jacob do Bandolim. E neste volume, o acervo do pesquisador Sérgio Terra nos revela 20 gravações que nunca foram lançadas comercialmente, feitas em gravador doméstico durante os antológicos “saraus” que o mestre promovia em sua casa, no bairro carioca de Jacarepaguá, semanalmente. Abrindo esta seleção, a valsa “Quando me lembro”, de outro bandolinista famoso, Luperce Miranda (1904-1977), por ele próprio gravada originalmente em 1932. O choro “Murmurando”, que vem em seguida, não é a famosa composição do maestro Fon-Fon, parece ser um outro choro do próprio Jacob. “O voo da mosca”, também do mestre, é uma réplica ao “Voo do besouro”, de Rinsky e Korsakov, e seria por ele gravada na RCA Victor em 1962, no álbum “Primas e bordões”. “Mariposa da luz” é da pianista e professora de música Neusa França, só gravado comercialmente em 1973, pelo citarista Avena de Castro. Na faixa 6, outro clássico do choro, “Flor do abacate”, de autoria de Álvaro Sandim (1862-1919), surgido em 1913, na fase mecânica de gravação, em registros do Grupo Faceiro e dos Chorosos do Abacate. Jacob do Bandolim o gravou duas vezes pela RCA Victor, em 1949 e 1960. E já que, neste 2013, comemoramos os 150 anos de nascimento do compositor e pianista Ernesto Nazareth (1863-1934), ele comparece nesta seleção de inéditas do mestre Jacob com uma de suas obras mais famosas, a polca-choro “Apanhei-te cavaquinho”, faixa 4, surgida em disco no ano de 1916, na gravação do flautista Passos, e inúmeras vezes regravada, inclusive pelo próprio Nazareth em solo de piano. Temas clássicos também batem ponto nesta seleção: a “Valsa número 7 de Chopin” (temos também a “número 1”) e as “Czardas”, do italiano Vittorio Monti (1868-1922). “Noites cariocas” é outro choro clássico do mestre Jacob, por ele lançado em 1957 e com inúmeras regravações, sendo até hoje peça obrigatória no repertório de qualquer “chorão”. “Receita de samba” e “Vibrações” são outras composições muito apreciadas do mago do bandolim, e foram por ele gravadas na RCA Victor em 1967, no excelente álbum “Vibrações”. Um certo doutor Formiga (quem seria?) recita um “Poema para Jacob”, por ele feito em justa homenagem ao mestre. Chico Buarque comparece aqui com “Carolina”, composição surgida em 1967 no Terceiro Festival Internacional da Canção (FIC), da TV Globo, defendida por Cynara e Cybele, recém-saídas do Quarteto em Cy. Jacob muito admirava Chico, e previu, acertadamente, que ele “atravessaria os anos”. O mestre também apresenta sua valsa “Santa Morena”, cuja gravação comercial, de 1954, está no volume 3 de nosso retrospecto. A clássica valsa “Velho realejo”, de Custódio Mesquita e Sadi Cabral, é outro clássico de nosso cancioneiro, e foi lançada em 1940 na voz de Sílvio Caldas, sendo várias vezes regravada. Outro clássico é “Três estrelinhas”, de autoria de Anacleto de Medeiros (1866-1907), músico, compositor, fundador e regente da Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. Recebeu depois letra de Catulo da Paixão Cearense, sendo rebatizada como “O que tu és”. Antônio d’Áuria (1912-1988) aparece como uma espécie de convidado especial, nas faixas “Poesia e amor”, de Mário Álvares Conceição, só gravada comercialmente em 1976 por outro bandolinista, Déo Rian, e “Helena”, valsa de Albertino Pimentel, surgida ainda no tempo da gravação mecânica, em 1909, em execução da já mencionada Banda do Corpo de Bombeiros carioca. Encerrando esta seleção tempos “Marilene”, choro de Pixinguinha e Benedito Lacerda, por eles próprios lançado em 1950, com o mestre Pizindim ao saxofone e Benedito à flauta (na verdade a música é só de Pixinguinha, e Benedito entrou como parceiro por acordo comercial entre ambos). Enfim, um tesouro raro, de notável importância histórica, que o GRB oferece a tantos quantos apreciem a boa música instrumental brasileira. As 122 fitas cassetes gravadas por Jacob do Bandolim durante seus “saraus” foram doadas ao Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro, e aqui apresentamos uma preciosíssima amostra deste trabalho. Bom divertimento!
Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Jacob Do Bandolim 3 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol 50 (2013)

É com muita alegria que estamos de volta com o Grand Record Brazil, a divisão de 78 rpm do TM, para alegria de nossos amigos cultos, ocultos e associados. E nesta quinquagésima edição, apresentamos a terceira parte desta retrospectiva de gravações do genialíssimo Jacob do Bandolim, este que sem nenhuma dúvida foi um autêntico mestre das cordas. Todas as gravações, evidentemente, são da RCA Victor, feitas entre 1953 e 1955, do acervo do colecionador Sérgio Prata, a quem novamente agradecemos a cortesia. Em ordem de lançamento, são estas as 13 joias que lhes apresentamos: para começar, o lado B do disco 80-1163 (faixa 11 de nossa sequência), o choro “Pardal embriagado”, de Patrocínio Gomes, gravação de 14 de maio de 1953, lançada em julho seguinte, matriz BE3VB-0122. Em seguida, o disco 80-1214, gravado em 13 de agosto de 1953 e lançado em outubro seguinte: abrindo-o, matriz BE3VB-0235, o baião “Brotinho”, faixa 12 de nossa sequência, composto por nada mais nada menos que seu filho Sérgio Bittencourt, que seria também cantor e compositor (autor de clássicos como “Eu quero”, “Canção a medo”, “Modinha” e, naturalmente, “Naquela mesa”, em homenagem póstuma a seu pai), além de colunista de jornais e revistas. Jacob o executa ao vibraplex (instrumento que ele mesmo criou, um violão-tenor ligado a um órgão Hammond, que tinha som parecido com os dos atuais sintetizadores), e esta foi a primeira composição gravada do filho Sérgio. No verso, matriz BE3VB-0236, uma primorosíssima execução de Jacob para a clássica valsa “Rapaziada do Brás”, de Alberto Marino (faixa 13 de nossa sequência), que homenageia o bairro de São Paulo de mesmo nome, cuja população era basicamente de imigrantes italianos e seus descendentes. Surgida em 1926, na gravação dos irmãos saxofonistas Jota e O.Pizarro (quem seriam?), esta valsa teve maior repercussão a partir de 1932, nos registros dos Sextetos Piratininga e Bertorino Alma (anagrama do autor, Alberto Marino), e em 1960 ganhou letra do filho do autor, Alberto Marino Jr., gravada com êxito por Carlos Galhardo. Temos depois o frevo “Sai do caminho”, do próprio Jacob, disco 80-1226-B, gravado em 10 de setembro de 1953 e lançado em novembro seguinte para a folia de 54, matriz BE3VB-0254 (faixa 8 de nossa sequência), no qual ele mostra a admiração que tinha pelo carnaval do Recife, embora não-folião. A mazurca “Vidinha boa”, do próprio executante, faixa 9 desta seleção, foi gravada em 15 de fevereiro de 1954, com lançamento em abril seguinte sob número 80-1269-B, matriz BE4VB-0346. O samba-canção “Santa morena”, também de Jacob, e faixa 10 de nossa sequência, foi gravado pelo mestre em 13 de abril de 1954, com lançamento em julho seguinte sob número 80-1295-A, matriz BE4VB-0411. No verso, matriz BE4VB-0412, outra primorosa execução ao vibraplex, a do samba-canção “Saudade”, composição própria do mestre e faixa 5 de nossa sequência. As faixas 6 e 7 são do disco seguinte, o RCA Victor 80-1344, gravado em 12 de julho de 1954 e lançado em setembro seguinte com dois choros do nosso próprio mestre: abrindo-o, matriz BE4VB-0503, “Bola preta”, e, completando-o, matriz BE4VB-0504, “Saliente”, ambos bastante conhecidos e apreciados. Do disco 80-1390, gravado em 14 de setembro de 1954 e lançado em dezembro seguinte, apresentamos as duas faixas, que novamente demonstram o apreço de Jacob pelo carnaval recifense, sendo evidentemente frevos: abrindo-o, “Toca pro pau”, matriz BE4VB-0577 (faixa 4 de nossa seleção) e, completando-o, matriz BE4VB-0578, “Rua da Imperatriz” (faixa 3), visando, claro, a folia pernambucana de 1955. Em seguida, primeira faixa da nossa sequência, o samba “Meu segredo”, gravação de 13 de janeiro de 1955 lançada em março seguinte (80-1418-B, matriz BE5VB-0642). E encerrando cronologicamente nossa seleção, sendo na sequência a faixa 2, outro primoroso choro do próprio executante, “Benzinho”, gravação de 14 de março de 1955, matriz BE5VB-0699, lançada em maio do mesmo ano sob número 80-1434-A. Enfim, mais uma bela amostra do talento e da maestria deste mágico das cordas que foi Jacob do Bandolim! Gostaria inclusive de dedicar esta nossa retrospectiva ao Daniel Soares, o SenhorDaVoz, meu colega de YouTube, grande admirador de Jacob do Bandolim e do choro, cujo canal lá no YT pode ser visitado. Lá você vai encontrar vídeos com hits da MPB de várias épocas, inclusive diversos registros do grande Jacob do Bandolim, de quem continuaremos este retrospecto. Até lá!
* Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Jacob Do Bandolim 2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musucal – Vol. 49 (2013)

Em sua quadragésima nona edição, o Grand Record Brazil apresenta a segunda parte da retrospectiva dedicada a este genial instrumentista que foi Jacob Pick Bittencourt, o notável Jacob do Bandolim (1918-1969). Aqui apresentamos mais doze preciosas gravações, do acervo do pesquisador Sérgio Prata, que por certo farão a alegria e o deleite de todos aqueles que apreciam a boa música instrumental brasileira. Como já informado anteriormente, é na RCA Victor, a partir de 1949, que Jacob irá registrar toda a sua discografia em 78 rpm e quase toda em LPs (nesse formato, gravou na CBS o álbum “Retratos”, em 1964).
Evidentemente, as doze faixas desta segunda parte são registros RCA Victor. Para começar, um choro de outro mestre, Pixinguinha, “Teu aniversário”, originalmente intitulado “Recordando” e com gravação original pelo próprio Pizindim com sua flauta, em 1935. Jacob o regravou com o novo título em 30 de junho de 1950, com lançamento em setembro seguinte sob n.o 80-0688-B, matriz S-092700 (o lado A é “Mexidinha”, que está em nosso volume 1 deste retrospecto). Temos depois um choro do próprio mestre, “Por que sonhar?”, gravado em 16 de março de 1953 e lançado em maio seguinte, com o n.o 80-1122-B, matriz BE3VB-0050. No lado A, matriz BE3VB-0049, mais um choraço dele mesmo, “Tatibitate”. E é como compositor que Jacob comparece na maior parte das faixas deste volume 2. Caso do choro “Biruta”, gravado em 19 de junho de 1952 e lançado em outubro seguinte, disco 80-0987-B, matriz SB-093331, do qual também apresentamos a faixa de abertura, o coco “Forró de gala”, matriz SB-093300, dele mesmo, claro. Do compositor e instrumentista carioca Mário Álvares da Conceição, também conhecido como Mário Cavaquinho (1861?-1906?), Jacob resgata o choro ‘Teu beijo”, gravação de 11 de setembro de 1950, lançada em novembro seguinte com o n.o 80-0711-B, matriz S-092750 (ao que parece o registro original). Temos em seguida outra bela e conhecida obra-prima do choro, concebida pelo próprio Jacob: “Doce de coco”, em antológica gravação de 18 de dezembro de 1950, lançada em março de 51 (80-0745-B, matriz S-092813), sendo até hoje número obrigatório em qualquer roda de choro. Depois iremos travar contato com a primeira gravação que Jacob fez do choro clássico “Lamento”, de Pixinguinha (que depois teve o título mudado para o plural, “Lamentos”), originalmente lançado em 1928 pela Orquestra Típica Pixinguinha-Donga. Jacob o registrou pela primeira vez em 14 de março de 1951 com lançamento em junho seguinte (80-0767-A, matriz S-092905), e voltaria a gravá-lo primorosamente, em 1967, para o álbum “Vibrações”. Na faixa 10 está o verso desse disco, a polca “Siri tá no pau”, matriz S-092906, de autoria de Miguel de Vasconcellos, originalmente lançada em 1914 pelo grupo O Passos no Choro e também bastante conhecida. Na faixa 9, Jacob executa à violinha (!) outro belo choro seu, “Nostalgia”, gravação de 23 de julho de 1951, lançada em outubro seguinte sob n.o 80-0813-B, matriz S-092986. “Eu e você” é outro choro do próprio mestre, gravado em 5 de maio de 1952 e lançado em julho seguinte (80-0931-B, matriz S-093263). Para encerrar esta segunda parte, temos “Choro de varanda”, no caso, certamente, a varanda da casa de Jacob, em Jacarepaguá, que é o lado A de “Teu beijo”, de Mário Cavaquinho, matriz S-092749 (claro que essa outra música é do Jacob mesmo). Enfim, mais uma amostra da magia, do talento e da maestria do eterno Jacob do Bandolim. E vem muito mais por aí, esperamos…

*TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO.

Jacob Do Bandolim 1 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 48 (2012)

Em sua edição de número 49, o Grand Record Brazil inicia uma retrospectiva dedicada àquele que, certamente, foi um dos maiores bandolinistas brasileiros, senão o maior: o carioca Jacob Pick Bittencourt, que ganhou a imortalidade como Jacob do Bandolim.

Nascido no Rio de Janeiro em 14 de fevereiro de 1918, de pai capixaba e mãe polonesa, Jacob estudou no Colégio Anglo-Americano e serviu no CPOR. Quando já “arranhava” o bandolim, trabalhou no arquivo do Ministério da Guerra, e depois fez carreira como serventuário da Justiça do Rio, onde chegou até mesmo a ser escrivão de vara criminal. Sua casa no bairro de Jacarepaguá, avarandada e com jardim, era palco de memoráveis rodas de choro (os “saraus”), e nelas Jacob recebia seus grandes amigos chorões. Entre seus ídolos estavam Almirante, Noel Rosa, o pianista Nonô, Luiz Vieira, Pixinguinha e Ernesto Nazareth. Mesmo não sendo lá grande entusiasta do carnaval, gostava bastante de frevo. Foi “guru” de Sérgio Cabral (pesquisador e produtor musical, pai do governador do Rio, Sérgio Cabral Filho), Hermíno Bello de Carvalho e Ricardo Carvo Albim. Autor de clássicos do choro (“Vale tudo”, “Noites cariocas”, “Assanhado”, “Doce de coco” e muitos mais), Jacob formou, nos anos 1960, o conjunto Época de Ouro, que mesmo após sua morte, em 13 de agosto de 1969, permaneceu na ativa, e existe até hoje. Seu último espetáculo público aconteceu em 1968, no Teatro João Caetano do Rio de Janeiro, onde se apresentou ao lado de Elizeth Cardoso e do Zimbo Trio, além, é claro, do Época de Ouro. Teve dois filhos: Sérgio Bittencourt (jornalista e também compositor, sendo inclusive autor do clássico “Naquela mesa”, em homenagem ao pai) e Elena Bittencourt, que tornou-se depois presidente do Instituto Jacob do Bandolim.

As gravações de Jacob do Bandolim que compõem esta retrospectiva são do acervo do pesquisador Sérgio Prata, e abrangem o período de 1947 a 1959. Nesta primeira parte, composta de doze fonogramas, apresentamos as músicas de seus quatro primeiros discos, gravados na Continental. Jacob estreou com o 78 de número 15825, gravado em 9 de julho de 1947 e lançado entre agosto e outubro desse ano. Abrindo-o, matriz 1693, um choro dele mesmo, “Treme-treme” (a faixa 11 da nossa sequência), e no verso, matriz 1686, a bela valsa “Glória”, de Bomfiglio de Oliveira (faixa 12), lançada originalmente em 1931 por Gastão Formenti, com letra de Branca Coelho. O segundo disco de Jacob levou o número 15872, sendo lançado em março de 1948. No lado A, gravado em 23 de junho de 47, matriz 1687, a bela valsa, dele próprio, “Salões imperiais” (que abre a sequência). No lado B, gravado em 9 de julho de 47, matriz 1694, outra composição do trompetista Bomfiglio de Oliveira, o conhecido choro “Flamengo” (a faixa 2), originalmente gravado pelo autor em 1931, sendo este registro de Jacob também muitíssimo apreciado. Curioso é que, nessas quatro primeiras gravações, Jacob é acompanhado pelo conjunto do violonista César de Faria, pai do grande Paulinho da Viola. Em seguida, do terceiro disco, número 15957, gravado em 18 de setembro de 1948 e lançado entre outubro e dezembro seguintes, outras duas composições do próprio Jacob: o choro “Remelexo” (faixa 4), matriz 1943, e a valsa “Feia” (faixa 3), matriz 1944 (vocês vão perceber que a música não faz nenhuma jus ao título, sendo de fato primorosa). Do quarto e último disco de Jacob na Continental, número 16011, lançado em março-abril de 1949, o choro “Cabuloso”, de sua autoria (faixa 5), matriz 1942, e a conhecida “Flor amorosa”, matriz 1945, de Joaquim Antônio da Silva Callado, originalmente polca e aqui choro, cujos primeiros registros, no início do século passado (fase mecânica de gravação) foram apenas instrumentais, apesar de Catulo da Paixão Cearense ter lhe posto versos em 1880, mesmo ano da morte de Callado.

As outras quatro faixas foram gravadas por Jacob do Bandolim já na RCA Victor, onde o mestre passa a registrar praticamente toda a sua discografia. Sua primeira sessão de estúdio na “marca do cachorrinho” dá-se em 12 de maio de 1949, com o disco 80-0602, lançado em julho daquele ano, e do qual apresentamos a faixa de abertura: o famoso tango “O despertar da montanha”, de Eduardo Souto, matriz S-078881. Temos depois “Sorrir dormindo”, ou “Por que sorris”, valsa de Juca Kalut lançada ainda nos tempos do disco mecânico, levada a disco por Jacob em 9 de janeiro de 1950 com lançamento em junho do mesmo ano (80-0653-B, matriz S-092605), uma valsa do próprio Jacob, “Encantamento”, por ele gravada na mesma sessão e lançada em julho de 1950 (80-0667-B, matriz S-092607), e uma deliciosa polca também de autoria do próprio mestre Jacob, “Mexidinha”, gravação de 30 d ejunho de 1950 e lançada em setembro seguinte com o número 80-0688-A, matriz S-092699. Está muito bom para começar, não é mesmo? Então aguardem que vem mais por aí, tá combinado? Então até lá…

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Noel Rosa – Seleção 78 RPM Do Toque Musical Vol. 47 (2012)

Nascido a 11 de dezembro de 1910, em um chalé da Rua Teodoro da Silva, no bairro carioca de Vila Isabel (onde atualmente está erguido um edifício residencial que leva seu nome), Noel de Medeiros Rosa viveu pouco, apenas 26 anos e quase cinco meses (morreu em 4 de maio de 1937, vitimado pela tuberculose), mas deixou uma obra musical extensa (quase 260 composições!), criativa e cheia de sucessos. E o impressionante é que as composições do Poeta da Vila são sempre atualíssimas, nunca passam de época. Um legado que tem atravessado os anos, com muita justiça, e faz a gente se sentir grato por ele ter existido, ainda que por pouco tempo, e deixado coisas tão eternas, tão permanentes.

Pois nesta sua quadragésima-sétima edição, o Grand Record Brazil reverencia o talento de Noel Rosa como autor e também intérprete, através de 14 preciosos fonogramas. E ele só levou a disco música sua, com e/ou sem parceria (aqui todas as músicas são dele sozinho). Quem mais gravou músicas de Noel, por sinal, acabou sendo ele próprio: 33 ao todo.

Noel deixou gravações nos selos Parlophon, Odeon, Columbia (futura Continental) e Victor. Sua primeira gravação como intérprete, aqui incluída, foi a toada “Festa no céu”, lançada pela Parlophon em agosto de 1930, disco 13185-A, matriz 3320. No verso, matriz 3654, a embolada “Minha viola”, a faixa seguinte. Depois temos um autêntico clássico noelino: o samba “Com que roupa?”, um eufemismo da época para “Com que dinheiro?”, traduzindo a crise econômica causada pelo “crack” da Bolsa de Nova York, em 1929. Outro registro Parlophon, datado de 30 de setembro de 1930 e lançado em novembro seguinte sob n.o 13245-A, matriz 4007. Um autêntico estouro no carnaval de 1931! Quase ao final do registro, o maestro e compositor Eduardo Souto diz de improviso: “Vai de roupa velha e tutu, seu trouxa!” (Noel depois fez nova gravação de “Com que roupa?”, com outra letra e em dueto com Inácio Guimarães de Loyola, o Ximbuca). No verso, matriz 4008, outro samba interessante, “Malandro medroso”. “Gago apaixonado” é um samba muito apreciado principalmente por sua originalidade, e o próprio Noel declarou ser esta sua melhor composição, pois além de original, não conseguia ser cantada por seus vizinhos e respectivos papagaios de estimação… A gravação, lançada pela Columbia em março de 1931 (disco 22023-B, matriz 381007), tem um atrativo à parte: o solo de lápis nos dentes do cantor Luiz Barbosa, abrindo e fechando a boca para alterar o timbre! “Cordiais saudações” é um “samba epistolar”, que surgiu na revista “Mar de rosas”, e nela foi interpretado por Sílvio Caldas. Noel gravou a música duas vezes na Parlophon, e esta é a primeira versão, com acompanhamento da Orquestra Copacabana, do palestino Simon Bountman, matriz 131170, não lançada comercialmente, uma vez que foi desaprovada pelo próprio compositor, que fez outro registro dias depois, com o Bando de Tangarás, sendo esse último o que foi para as lojas, em julho de 1931, com o número 13327-A. E é do lado B, matriz 131185, um outro bom samba do mestre Noel por ele próprio cantado, “Mulata fuzarqueira” (ser “da fuzarca” era o mesmo que farrear). O “samba fonético” “Picilone”, subintitulado “Yvone”, é uma alusão à reforma ortográfica que aboliu do alfabeto brasileiro a letra “y”, agora reconduzida ao mesmo. “Dizer um picilone” era a mesma coisa que elogiar. Noel canta junto com João “Braguinha” de Barro, seu colega no Bando de Tangarás, nesta gravação lançada pela Parlophon em setembro de 1931, com o n.o 13344-B, matriz 131208. Há também referência à Kananga do Japão, uma “sociedade familiar dançante e carnavalesca” então existente no Rio. “O pulo da hora” saiu pela mesma gravadora um mês mais tarde, em outubro de 31, disco 13350-A, matriz 131241, tendo no verso, matriz 131242, “Vou te ripar”, que também apresentamos aqui. Foram incluídas, igualmente, as duas músicas do único disco-solo de Noel na Victor, o de n.o 33488, gravado em 10 de outubro de 1931 e lançado em novembro seguinte. Abrindo-o, matriz 65252, “Por causa da hora”, referência ao horário de verão, adotado pela primeira vez naquele ano para economizar luz elétrica e que voltaria em outros anos, sendo adotado ininterruptamente no Brasil a partir de 1985. Mais atual impossível… No verso, matriz 65251, saiu “Nunca… jamais”. Em “Mentiras de mulher”, Noel canta junto com Artur Costa, ator do teatro de revista. Gravação lançada pela Columbia em fevereiro de 1932, sob n.o 22083-A, matriz 381158. Para encerrar, apresentamos “Espera mais um ano”, também cantado em dueto por Noel e Arthur em registro Columbia, de novembro de 1931, mas, ao que parece, não lançado comercialmente na época, sendo o disco de prova encontrado nos arquivos do pesquisador Eduardo Corrêa de Azevedo. Em 1983, “Espera mais um ano” foi registrado na Eldorado pelo Conjunto Coisas Nossas para o LP “Noel Rosa inédito e desconhecido”, aproveitando no início parte deste registro original. Enfim, uma pequena amostra da genialidade do grande Noel Rosa, que, mesmo tendo voz pequena, agradava bastante como intérprete, pois tinha muita bossa e talento!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Nelson Cavaquinho – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 46 (2012)

Em sua edição de número 46, o Grand Record Brazil reverencia um dos maiores sambistas que o Brasil já teve: o carioca e mangueirense Nélson Antônio da Silva, que ganhou a imortalidade com o pseudônimo de Nélson Cavaquinho (1911-2002). Filho de músico da Banda da Polícia Militar e sobrinho de violinista, Nélson deixou um acervo de mais de quatrocentas composições, com letras quase sempre remetendo a temas como o violão, mulheres, botequins e em especial a morte. Entre suas músicas mais conhecidas estão “Rugas”, “A flor e o espinho”, “Quando eu me chamar saudade”, “Juízo final”, “Luz negra”, “Pranto de poeta”, “Cuidado com a outra” e “Degraus da vida”.

A seleção aqui contida reúne 14 preciosas gravações, todas elas sambas, e foi feita pelo blog Coisa da Antiga, do grande Ary do Baralho. Ciro Monteiro aqui comparece com quatro gravações Victor: “Apresenta-me aquela mulher”, parceria de Nélson com Augusto Garcez e G. de Oliveira, de 25 de maio de 1943, lançada em setembro do mesmo ano (80-0107-B, matriz S-052779), “Não te dói a consciência”, em que Nélson Cavaquinho tem a parceria também de Augusto Garcez mais Ari Monteiro, também de 1943, gravada em 6 de julho daquele ano com lançamento em outubro (80-0119-B, matriz S-052799), “Aquele bilhetinho”, que Nélson e Garcez assinam com Arnô Canegal, de 13 de abril de 1945, lançada em maio seguinte (80-0282-A, matriz S-078154), e por fim o clássico “Rugas”, da mesma tríade de “Apresenta aquela mulher”, gravado pelo “Formigão” em 21 de março de 1946 e lançada em maio do mesmo ano (80-0406-A, matriz S-078450). “Rugas” tem vários registros posteriores, entre eles os de Roberto Silva, Jair Rodrigues e Luiz Cláudio. Em “O fruto da maldade”, Nélson Cavaquinho tem a parceria de César Brasil, e o lançamento deu-se pela Continental, na voz de Jorge Veiga, entre julho e setembro de 1951, disco 16434-B, matriz 2632. “Minha fama”, parceria de Nélson com Magno de Oliveira, foi gravado na Odeon por Risadinha, em 4 de setembro de 1952, mas só saiu em junho de 53 com o n.o 13455-B, matriz 9413. Do carnaval de 1954, “Amor que morreu”, parceria de Nélson Cavaquinho com Roldão Lima e Gilberto Teixeira, foi gravado por Elizeth Cardoso na Todamérica em 12 de novembro de 53 e lançado ainda em novembro (TA-5380-B, matriz TA-591). E Elizeth seria mais tarde uma das mais assíduas divulgadoras da obra de Nélson. Da parceria dele com César Brasil também é “Não brigo mais”, gravado também na Todamérica por Vítor Bacelar (Salvador, BA, 1911-Rio de Janeiro, 2005) em 23 de agosto de 1954, com lançamento em setembro seguinte (TA-5471-B, matriz TA-723), visando a folia de 55. Em seguida uma curiosa incursão de Nélson pelo samba-canção, em parceria com Guilherme de Brito: “Garça”, com Ruth Amaral (também compositora e intérprete de marchinhas carnavalescas), lançado pela Columbia em agosto de 1955, disco CB-10192-A, matriz CBO-547. Ruth também interpreta “Cinzas”, dos mesmos autores mais Renato Gaetani, que a mesma Columbia lançou em novembro de 55, sob n.o CB-10210-A, matriz CBO-584. Foi também incluída a gravação de Nerino Silva, que a Chantecler lançou em janeiro de 1963, disco 78-0677-B, matriz C8P-1354, e depois incluída no LP “Arroz de festa”. Em seguida, Nélson assina com seu inseparável parceiro Guilherme de Brito o samba “Palavras malditas”, gravado na Todamérica por Ary Cordovil em 6 de setembro de 1957, disco TA-5724-B, matriz TA-100091, visando o carnaval de 58, e que foi regravado por Beth Carvalho em 2011, no CD “Nosso samba tá na rua”. O mesmo Ary Cordovil canta “Cheiro de vela”, de Nélson com José Ribeiro, em gravação do extinto selo Vila, disco 10003-A, que o Instituto Memória Musical Brasileira diz ser de 1961. E o cantor Orlando Gil encerra nossa seleção com “Negaste um cigarro”, parceria de Nélson Cavaquinho com José Batista, gravação de 1962 para outro selo extinto, o Albatroz, disco A-121-B. É a homenagem do Coisa da Antiga e do Toque Musical, através do GRB, a este grande compositor e poeta que foi Nélson Cavaquinho!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

It’s Rock 2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 45 (2012)

E chegamos esta semana à quadragésima-quinta edição do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil, apresentando a segunda parte de uma seleção dos primórdios do rock brasileiro, feita e digitalizada pelo amigo Chico, administrador do blog Sintonia Musikal, que gentilmente a liberou para os amigos cultos, ocultos e associados do nosso TM, e a quem mais uma vez agradecemos a cortesia.

Abrindo a seleção desta semana, que perfaz um total de 13 fonogramas, o mambo-rock (ou rumba-rock) “Cha-hua-hua”, de Joe Lubin e Irving J. Roth, na execução de Luizinho e seu Conjunto, gravação lançada pela Columbia em 1958 com o n.o CB-11044-A, matriz CBO-1630, e que também integrou o LP “Um baile com Luizinho”, reedição ampliada de um álbum de dez polegadas com o mesmo título, editado um ano antes. Guitarrista, o músico teve também a banda Luizinho e seus Dinamites, e faleceu na década de 1990. Em seguida outra faixa instrumental, lançada pela mesma gravadora e também em 58, um pouco antes: o rock “Short shorts”, de Tom Austin, Bob Gaudio, Billy Dalton e William Crandall, integrantes do grupo americano Royal Teens, aqui na interpretação de Bolão e seus Rockettes, disco CB-11035-A, matriz CBO-1556, sendo também faixa do LP “Rock sensacional” (ironicamente reeditado mais tarde como “Viva a brotolândia”, mesmo título do primeiro LP de Elis Regina!). Saxofonista, clarinetista e flautista, Isidoro Longano, o Bolão (1925-2005) profissionalizou-se como músico em 1944, integrando várias orquestras e, como roqueiro, também gravou discos com os pseudônimos de Edward Long e Bob Longano, além de ter também integrado os Jet Blacks.

O pianista Aldovrando de Castro, o popular Mestre Duda,  foi durante anos muito popular na noite paulistana, teve conjunto próprio e gravou diversos discos de cunho dançante. Ele aqui comparece  com “The Tennessee rock and roll”, de Larry Coleman e Irving Reid, lançado em janeiro-fevereiro de 1958 pela Continental com o n.o 17514-B,  matriz 12017,  faixa depois incluída em seu segundo LP,  “Vai começar o baile”.

A faixa 4 é “Ski rock, ski roll”, de autoria de “Louis Oliveira and friends”, interpretada pelo grupo Os Cometas, gravação Odeon de 29 de janeiro de 1957, lançada em abril seguinte com o n.o 14185-B, matriz 11520. Na faixa 5, “A zoo rock”, composição e interpretação de Luiz de França, um autêntico zoológico musical, com imitações de animais diversos. Foi o primeiro lançamento, em 1959, de uma gravadora que durou pouco tempo, a Discobrás (0001-A).

Cantor e compositor paulistano, Osvaldo Rodrigues (n.1920) era linotipista nas oficinas de impressão do “Diário Oficial” de São Paulo antes de seguir carreira musical, e os colegas de trabalho o incentivaram a cantar. Gravou seus primeiros discos no selo Carnaval, da Star (futura Copacabana) em 1951, com músicas para a folia de Momo. Sua discografia, também nos selos Continental, Odeon e Philips, é bastante extensa: algo em torno de 50 discos 78, além de um compacto duplo e participações em LPs-coletâneas. Aqui, Osvaldo interpreta “Personality”, grande sucesso de Lloyd Price, composto por ele e Harold Logan, em versão de Sérgio Galvão e Neide Garcia. A gravação saiu em outubro de 1959 pela Continental, com o n.o 17740-A, matriz 12359. A versão teve também registros de Regina Célia e dos Golden Boys, na mesma ocasião.

Paraibano de João Pessoa, Jayro Aguiar (n. 1937)  gravou seu primeiro disco em 1956, na Copacabana, interpretando o samba “Uma noite no Rio” e a valsa “Sussu”. Tem também nove Lps, vários 78 rpm e alguns compactos em sua discografia. Seu último trabalho em disco foi o CD independente “Ontem, hoje e sempre”, nos anos 1990. Jayro Aguiar aqui comparece com o calipso “O herói da lambreta”, dele próprio em parceria com o acordeonista Mário Mascarenhas, lançado pela Copacabana em novembro de 1959 com o n.o 6051-A, matriz M-2508.

Liderado por Renato Barros, o grupo Renato e seus Blue Caps foi um dos mais populares dos anos 1960/70, e também um dos ícones da Jovem Guarda. Eis aqui uma faixa rara, em que eles aparecem com o nome de Os Adolescentes, lançada em 1960 pela modesta gravadora Ciclone, com o número 12015-A: “Espante a tristeza (Shoo ya blues)”, de Luther Dixon e Smith, em versão de Pedro Leandro Nunes. Foi aliás a estreia do grupo em disco.

Humorista e entrevistador de televisão, tendo criado tipos inesquecíveis, o carioca Jô Soares (n. 1938) mostra aqui seu lado roqueiro com a divertida “Volks do Ronaldo”, que ele mesmo lançou no compacto simples de selo Farroupilha n.o FA-103-B, em 1963. Naquele tempo, é bom que se frise, o Volkswagen 1300 ainda não era chamado de Fusca. Logo em seguida vem outro comediante famoso, Tutuca, pseudônimo de Usliver João Baptista Linhares (n.1934), famoso pelo bordão “Xiiiiiiii…..”. Ele aqui interpreta, de sua autoria, “Playboy maluco”, gravação de 12 de maio de 1960, lançada em julho seguinte, que inaugurou o selo Camden, da RCA Victor, com o n.o CAM-1001-A, matriz 13-L3PB-0966. E olha só quem vem depois: José Messias. Sim, ele mesmo, aquele jurado do Raul Gil! Admirado por uns, detestado por outros, ele aqui interpreta, de sua autoria, o “Rock do Cauby”, satirizando a popularidade do grande Cauby Peixoto, em gravação lançada pela Philips em abril de 1961, sob n.o P-61088-H-A. Nascido em Bom Jardim de Minas, no ano de 1928, Messias tem mais de duzentas composições gravadas, nas vozes de inúmeros intérpretes, como Ângela Maria, Cauby Peixoto, Nélson Gonçalves, Roberto Carlos e José Ricardo, entre outros.

Outro comediante querido, este lembrado com saudade pelo público, Walter d’Ávila (Porto Alegre, RS, 1911-Rio de Janeiro, 1996) aqui comparece com o “Rock do vovô”, de Bruno Marnet e Ari Monteiro, que gravou na Odeon em 30 de junho de 1961, com lançamento em novembro seguinte sob n.o 14744-B, matriz 14802.

E encerramos esta seleção com chave de ouro, trazendo nada mais nada menos que o futuro “Rei”, Roberto Carlos! Ele aqui interpreta, de Hélio Justo e Erly Muniz, “Triste e abandonado”, lançada pela CBS em outubro de 1962 com o número 3239-B, matriz CBO-3495, e depois disponibilizada em compacto duplo. Não poderia haver encerramento melhor para esta seleção, vocês não acham? Pois então, divirtam-se!

*Texto de Samuel Machado Filho

It’s Rock 1 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 44 (2012)

Esta semana, em sua quadragésima-quarta edição, o Grand Record Brazil apresenta a primeira de duas partes de uma seleção de rock (ou coisa parecida) produzida e digitalizada pelo blog Sintonia Musikal, na pessoa de seu administrador Chico, um autêntico especialista em resgatar o passado de nossa música dita “jovem”, e seguidor de carteirinha do TM. Aquele abraço, Chico!

Permitam-me os amigos cultos, ocultos e associados começar minha resenha desta primeira parte pela faixa 5. Ela foi justamente o começo, o pontapé inicial do rock tupiniquim. Estou falando da gravação feita pela carioca Nora Ney (Iracema de Souza Ferreira, 1922-2003) de “Rock around the clock”, de Jimmy de Knight e Max C. Freedman. A música era sucesso com Bill Haley e seus Cometas, e fazia parte do filme “Sementes da violência (The blackboard jungle)”, da MGM. Em 24 de outubro de 1955, Nora compareceu ao estúdio da Continental, no Edifício Cineac-Trianon (Avenida Rio Branco, esquina com Rua Bittencourt da Silva, em frente ao lendário Café Nice) para gravar sua personalíssima versão deste rock pioneiro, lançada em novembro-dezembro do mesmo ano com o n.o 17217-A, matriz C-3730. Foi assim que o rock and roll começou a balançar a juventude brasileira!

No restante do programa que o Chico nos oferece, outras doze peças raras, curiosas e interessantes do início do rock brasileiro, a chamada “pré-Jovem Guarda”. Nem mesmo a pianista Carolina Cardoso de Menezes (Rio de Janeiro, 1916-idem, 1999) resistiu aos encantos do chamado “ritmo alucinante”, compondo e executando o seu “Brasil rock”, em gravação Odeon de 14 de março de 1957 (14191-B, matriz 11601), lançada em maio daquele ano. Em seguida vem a faixa mais antiga desta seleção do amigo Chico: uma versão em português de “Jambalaya (On the bayou)”, clássico country de Hank Williams, assinada pelo comediante Edair Badaró, então atuando nas Emissoras Unidas (Rádio e TV Record de São Paulo). Na  interpretação, Neyde Fraga (São Paulo, 1924-Rio de Janeiro, 1987), então também atuando na Record. Gravado pela Odeon em 4 de setembro de 1953 e lançado em novembro do mesmo ano (13527-A, matriz 9873), este é considerado o maior sucesso da cantora. Em seguida, a versão de Aloysio de Oliveira para “In the mood”, clássico da big band de Glenn Miller, de Joe Garland e Andy Razaf, interpretada pelo Bando da Lua, formado e dirigido por Aloysio, com o nome de “Edmundo”. Gravação de 8 de junho de 1954, feita nos EUA pela Decca (hoje Universal Music), mas só lançada no Brasil vinte anos mais tarde, no LP “Bando da Lua nos EUA”, produzido por João Luiz Ferrete para a Chantecler, então representante da Decca/MCA. Depois, o curioso “rock-baião-samba” “Eu sou a tal”, de Murilo Vieira, Edel Ney e O.Vargas, interpretado por Mara Silva (Isabel Gomes da Silva, Campos, RJ, n.1930), em gravação lançada pela RGE em dezembro de 1957 (10076-A, matriz RGO-335). A faixa 6 traz aquele que é considerado o primeiro rock cem por cento brasileiro, letra e música: “Rock and roll em Copacabana”, assinado por esse verdadeiro cronista que foi Miguel Gustavo, e gravado na RCA Victor por Cauby Peixoto em 30 de janeiro de 1957, com lançamento em maio seguinte (80-1774-A, matriz 13-H2PB-0043). Temos depois a versão feita pelo radialista Paulo Rogério para o conhecido mambo-rock “Tequila”, de Chuck Rio, originalmente instrumental. A gravação coube à carioca Araci Costa (1932-1976) e saiu pela Continental em setembro-outubro de 1958, com o número 17595-A, matriz C-4123. “Tequila” era um dos números mais apreciados da orquestra do “bandleader” e vibrafonista Sylvio Mazzucca (São Paulo, 1929-idem, 2003), que curiosamente vem aqui com o chá-chá-chá “Cerveza”, de Boots Brown, em gravação lançada pela Columbia no mesmo ano de 1958 (CB-11079-A, matriz CBO-1767). O cantor Mário Augusto, criador de hits como “O amor de Terezinha” e “Calcutá”, aqui comparece com a versão de Fred Jorge para “Claudette”, de Roy Orbison, extraída de seu segundo disco, o Odeon 14372-B, gravado em 26 de agosto de 1958 e lançado em setembro do mesmo ano, matriz 12848. “A minha, a sua, a nossa favorita” (como César de Alencar a anunciava em seu programa na Rádio Nacional) Emilinha Borba vem aqui com a versão do misterioso A.Bourget para o chá-chá-rock “Patrícia”, de Pérez Prado, lançada pela Columbia também em 1958 (CB-11070-B, matriz CBO-1766). Marita Luizi, um daqueles nomes atualmente relegados ao mais completo esquecimento, apesar de terem tido sua época, aqui comparece com o calipso “Sonho maluco”, de Elzo Augusto e Miranda, lançado pela Copacabana em dezembro de 1959 com o n.o 6086-B, matriz M-2590, o segundo de seus três discos nesse formato. Marita também deixou um LP intitulado “Os grandes momentos” (Alvorada/Chantecler, 1978), ao que parece coletânea, e participou do álbum “Cinco estrelas apresentam Inara” (Copacabana, 1958), reunindo músicas de Inara Simões de Irajá (suas faixas nesse disco são”E ele não vem” e “Boca da noite”). Outro nome da pré-história de nosso rock and roll, Regina Célia, comparece aqui com a divertida “Aula de inglês em rock”, de Canarinho e Kid Sax, gravada na Polydor em 9 de dezembro de 1959 e lançada em janeiro de 60 no 78 rpm n.o 342-B, matriz POL-3774. Encerrando esta primeira seleção do amigo Chico, Cizinha Moura, que deixou apenas dois discos 78 com quatro músicas, aqui interpretando, do segundo e último deles, o Chantecler 78-0134-B, lançado em junho de 1959, o fox “Brotinho Lili”, de Alberto Roy e Domingos Paulo, matriz C8P-268. Enfim, um interessante panorama dos primórdios do rock and roll no Brasil, que continuaremos na próxima semana, sempre agradecendo ao Chico do Sintonia Musikal pela gentileza de permitir o aproveitamento desta seleção no GRB. Até lá!

SAMUEL MACHADO FILHO.

Nilo Sérgio, Dick Farney, Lúcio Alves, Tito Madi, Bill Farr, Johnny Alf – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 43 (2012)

E chegamos à quadragésima-terceira edição do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil. Esta semana, apresentamos gravações de alguns intérpretes considerados precursores da bossa nova, e feitas antes da eclosão oficial do movimento, em 1958, com o LP “Canção do amor demais”, de Elizeth Cardoso, e o 78 rpm “Chega de saudade”/”Bim bom”, com João Gilberto.
Começamos com Nilo Sérgio, pseudônimo de Nilo Santos Pinto. Também compositor, arranjador e maestro, iniciou sua carreira nos áureos tempos da lendária Rádio Nacional, e gravou seus primeiros discos em 1943/44, com músicas americanas. Após gravar na RCA Victor, onde se iniciou, na Continental e na Todamérica, fundou, em 1953, sua própria gravadora: a Musidisc, por sinal uma das pioneiras do LP no Brasil. Embora pequena, a gravadora tornou-se notável no período em que atuou, e por lá passaram nomes do quilate de Ed Lincoln, Orlandivo, Eliana Pittman e o também maestro Léo Peracchi. Teve também o selo Nilser (iniciais de seu nome artístico). A Musidisc notabilizou-se por álbuns temáticos tipo “Música para adormecer”, “Datas felizes”, etc., e lançou orquestras ditas “grandiosas”, como Violinos Mágicos e Românticos de Cuba (ambas, na verdade, eram a Tabajara de Severino Araújo), esta última a de maior êxito, que executava versões aboleradas de hits nacionais e internacionais, até mesmo de Roberto Carlos. Este último álbum, de 1979, foi a última produção de Nilo, que faleceria dois anos mais tarde. Para esta seleção, o GRB escalou seu primeiríssimo disco interpretado em português, o Continental 16085, lançado entre julho e setembro de 1949. No lado A, matriz 2122, a “Canção de aniversário” (“Hoje é o dia do teu aniversário, parabéns, parabéns”…), de José Maria de Abreu e Alberto Ribeiro. No verso, matriz 2123, o samba (que na verdade é samba-canção) “Falta-me alguém”, de Pedro Caetano e Claudionor Cruz. No acompanhamento, a mesma Tabajara de Severino Araújo que se converteria na Violinos Mágicos (também conhecida como “Orquestra Romântica de Severino Araújo”) e na Românticos de Cuba, anos mais tarde.
Farnésio Dutra e Silva, aliás Dick Farney (Rio de Janeiro, 1921-São Paulo, 1987) é outro que também começou em disco interpretando músicas americanas, tendo inclusive feito longas temporadas nos EUA. Foi o primeiro, inclusive, a gravar um clássico da música popular americana, o fox ‘Tenderly”. E o disco escalado para esta edição do GRB, também da Continental, é o primeiro no qual interpretou música brasileira, com o número 15663, gravado em 2 de junho de 1946 e lançado em agosto do mesmo ano, com dois sambas. A faixa de abertura, matriz 1509, é o clássico “Copacabana”, de João de Barro, o Braguinha, e Alberto Ribeiro, e justamente a que chamou mais atenção, principalmente pela maneira de interpretar, calcada em cantores americanos como Bing Crosby (inevitavelmente criticada por conservadores da época), e pelo acompanhamento de orquestra de cordas, no caso a de Eduardo Carmelo Patané (São Paulo, 1906-idem, 1969), que passaram, desde então, a constituir modelo de sofisticação para a MPB. O verso, matriz 1508, é “Barqueiro do São Francisco”, também de Alberto Ribeiro, agora em parceria com Alcyr Pires Vermelho, que também teve repercussão, ainda que um pouquinho menor que a de “Copacabana”. Ambas as músicas seriam regravadas por Dick Farney inúmeras vezes ao longo de sua carreira, assim como outras expressivas páginas de seu repertório: “Marina”, “Alguém como tu”, “Somos dois”, “Ponto final” etc.
Lúcio Ciribelli Alves (Cataguazes, MG, 1927-Rio de Janeiro, 1993), de longa e vitoriosa carreira como intérprete, começou a tocar seu violão na mais tenra idade, estimulado pelo pai, maestro da banda de música de sua cidade natal, mudando-se com a família para o Rio de Janeiro quando tinha sete anos. Foi ironicamente apelidado pelo compositor e humorista Silvino Neto de “cantor das multidinhas” (em comparação a Orlando Silva, “o cantor das multidões”). Aos 14 anos, fundou o conjunto Namorados da Lua, do qual era cantor, violonista e arranjador, que fez grande sucesso e desfez-se em 1947 (já sem Lúcio Alves, passaria a chamar-se Os Namorados). Como compositor, seu maior hit foi o samba “De conversa em conversa”, em parceria com Haroldo Barbosa, que gravou junto com os Namorados da Lua mais Isaura Garcia. Outras páginas expressivas de seu repertório são “Nunca mais” (Dorival Caymmi), “Reverso” (Gilberto Milfont e Marino Pinto), “Valsa de uma cidade” (Ismael Neto e Antônio Maria), “Tereza da praia” (dueto com Dick Farney, de Tom Jobim e Billy Blanco), etc. De Lúcio, eis aqui o disco Continental 16730, gravado em 25 de fevereiro de 1953 e lançado em maio-junho do mesmo ano. Abrindo-o, matriz C-3056, o beguine “Cedo para amar”, dos compositores americanos Sidney Lippman e Sylvia Dee, em versão de Bruno Gomes, no original intitulado ‘Too young”e sucesso dois anos antes com Nat King Cole. Esta mesma versão teve outro registro em seguida, com Dóris Monteiro, na Todamérica. Bruno também assina, em parceria com Fernando Lobo, a música do lado B, matriz C-3057, o samba “Procurando meu bem”. Ambas as faixas com acompanhamento dirigido pelo notável maestro gaúcho Radamés Gnattali, com o pseudônimo de Vero.
Radamés também acompanha Chaiki Madi, aliás Tito Madi, paulista de Pirajuí (n.1929), em outro disco Continental, o de número 17416, gravado em 4 de setembro de 1956, porém só lançado em março-abril de 57, apresentando dois clássicos do repertório de Tito. No lado A, matriz C-3917, a valsa “Chove lá fora”, que mereceria inúmeras outras gravações, inclusive do próprio compositor, tendo até uma versão em inglês com os Platters, “It’s raining outside”. No verso, matriz C-3916, o samba-canção, com tendência mais para toada, “Gauchinha bem querer”, composto por Tito quando participou de festejos promovidos pela Rádio Farroupilha de Porto Alegre. Tito Madi teve inúmeros outros sucessos como compositor e intérprete, destacando-se “Não diga não” (dele com Georges Henry), “Sonho e saudade”, “Carinho e amor”, “Balanço Zona Sul” e “Menina moça” (esta última de Luiz Antônio).
Em seguida temos Bill Farr, pseudônimo de Antônio Medeiros Francisco (Sapucaia, RJ, 1925-Rio de Janeiro, 2010). Passou a infância em Petrópolis, e organizou um grupo vocal quando ainda estudava no Colégio Werneck, ingressando na carreira artística ao terminar o curso científico. Começou como vocalista no Hotel Quitandinha, e depois passou a atuar na Rádio Nacional carioca, por intermédio de César de Alencar. Gravou seu primeiro disco na Sinter, em 1952, com o samba-canção “Abraça-me”, de Luiz Bittencourt, e o bolero “Depois do amor”, de José Maria de Abreu e Oswaldo Santiago. Nos anos 1960, deixou a carreira de cantor, mudando-se para Madri, capital da Espanha, onde trabalhou em um escritório de comércio exterior. De Bill Farr apresentamos o disco Continental 16941, lançado em abril de 1954. No lado A, matriz C-3334, aquele que foi certamente o maior sucesso de sua carreira: o fox “Oh!”, de Byron Gay e Arnold Johnson, em versão de Haroldo Barbosa. No verso, matriz C-3335, um samba-canção do então estreante Billy Blanco, “Maria Tereza”.
E para encerrar com chave de ouro, apresentamos Johnny Alf, pseudônimo de Alfredo José da Silva (Rio de Janeiro, 1929-Santo André, SP, 2010). Cantor, compositor, pianista, autor de inúmeras músicas de sucesso (quem não se lembra, por exemplo, de “O que é amar” e “Eu e a brisa”?), gravou seu primeiro disco, apenas instrumental, em 1953, na Sinter, exectando ao piano com seu trio o samba-canção “De cigarro em cigarro” (Luiz Bonfá) e o choro “Falseta”, dele mesmo. De Alf apresentamos o disco Copacabana 5568, de 1956, com duas composições próprias. Abrindo-o, a matriz M-1392 traz o samba “Rapaz de bem”, autêntico precursor da bossa nova, não só pela maneira de Alf interpretá-lo, como também pela letra, que traduzia bem o modo de vida da juventude da Zona Sul do Rio de Janeiro. A música daria título, em 1961, ao primeiro LP do compositor, lançado pela RCA Victor. No verso desse 78 da Copacabana, matriz M-1391, o samba-canção “O tempo e o vento”, que aproveita apenas o título da famosa trilogia de romances do escritor gaúcho Érico Veríssimo, na época com dois volumes já publicados (“O continente”, de 1949, e “O retrato”, de 1951, sendo o terceiro e último, “O arquipélago”, de 1961). Um fecho realmente de ouro para esta edição do GRB, focalizando intérpretes precursores da bossa nova, inovadores para a época em que surgiram. Bom divertimento!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO

Orlando Silva / Nelson Gonçalves – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 42 (2012)

Já em sua quadragésima-segunda edição, o meu, o seu, o nosso Grand Record Brazil homenageia dois intérpretes inesquecíveis que deixaram inestimável contribuição para a história de nossa música popular: Orlando Silva e Nélson Gonçalves.

Orlando Garcia da Silva era carioca do Engenho de Dentro, nascido a 3 de outubro de 1915 na Rua General Clarindo, hoje Rua Augusta. Era filho do violonista José Celestino da Silva, que participou de serenatas, peixadas e feijoadas junto com o mestre Pixinguinha, ambiente em que também viveu Orlando por três anos, até o falecimento do pai, vitimado pela gripe espanhola. Orlando teve uma infância normal, sempre gostando muito de violão e já fã, na adolescência, de Carlos Galhardo e Francisco Alves. Seu primeiro emprego foi como estafeta da Western, indo depois para o comércio, onde foi sapateiro, vendedor de roupas e tecidos e trocador de ônibus. Quando era “office-boy”, ao saltar de um bonde para entregar uma encomenda, sofreu grave acidente que causou o amputamento de parte de um dos pés, ficando inativo por um ano. Estimulado por amigos, Orlando começou sua peregrinação pelas rádios, querendo ao menos ser ouvido, sem conseguir, dada sua aparência de moço pobre e mal trajado, que mancava. Quando já estava a ponto de desistir, foi ouvido pelo compositor Bororó (autor do clássico “Da cor do pecado”) nos corredores da Rádio Cajuti. Impressionado, Bororó arranjou uma audição com Francisco Alves, que aconteceu dentro de seu carro! E Chico, encantado com a voz de Orlando, o escalou imediatamente para seu programa dominical na Cajuti, e sua estreia aconteceu em 24 de junho de 1934. Em janeiro do ano seguinte, lançava seu primeiro disco, pela Columbia, para o carnaval, interpretando a marchinha “Ondas curtas” e o samba “Olha a baiana”. Ainda em 1935, foi para a RCA Victor, onde ficaria até 1942, lançando sucessos sobre sucessos (‘A última estrofe”, “Lábios que beijei”, “Carinhoso”, “Rosa”, “Abre a janela”, “A jardineira”, “Meu consolo é você”, recebendo do locutor esportivo Oduvaldo Cozzi o apelido de “cantor das multidões”, após o retumbante êxito de sua primeira apresentação em São Paulo, em janeiro de 1938. Um fenômeno de popularidade como poucos. Gravou também na Odeon, na Copacabana e na Mocambo, voltando definitivamente à RCA Victor em 1960. Morreu em 7 de agosto de 1978, em seu Rio natal, vitimado por uma trombose.

Para esta edição do GRB, foram selecionadas gravações de Orlando na Odeon, na Victor e na Copacabana. Da Copacabana temos: do disco 5067, lançado em maio-junho de 1953, os dois lados: no lado A, faixa 8 de nossa sequência, matriz M-392, o samba-canção “Meu lampião”, de Alberto Ribeiro e Alcyr Pires Vermelho e, no verso, matriz M-393 e faixa 7 de nossa sequência, o samba “Escravo do amor”, de J. Cascata, Leonel Azevedo (autores dos clássicos “Lábios que beijei” e “Juramento falso”, também gravados por Orlando) e Lilinha Fernandes. Ainda dessa marca, o lado B do disco 099, lançado em agosto de 1952 e faixa 9 de nossa sequência, apresentando o choro cantado “Moreninha”, de autoria do descobridor de Orlando, Bororó (de quem o cantor também gravou o hit “Curare”, em 1940). A faixa 10, da primeira fase de Orlando na Victor, tem outro choro cantado: “Mentirosa”, de Custódio Mesquita e Mário Lago, gravado em 9 de junho de 1941 e lançado em agosto seguinte, disco 34783-B, matriz S-052240. Por fim, apresentamos, da Odeon, a canção-marcha “A carta”, de Custódio Mesquita, que é, como o nome indica, uma carta escrita por um expedicionário da FEB, então lutando na Itália durante a Segunda Guerra Mundial, a sua mãe no Brasil. Gravação de 21 de julho de 1944, lançada em setembro seguinte com o número 12487, ocupando os dois lados do disco, matrizes 7613 e 7614.

As 6 primeiras faixas desta nossa edição foram destinadas a Nélson Gonçalves, nome artístico de Antônio Gonçalves. O “gogó de ouro” nasceu na cidade gaúcha de Santana do Livramento, em 25 de junho de 1919, filho dos portugueses Manoel e Libânia, que ganhavam a vida vendendo cortes de tecidos a domicílio, de porta em porta. Era o irmão mais velho de Joaquim, o Quincas, que também seria cantor, gravando alguns discos de fados lusitanos. Conforme documentos disponíveis, a família mudou-se para São Paulo em 1926, morando primeiro no Canindé, e depois fixando-se no Brás. Ali Nélson e o irmão começaram a estudar, no Liceu Eduardo Prado. Para reforço da economia familiar, “seu” Manoel levava os filhos para cantar nas feiras livres, em cima de caixotes, acompanhando-os ao violão. Nélson (para a família apenas Nico) , apesar de ser gago (ou “taquilárico”), cantava com dicção normal, desenvolvendo seus dotes em bares, restaurantes, festas e rodas de amigos. Logo ele iria conhecer momentos de trabalho duro: primeiro como operário numa fábrica de tamancos e depois como polidor de metais na Wolff, atividades de fato insalubres, chegando até a praticar pugilismo amador. Em 1937, numa festa de casamento no Brás, é ouvido pela cantora Sônia Carvalho, que deixara a carreira para se casar, e, encantada, deu-lhe o nome artístico que o eternizou: Nélson Gonçalves. Sônia deu-lhe aulas de canto em sua casa por cerca de 4 meses, e o levou para um teste na Rádio São Paulo, PRA-5 (“a voz amiga”), então dirigida pelo maestro Gabriel Migliori, sendo aprovado e contratado, pedindo dispensa da Wolff. Em um período que ficou afastado do rádio, Nélson foi garçom no bar do irmão Quincas, na Avenida São João e, em 1940, cantou em programas da PRE-4, Rádio Cultura (“a voz do espaço”), com auditório na mesma avenida. Em 1941, vai ao Rio de Janeiro tentar a sorte em programas de calouros, sendo várias vezes reprovado. Dois meses mais tarde, volta ao Rio, agora com um acetato gravado na Rádio Record, onde cantava a valsa “Se eu pudesse um dia” e a canção “Os anos carregaram”, ambas de Orlando Monello e Oswaldo França, aprovado pelo diretor da Cássio Muniz, então representante da RCA Victor em São Paulo. Nélson vai até à gravadora apresentar o acetato para o diretor artístico Vittório Lattari, que o ouve mas não acredita ser ele o cantor, e que ele tinha “roubado” essa prova de alguém, dada sua gagueira. Com o ambiente pesado, Nélson só volta para pegar o acetato de volta no dia seguinte, e para sua sorte lá estava o compositor e flautista Benedito Lacerda, que resolve tirar a prova acompanhando Nélson com seu regional. Provado que o cantor era ele mesmo, e com a profecia de Benedito (“esse vai ser o maior cantor do Brasil!”), Nélson Gonçalves é finalmente contratado pela RCA Victor, que seria sua primeira, única e última gravadora. Sua primeira sessão de gravação acontece em 4 de agosto de 1941, com as músicas “Se eu pudesse um dia”, “Sinto-me bem” (primeiro disco), “Formosa mulher” e “A mulher dos sonhos meus” (segundo disco). Em quase 60 anos de atividade, Nélson gravaria 869 músicas, e seria um dos maiores vendedores de discos da RCA Victor em todo o mundo: mais de 50 milhões de cópias! Apresentou-se também nos EUA, mais precisamente em Nova York, no Radio City Music Hall, em novembro de 1960. Entre seus maiores sucessos estão: “Quem mente perde a razão”, “Deusa do Maracanã”, “Maria Betânia”, “Normalista”, “A volta do boêmio” (certamente o maior de todos), “Deusa do asfalto”, “Escultura”, “Fica comigo esta noite” e muitos, muitos mais. O envolvimento com cocaína prejudicou em muito sua carreira, mas ele conseguiu se recuperar do vício após um tratamento de choque no qual ficou quatro meses enclausurado em seu quarto (até batia na mulher!). Seu último trabalho em disco foi o CD “Ainda é cedo”, uma homenagem a cantores e compositores de nossa música pop surgidos nos anos 1980, lançado em 1997. Nélson morreria em 18 de abril do ano seguinte, 1998, no Rio de Janeiro, e vários episódios de sua vida e carreira só se esclareceram com a publicação, em 2002, do livro “A revolta do boêmio – A vida de Nélson Gonçalves”, escrito por Marco Aurélio Barroso.

Nesta edição do GRB, temos seis gravações de Nélson Gonçalves, todas, claro, pela RCA Victor:  “Primeira mulher”, de Kid Pepe e Theo Magalhães, gravado em 30 de maio de 1944 e lançado em agosto seguinte (80-0198-B, matriz S-052969), “Ciúme”, de Nóbrega de Macedo e José Batista, gravação de 4 de março de 1947 lançada em maio seguinte (80-0511-A, matriz S-078729), “Dona Rosa”, nostálgico e divertido dueto com Isaura Garcia, de autoria dos irmãos Aloysio e Armando Silva Araújo, gravação de 21 de novembro de 1946, lançada em março de 47 (80-0493-B, matriz S-078644), sendo as três músicas sambas. Depois, vem a canção “Os anos carregaram”, de Oswaldo França e Orlando Monello, que Nélson gravou em seu acetato de apresentação e registraria comercialmente em 13 de janeiro de 1942 com lançamento em seu quinto disco, em maio seguinte, com o número 34879-A, matriz S-052452. Para encerrar, mais dois sambas: “Seus olhos na canção”, de Marino Pinto e Waldemar Gomes, gravação de 29 de janeiro de 1946 lançada em maio seguinte (80-0400-A, matriz S-078427) e “Ela me beijou”, de Herivelto Martins e Artur Costa, gravado em 10 de agosto de 1944 e lançado em outubro seguinte sob número 80-0218-B, matriz S-078033. Desta gravação participa o Trio de Ouro original (Herivelto Martins, Dalva de Oliveira e Nilo Chagas), não creditado no selo certamente por serem então contratados da Odeon.

Enfim, dois cantores inesquecíveis, de vozes privilegiadas, que o GRB agora oferece para os amigos cultos, ocultos e associados do TM. Ouçam e recordem!

* TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO

Vários Cantores – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 41 (2012)

E chegamos à quadragésima-primeira edição do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil. Desta vez, apresentamos uma seleção de sambas, do acervo do blog Coisa da Antiga (http://coisadaantiga.blogspot.com.br), pertencente ao grande Ary do Baralho, dono de um autêntico tesouro do gênero, cheio de raridades absolutas. A você, Ary, os nossos mais sinceros agradecimentos.
Esta seleção, com doze preciosas gravações, dá bem uma ideia do que o Ary tem no Coisa da Antiga, autênticas joias do samba. E começamos com o carioca Moreira da Silva (1902-2000), o eterno rei do samba de breque, de vida (98 anos) e carreira lôngevas. O eterno Kid Morenguera se faz presente através do disco Columbia 22165, lançado em dezembro de 1932, com vistas ao carnaval de 33. A faixa de abertura, matriz 381362, apresenta este que foi o primeiro grande sucesso do Moreira: “Arrasta a sandália”, de Aurélio Gomes e Osvaldo Vasques, este último conhecido como Baiaco (Rio de Janeiro, c.1913-idem, c.1935), ritmista e um dos fundadores da primeira escola de samba, a Deixa Falar, no bairro carioca do Estácio. Entoado num esquema pergunta-resposta típico do partido alto, caiu no agrado popular e tornou-se um clássico. No verso, matriz 381363, outra composição do Baiaco, agora em parceria com Ventura: “Vejo lágrimas”.O acompanhmento neste disco é do grupo Gente do Morro, liderado por Benedito Lacerda, com sua flauta inconfundível.
Patrício Teixeira (1893-1972) era também carioca, da Rua Senador Eusébio, no coração da lendária Praça Onze, autêntico reduto de sambistas e boêmios, e onde aconteciam os desfiles da escolas de samba cariocas até sua demolição, para dar lugar à Avenida Presidente Vargas. Cantor e violonista, também foi professor de violão, e entre suas alunas mais famosas estão Linda Batista, Aurora Miranda e as irmãs Danusa e Nara Leão. Dele apresentamos, inicialmente, outra composição de Osvaldo “Baiaco” Vasques, em parceria com o grande flautista Benedito Lacerda: “Tenho uma nêga”, gravação Victor de 14 de novembro de 1932, lançada em dezembro seguinte com o número 33600-B, matriz 65535, também para a folia de 1933. Em seguida, de Max Bulhões e Mílton de Oliveira, outro samba bastante conhecido: “Sabiá-laranjeira” (“ouvi teu cantar bem perto”…), de Max Bulhões e Mílton de Oliveira, gravação Victor de 13 de maio de 1937, lançada em agosto seguinte com o número 34137-B, matriz 80404. Apesar de ser o outro lado do clássico “Não tenho lágrimas”, dos mesmos autores, este “Sabiá” também fez sucesso, e ambas as músicas seriam bastante cantadas no carnaval de 1938.
No disco seguinte, o Columbia 22238, de 1933, mais uma vez Osvaldo Vasques, o Baiaco, se faz presente, com dois sambas interpretados em dueto por Léo Vilar (futuro líder do conjunto vocal Anjos do Inferno) e Arnaldo Amaral (que também foi galã de cinema): de um lado, matriz 381527, “Rindo e chorando”, parceria de Baiaco com Bucy Moreira (1909-1982), neto da Tia Ciata, em cuja residência aconteciam rodas de samba na qual se reuniam autênticos bambas da MPB no início do século XX, como Pixinguinha, Donga e João da Baiana. Bucy também fundou uma escola de samba de nome pitoresco: Vê se Pode! No verso, matriz 381526, “Se passar da hora”, em que Baiaco tem a parceria de Boaventura dos Santos.
Relembramos depois o grande Ciro Monteiro (1913-1973), o “cantor das mil e uma fãs”, também conhecido como “Formigão”, sem dúvida um dos maiores expoentes de nosso samba, com uma carreira repleta de sucessos. Ele comparece aqui com dois sambas de Djalma Mafra (Rio de Janeiro, c.1900-idem, 1974), gravados na Victor: “Obrigação”, parceria de Djalma com Alcides Rosa, registrado em 3 de maio de 1945 e lançado em julho seguinte sob n.o 80-0294-B, matriz S-078163, e “Oh seu Djalma”, parceria de Mafra com Raul Marques (1913-1991), gravado em 13 de outubro de 1943 e lançado em dezembro seguinte com o n.o 80-0138-A, matriz S-052856.
Apresentamos em seguida duas composições de Geraldo Pereira (Juiz de Fora, MG, 1918-Rio de Janeiro, 1955), responsável por clássicos como “Falsa baiana”, “Sem compromisso”, “Escurinha” e “Escurinho”, interpretadas por Roberto Paiva (pseudônimo de Helim Silveira Neves). Primeiro, “Se você sair chorando”, de Geraldo com Nélson Teixeira, gravação Odeon de 26 de setembro de 1939, lançada em novembro seguinte com o n.o 11788-B, matriz 6206, visando ao carnaval de 1940. Depois Roberto canta “Tenha santa paciência”, parceria de Geraldo com Augusto Garcez, em gravação Victor de 6 de março de 1942, lançada em maio seguinte, disco 34923-A, matriz S-052489.
Para encerrar, o notável Otávio Henrique de Oliveira, aliás, Blecaute (Espírito Santo do Pinhal, SP, 1919-Rio de Janeiro, 1963), detentor de inúmeros êxitos no meio de ano e no carnaval (quem nunca cantou “Maria Candelária”, “General da banda”, “Papai Adão”, “Pedreiro Valdemar” e tantas outras?), e que recebeu esse apelido do Capitão Furtado (Ariowaldo Pires), por causa dos blecautes (apagões) que havia em toda a orla marítima do Brasil na época da Segunda Guerra Mundial durante a noite, a fim de evitar ataques inimigos. Blecaute aqui comparece com dois clássicos de Geraldo Pereira, gravados na Continental: Primeiro o delicioso “Chegou a bonitona”, de Geraldo com José Batista, gravado em 11 de agosto de 1948, com lançamento entre outubro e dezembro do mesmo ano, disco 15954-A, matriz 1922. Depois outro clássico do Geraldo Pereira, agora em parceria com Arnaldo Passos, o famoso “Que samba bom”, lançado em janeiro de 1949 para o carnaval daquele ano com o número 15981-B, matriz 2002. Um fecho realmente de ouro para esta sambística seleção do GRB, para enriquecer os acervos de muitos amigos cultos, ocultos e associados. E olha: pretendemos aproveitar muito mais coisas do blog Coisa da Antiga, pois o Ary do Baralho tem bastante coisa boa nele. Aguardem!
Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Várias Cantoras – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 40 (2012)

As vozes femininas sempre têm lugar reservado no Grand Record Brazil. E nesta quadragésima edição não poderia ser diferente, posto que temos mais uma compilação dedicada às cantoras, com 14 faixas.

Relembramos, mais uma vez, para começar, Aracy Cortes (Zilda de Carvalho Espíndola), nascida (31/3/1904) e falecida (8/1/1985) no Rio de Janeiro, filha de um “chorão”, Carlos Espíndola, e que morou até os 12 anos no bairro do Catumbi, onde teve um ilustre vizinho: nada mais menos que Pixinguinha. Foi Luiz Peixoto quem a descobriu, quando ela se apresentava no Circo Democrata interpretando e dançando maxixes, e seu nome artístico lhe foi dado por Mário Magalhães, crítico teatral do jornal “A Noite”. Sua estreia em teatro deu-se em 1921, na revista “Nós, pelas costas”. Em disco, suas primeiras gravações saíram em 1925, ainda no processo mecânico. Entre os anos 1950/60 afastou-se do meio artístico, voltando em 1965 no histórico show “Rosa de ouro”, produzido por Hermínio Bello de Carvalho e Kleber Santos, onde também atuavam Paulinho da Viola e Elton Medeiros, entre outros. Aracy aqui comparece com três ótimas faixas: “Você não era assim”, samba de Ary Barroso e Aricles França, lançado pela Odeon em junho de 1930 (10619-A, matriz 3592), mais os clássicos “Jura”, samba de Sinhô que ela mesma lançou na revista “Microlândia” (Parlophon 12868-A, lançado em novembro de 1928, matriz 2071) e “Iaiá”, que ficou mais conhecido como “Ai, Ioiô”, e é considerado o primeiro samba-canção brasileiro (Parlophon 12926-A, lançado em março de 1929, matriz 2366). Com música de Henrique Vogeler, teve antes duas letras: por Cândido Costa (“Linda flor”) e Freire Júnior (“Meiga flor”), mas a que pegou mesmo foi esta, assinada pelo descobridor de Aracy, Luiz Peixoto, e Marques Porto, e que ela também cantou na revista “Miss Brasil”. Nas três faixas, a cantora é acompanhada pela orquestra do palestino Simon Bountman, que tinha diversos nomes: Pan American, Copacabana, Simão Nacional Orquestra,  Orquestra Parlophon, todas na verdade a mesmíssima orquestra. Quando gravava na Columbia, aparecia nos selos como “Simão e sua Orquestra Columbia”.

Elisa de Carvalho Coelho (Uruguaiana, RS, 1909-Volta Redonda, RJ, 2001) era filha de um tenente do Exército e da jornalista e escritora Acy Carvalho, que redigia a seção feminina de “O Jornal”, matutino carioca. Passou a infância e a adolescência em Florianópolis, considerando-se por isso catarinense. Ao voltar para o Rio, cantava acompanhando-se ao piano em reuniões familiares nas quais compareciam jornalistas e poetas, amigos de seu pai. Numa dessas reuniões, em 1929, foi convidada pelo diretor da Rádio Clube do Brasil, um coronel amigo de seu pai, para apresentar-se lá, e agradou logo de saída. Excursionou pela Bahia e pelo restante do Nordeste em 1930, ao lado do compositor Hekel Tavares, passando a interpretar composições suas. Em 1935-36 esteve por duas vezes na Argentina e no Uruguai, e atuou no rádio até o final dos anos 1940. Era mãe do jornalista e apresentador de TV Goulart de Andrade, aquele do bordão “Vem comigo”, e sua discografia, gravada entre 1930 e 1934, compreende 15 discos com 30 músicas. Desse repertório, o GRB apresenta duas gravações Victor: o samba-canção “Tenho saudade”, de Ary Barroso (disco 33480-A, gravado em 14 de julho de 1931 e lançado em novembro do mesmo ano, matriz 65195), e a toada “Ciúme de caboca” (no mais puro caipirês), de  Josué de Barros, descobridor de Cármen Miranda, e Domingos Mangarinos, gravação de 11 de junho de 1930, porém só lançada em agosto de 31 (disco 33444-A, matriz 50308).

Por falar na luso-brasileira Cármen Miranda (Maria do Carmo Miranda da Cunha, Marco de Canavezes, Portugal, 1909-Los Angeles, EUA, 1955, ela aqui comparece com outra composição de Ary Barroso, o samba “Nosso amô veio dum sonho”, gravação Victor de 10 de março de 1932 lançada a toque de caixa (disco 33537-A, matriz 65404). Na verdade, já tinha sido gravada como canção por Gastão Formenti, em 1930, como canção e o nome de “Teus óio”, tendo sido a primeira composição do mestre de Ubá, feita quando ele tinha seus quinze anos, com o título “De longe”. O estribilho e a melodia são iguais, mas a segunda parte é diferente.

Olga Praguer Coelho (Manaus, AM, 1909-Rio de Janeiro, 2008), pertencente à gloriosa dinastia das cantoras-folcloristas, e com vitoriosa carreira internacional, comparece aqui com três faixas gravadas na Victor: o ponto de macumba “Estrela do céu”, por ela própria adaptado (disco 34325-B, gravado em 30 de julho de 36 mas só lançado em junho de 38, matriz 80182), a modinha “Mulata”, também chamada de “Mucama” ou “Mestiça”, versos de Gonçalves Crespo e autor da melodia desconhecido (lado A desse mesmo disco, gravado em 22 de abril de 1936, matriz 80137) e a modinha “Róseas flores”, adaptação da própria Olga (disco 34042-A, gravado em 29 de novembro de 1935 e só lançado em abril de 36, matriz 80024).

Laís Marival, paulista de Taquaritinga (1911-?),  deixou uma discografia escassa: apenas 7 discos com 14 músicas, todos pela Columbia, futura Continental, entre 1936 e 1938. Dela, aqui está uma música de seu segundo disco, o de número 8210-B, matriz 3314, de 1936: é o samba “Cada um dá o que tem”, de autoria de Raul Torres, grande expoente da chamada música caipira ou sertaneja de raiz, mas que também era de samba.

Autêntica “garota de Ipanema” por sua origem (foi eleita miss desse bairro em 1929), a carioquíssima Laura Suárez (1909-c.1990), também atriz de teatro (no qual atuou por mais de meio século) e cinema, só gravou na Brunswick, selo americano que durou menos de dois anos no Brasil:13 discos com 26 músicas: em 1930/31, inclusive com músicas de autoria própria. E é dela mesma o samba que apresentamos aqui, “Você… você”, lançado em setembro de 1930 com o número 10103-A, matriz 500.

Outra cantora-folclorista de carreira internacional, a também carioca Elsie Houston, aqui se apresenta com o samba “Morena cor de canela”, motivo popular adaptado por Ary Kerner (autor também de “Na Serra da Mantiqueira” e “Trepa no coqueiro”, entre outras), em gravação lançada pela Columbia em junho de 1930 sob número 5217-A, matriz 380649. Um mês depois saiu pela Victor o registro de Helena Pinto de Carvalho, sendo o original do cantor Sílvio Salema, um ano antes. A morte prematura de Elsie Houston, aos 40 anos, ainda é um mistério: ela foi encontrada morta em seu apartamento em Nova York, EUA, no dia 20 de fevereiro de 1943, e ainda hoje existem dúvidas se foi suicídio ou assassinato.

A respeito da cantora Neide Martins, quase nada se sabe. Sua escassa discografia compreende seis discos com doze músicas, entre 1937 e 1939, nos selos Victor (dois), Odeon (três) e Columbia (o último). Aqui, um frevo-canção de seu disco de estreia, o Victor 34142-A, gravado em 10 de dezembro de 1936 e lançado em janeiro de 37, matriz 80293: “Que fim você levou?”, do mestre Nélson Ferreira.

Encerrando esta edição, apresentamos a carioca Zezé Fonseca (Maria José González). Nascida em 5 de agosto de 1915, começou sua carreira na “Hora da arte”, do Tijuca Tênis Clube. Em 1932, levada por Paulo Bevilacqua, foi contratada pela Rádio Philips, PRAX, onde apresentava o programa “Fox tarde demais”, depois atuando como produtora de programas femininos na Rádio Cruzeiro do Sul. Integrou a companhia teatral de Procópio Ferreira, atuando com sucesso na peça “Deus lhe pague”, de Joracy Camargo. Abandonou o rádio em 1935, nele reingressando em 1939, através da lendária Rádio Nacional, onde trabalhou por seis anos. Em 1945 foi para a Rádio El Mundo, de Buenos Aires (Argentina), transferindo-se um ano depois, ao voltar ao Rio, para a Globo, passando pela Mayrink Veiga e depois retornando à Nacional, sendo uma das pioneiras da radionovela no Brasil, e uma das melhores atrizes do gênero.. Ficou famosa, a partir de 1942, por manter um tórrido romance com Orlando Silva, cujos altos e baixos causaram sério desequilíbrio emocional no “cantor das multidões”, que se viciou em morfina e afastou-se do meio artístico por alguns anos. Deixou, como cantora, entre 1933 e 1940, sete discos com catorze musicas, os cinco primeiros pela Columbia e os dois últimos pela Victor. Aqui, de seu quarto disco, o Columbia 22224-B, matriz 381502, apresentamos a marchinha “Casar não é pra mim”, de Alberto Ribeiro, lançada para o carnaval de 1933. Zezé Fonseca morreu de forma trágica, em 16 de agosto de 1962, aos 47 anos, durante um incêndio em seu apartamento no Rio.

Enfim, mais uma edição do GRB que por certo ocupará lugar de destaque no acervo de nossos amigos cultos, ocultos e associados!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Vários Cantores – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 39 (2012)

E chegamos à trigésima-nona edição do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil. Esta semana, estaremos apresentando seis cantores de prestígio popular, cada um comparecendo com duas gravações.

O primeiro deles é José Alcides Gerardi, nascido na cidade gaúcha de Rio Grande em 15 de maio de 1918. Ainda muito jovem, Alcides mudou-se para Porto Alegre, onde começou seus estudos, e logo depois para o Rio de Janeiro, onde concluiu a escola primária e começou a trabalhar com o pai, que era comerciante, o que faria até 1935, quando iniciou sua carreira de cantor numa orquestra de dancing. Sua primeira gravação comercial deu-se em 1945, interpretando a valsa “Lourdes”, de Mário Rossi e George Brass, que o acompanhou ao acordeão. Entre seus maiores sucessos estão “Pergunte a ela”, “Abaixo de Deus”, “Antonico”, “Seu nome não é Maria”, “Marise”e muitos outros. Alcides Gerardi morreu de acidente automobilístico, ao voltar de um show, em 3 de janeiro de 1978, no Rio de Janeiro. Dele o GRB apresenta o disco Columbia CB-10370, lançado no ano de 1957. Abrindo-o, matriz CBO-1093, o bolero “Não”, de Renê Bruxelas e Belony de Carli, e no verso, matriz CBO-1092, um rasqueado de Paulo Borges que até hoje todos conhecem: o famoso “Cabecinha no ombro” (‘Encosta tua cabecinha no meu ombro e chora”…), um sucesso de fato estrondoso, e que tem merecido inúmera regravações. As duas faixas também foram incluídas no LP de dez polegadas “Encantamento”, refletindo uma época de transição de formatos, da cera para o vinil.

O seguinte é João Dias Rodrigues Filho, ou simplesmente João Dias. Paulista de Campinas, onde nasceu em 12 de outubro de 1927, começou sua carreira em 1948 na PRA-5, Rádio São Paulo (“a voz amiga”), levado por Cardoso Silva. Um ano depois já estava na Bandeirantes (então “a mais popular emissora paulista”) e, em uma apresentação na boate Cairo, foi descoberto por Francisco Alves, que o levou para o Rio de Janeiro (e o apontou como seu sucessor, porque a voz era praticamente igual). Lá, João gravou seu primeiro disco, na Odeon, lançado em fevereiro de 1951, interpretando “Guacira” (Hekel Tavares e Joracy Camargo) e “Canta, Maria” (Ary Barroso). Entre seus maiores hits estão “Sinos de Belém” (versão de “Jingle bells”), “Fim de ano” (o famoso “Adeus, ano velho”), “O velhinho” (“Botei meu sapatinho na janela do quintal”…), “Mamãe” (clássico dueto com Ângela Maria), “Milagre da volta”, “Poema das mãos”, “É o pau”, etc. Faleceu em 27 de novembro de 1996, no Rio de Janeiro, época em que dirigia a Socimpro (Sociedade Brasileira de Intérpretes e Produtores Fonográficos). João Dias é aqui lembrado com o disco Odeon 13679, gravado em 17 de maio de 1954 e lançado em julho do mesmo ano. Abrindo-o, matriz 10130, a valsa “É o amore” (“That’s amore”), de Harry Warren e Jack Brooks, em versão de Haroldo Barbosa, e no verso, matriz 10131, o samba-canção “Falso amigo”, de Herivelto Martins (compositor cujo centenário de nascimento é relembrado neste ano de 2012) e Benedito Lacerda.

Francisco Rodrigues Filho, aliás, Francisco Carlos, nasceu no Rio de Janeiro em 5 de abril de 1928, mas foi criado no Recife, capital pernambucana, para onde sua família se transferiu, lá morando até 1939. De volta ao Rio natal, apresentou-se ainda estudante no programa de Ademar Casé (avô da Regina), na Rádio Mayrink Veiga, e diplomou-se em pintura pela Escola Nacional de Belas Artes. Ao longo de sua vida dedicou-se à música e à pintura (inclusive foi pintor premiado no Brasil e fora dele) e, em 1946, assinou seu primeiro contrato profissional, com a Rádio Tamoio. Seu primeiro disco saiu pela Star, em 1949, interpretando os sambas-canções “Abandono”, de César Formenti Neto”, e “Distância”, de Fernando Lobo. Mas seu primeiro grande sucesso aconteceu quando ele se transferiu para a RCA Victor: a marchinha “Meu brotinho”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira”, estrondoso sucesso na folia momesca de 1950 e por ele também interpretada no filme “Carnaval no fogo”, da Atlântida. Nesse lendário estúdio, participou de inúmeras chanchadas como ator e cantor, e também foi contratado da não menos lendária Rádio Nacional, onde foi campeão absoluto de correspondência durante anos. Entre seus sucessos destacamos “Rio de Janeiro (Isto é o meu Brasil)”, de Ary Barroso, “Vestido de noiva” (Francisco Alves e David Nasser), “Você não sabe amar” (Dorival Caymmi, Carlos Guinle e Hugo Lima), “Minha prece” (Haroldo Eiras e Ciro Cunha), o frevo-canção “Nos cabelos de Rosinha” (Capiba) e muitos mais. Faleceu em 19 de março de 2003, em seu Rio de Janeiro natal, de câncer. De Francisco Carlos apresentamos o disco RCA Victor 80-1967, gravado em 6 de maio de 1958 e lançado em agosto do mesmo ano. Abrindo-o, matriz 13-J2PB-0403, o clássico choro-canção (originalmente polca) “Flor amorosa”, de Joaquim Antônio da Silva Callado, com letra escrita por Catulo da Paixão Cearense no mesmo ano do falecimento de Callado, em 1880, e cuja primeira gravação cantada deu-se em 1913, por Aristarco Dias Brandão. Francisco Carlos também o interpretou no filme “Esse milhão é meu”, da já mencionada Atlântida, e sua inclusão deu-se por sugestão de Paulo Tapajós, cantor, compositor e radialista. No verso, matriz 13-J2PB-0402, o bolero “Cuando tu me quieras”, de Raul Shaw Moreno e Mario Barrios, em versão de Geraldo Serafim. Das  duas, só “Flor amorosa” chegou ao LP, em álbum sem título.

Em seguida, vem um dos mais queridos cantores populares que o Brasil já teve: José Adauto Michiles, aliás Orlando Dias, nascido no Recife em 1.o de agosto de 1923 e falecido no Rio de Janeiro em 11 de agosto de 2001. Ele tinha como marca registrada interpretações cheias de estilo, exageradas, acenando lenços, fazendo gestos teatrais, ajoelhando-se no palco, declamando versos emocionados, agradecendo às fãs, usando roupas espalhafatosas… Enfim, o mais polêmico cantor de sua época, mas ainda assim verdadeiro ídolo popular, com sucessos sem conta, principalmente no gênero romântico, interpretando boleros e sambas-canções. No disco que incluímos aqui, o Odeon 14538, gravado em 2 de outubro de 1959 e lançado a toque de caixa, vem dois boleraços de sucesso por ele interpretados: “Vem pra junto de mim”, de William Duba e Nahum Luiz, matriz 13837, e “Tu hás de pensar de mim”, de Waldir Machado, matriz 13838. Esta última seria faixa-título de um LP lançado por Orlando em 1960, no qual também saiu “Vem pra junto de mim”. Outros hits do cantor foram “Perdoa-me pelo bem que te quero”, “Minha serás eternamente”, “Tenho ciúme de tudo” e muitos e muitos mais…

Em seguida relembramos Roberto Vidal, nome artístico de Pedro Sidnei Grigoletto. Membro de uma tradicional família do bairro paulistano do Ipiranga, foi finalista de um concurso promovido pela TV Record para descobrir novos talentos, logo passando a se apresentar com frequência no programa “Astros do disco”. Porém, sua carreira artística foi curta e a discografia escassa: apenas oito discos de 78 rpm com 16 músicas (o primeiro deles, em 1959,  apresentando o samba-canção “Botequim da vida” e o samba”Violão amigo”), e um LP, todos pela RCA, selos Victor e Camden, o do LP. Dele apresentamos seu segundo 78, o RCA Victor 80-2159, gravado em 28 de outubro de 1959 e lançado em janeiro de 60. E ele abre, na matriz 13-K2PB-0805, com um verdadeiro clássico do samba-canção: nada mais nada menos que “Negue”, de Adelino Moreira em parceria com o radialista Enzo de Almeida Passos, que marcou época no rádio paulistano com os programas “Telefone pedindo bis” e “A grande parada Brasil”. “Negue” foi inúmeras vezes regravado, inclusive por Maria Bethânia, que o incluiu em seu LP “Álibi”, de 1978,  renovando-lhe o êxito, e seu criador foi justamente Roberto Vidal. No verso, matriz 13-K2PB-0806, o samba “Triste coração”, do carioca de Botafogo Aldacir Louro (Aldacir Evangelista de Mendonça, 1926-1996) em parceria com a cantora Linda Rodrigues, depois regravado por Anísio Silva no LP  “Alguém me disse”. Das duas, só “Negue” saiu no único LP de Roberto, sem título, lançado em 1961 com o selo RCA Camden.

Por fim, apresentamos Cláudio de Barros, nascido na cidade mineira de Itanhandu em 24 de outubro de 1932. Antes da fama, trabalhou como comissário de bordo e redator de jornal. Gravou sue primeiro disco na Columbia, em 1954, interpretando o samba-canção “Espiritualmente” (Antônio Bruno) e a toada “Amor, ilusão” (dele próprio com Fenando Lacerda). Mas foi na Chantecler, para onde foi levado pelo cantor e compositor sertanejo Diogo Mulero, o Palmeira, que Cláudio de Barros despontou para o estrelato, e justamente com o disco que o GRB apresenta aqui, de número 78-0132, lançado em junho de 1959. O lado A, matriz C8P-263, é um tango dele mesmo, “Cinzas do passado”, ainda hoje bastante conhecido. No verso, matriz C8P-264, outra composição sua, agora em parceria com Mário Zan (o acordeom que o acompanha nas duas faixas é certamente dele), o rasqueado “Meu primeiro beijo”, que um mês depois teve outro registro na mesma gravadora, selo Sertanejo, pelas Irmãs Celeste. “Cinzas do passado” também foi faixa-título e de abertura do primeiro LP de Cláudio de Barros, no qual também saiu “Meu primeiro beijo”, é claro. Outros sucessos do cantor: “Teu desprezo”, “Bonequinha da noite”, “Taça da amargura”, etc. Com 20 álbuns gravados, Cláudio de Barros também compôs para outros artistas e se apresentou com sucesso na América Latina e em Portugal, onde cantou inúmeras vezes no famoso Cassino Estoril. Segundo Robertinho do Acordeom, foi o primeiro cantor a migrar do gênero romântico para o sertanejo, bem antes de Sérgio Reis.  Faleceu em 22 de agosto de 2009, em Mairiporã, na Grande São Paulo, após sofrer o quarto infarto.

Enfim, mais uma edição do GRB que é entregue aos amigos cultos, ocultos e associados do TM, relembrando intérpretes e músicas que, se depender da gente, dificilmente serão esquecidos!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Momentos Políticos – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 38 (2012)

Como é, eleitor amigo culto, oculto e associado do TM? Votou certo no último domingo, dia 2? Escolheu bem seus candidatos a prefeitos e vereadores? Bem, o fato é que inúmeras capitais (bem como outras cidades do Brasil e do interior paulista, onde resido) terão segundo turno para prefeitos no próximo dia 28. E tanto para aqueles que moram em cidades onde o prefeito já foi escolhido como para quem mora naquelas que ainda vão para o segundo turno (para estes, pode até servir de aquecimento), o Grand Record Brazil apresenta, em sua edição número 38, treze fonogramas relacionados à política.

Para começar, apresentamos uma gravação particular feita pelo conjunto Os Brasileiros, cuja formação é uma tremenda incógnita, para a campanha de Adhemar de Barros à presidência da República, em 1955, e prensada pela Continental com o número PR-176. São duas músicas do igualmente misterioso Bingo: a marchinha “Ninguém perde esperar” e o samba “Ai, Adhemar”. O grupo lembra bastante formações que marcaram época na MPB: Quatro Ases e um Coringa, Vocalistas Tropicais, Demônios da Garoa, Anjos do Inferno, Trigêmeos Vocalistas (seria um desses?). O fato é que Adhemar não chegou lá, e quem levou a melhor foi Juscelino Kubitschek de Oliveira, o homem dos “50 anos de progresso em 5 de governo”…

Depois pulamos para a campanha presidencial de 1960, que tinha como candidatos a vice-presidente Mílton Campos e João Goulart (que evidentemente levou a melhor). É o “Show do voto livre”, comandado pelo lendário radialista César de Alencar (“Esta canção nasceu pra quem quiser cantar…”), no qual inúmeros cartazes da MPB na época demonstram musicalmente sua opção pelo político gaúcho: Jorge Veiga, Dircinha Batista, Luiz Vieira, Altamiro Carrilho (recém-falecido, à frente de sua famosa bandinha), Elizeth Cardoso, Ivon Cúri, Isaurinha Garcia, o Conjunto Farroupilha, uma escola de samba… Curiosamente, João Goulart era candidato a vice na chapa do Marechal Henrique Lott, e Mílton Campos na de Jânio Quadros, o vencedor. Como não havia vinculação de votos, deu Jango como vice.

Na quinta faixa, apresentamos a marchinha “Comendo bola”, de Hekel Tavares e Luiz Peixoto, gravação de Jayme Redondo na Columbia, disco 5117-B, matriz 380431, lançada em dezembro de 1929 para o carnaval de 30. Era nitidamente contra Getúlio Vargas e a favor de Júlio Prestes de Albuquerque, ambos candidatos à presidência na República nessa época (e Prestes ganhou mas não levou). Nessa época, como se sabe, as coisas estavam fervendo no Brasil: o assassinato de João Pessoa por seu desafeto João Dantas, na Confeitaria  A Glória, do Recife, ainda que por razões pessoais, fez a oposição jogar o povo contra o governo, e a Aliança Liberal (Rio Grande do Sul, Paraíba e Minas Gerais) depôs o presidente Washington Luís em 24 de outubro de 1930, empossando, a 3 de novembro, Getúlio Vargas como chefe do governo provisório… e começando uma estadia de quinze anos no poder!

Famosos por suas sátiras de cunho político, que deram até em cadeia, Alvarenga e Ranchinho, “os reis do riso”, apresentam aqui uma delas: é a “Salada política”, ironizando exatamente Getúlio Vargas, utilizando trechos de várias músicas de sucesso, como a marchinha “A mulher do leiteiro”, a valsa “Será?” e “Oh!” Minas Gerais” (“outra mamata não perde jamais”). Eles também citam o brigadeiro Eduardo Gomes, derrotado na eleição presidencial de 1946 pelo marechal Dutra, por sinal apoiado por Getúlio. Gravação Odeon de 8 de outubro de 1946, lançada em janeiro de 47 com o número 12746-A, matriz 8110.

A faixa seguinte é uma exaltação a Getúlio Vargas: o samba “Salve 19 de abril!” (data em que nasceu o então chefe da nação), de Benedito Lacerda e Darcy de Oliveira, gravado por Dalva de Oliveira (em uma das raras oportunidades que teve de cantar como solista em disco, na época em que participava do Trio de Ouro) em 1.o de abril de 1943 (não é mentira!), e lançado pela Odeon em maio seguinte com o n.o 12306-B, matriz 7247.

A faixa seguinte é simplesmente um clássico entre os jingles políticos: o famoso “Varre, varre vassourinha”, da campanha de Jânio Quadros à presidência da República, em 1960. Muito se esperava dele, que levou a melhor sobre o Marechal Henrique Lott (apoiado pelo então presidente JK) e tomou posse em 31 de janeiro de 1961, mas o final da história creio que todos sabem…

Desde 1902, quando se iniciou a gravação fonográfica em nosso país, o “Hino Nacional Brasileiro”, melodia de Francisco Manuel da Silva e letra de Joaquim Osório Duque Estrada, tem recebido inúmeros registros, vocais e instrumentais. Foi composto em 1822, para comemorar a Independência do Brasil, recebendo nove anos depois letra por Ovídio Saraiva de Carvalho, que celebrava a abdicação de D. Pedro I. A letra definitiva, de Joaquim Osório, viria apenas em 1909, aletrada por ele em 1916 e finalmente oficializada em 1922. Pela legislação em vigor, o canto deve ser em uníssono (coro) ou instrumental, razão pela qual não cabe a interpretação-solo. E o registro do nosso querido Hino neste GRB é do tempo em que não havia esse impedimento legal, a cargo de Vicente Celestino, acompanhado pela Banda do Batalhão Naval, em 1918,  em 76 rpm da Odeon/Casa Edison, número 121342. Em 1985, Fafá de Belém cantou o “Hino Nacional” de forma livre.

Outra raridade que vem em seguida, em gravação particular, é o “Hino a Tancredo Neves”, feito por ocasião de sua candidatura ao governo de Minas Gerais, em 1960. Entretanto, quem levou a melhor foi Magalhães Pinto. Como se sabe, em 1985, Tancredo Neves seria o último presidente eleito indiretamente no Brasil por colégio eleitoral, mas não tomaria posse, tendo sido operado várias vezes e transferido de hospital, de Brasília para São Paulo.. O Brasil inteiro acompanhou apreensivo a evolução de seu estado de saúde, que foi piorando até que seu falecimento foi anunciado, em pleno dia de Tiradentes daquele ano, 21 de abril.

Em 1950, Getúlio Vargas retorna à presidência, agora por voto direto. E a faixa seguinte é justamente seu discurso de posse no cargo máximo da Nação, em 31 de janeiro de 1951. Depois, vem um de seus tradicionais discursos alusivos ao Dia do Trabalho, 1.o de maio, este de 1952, começando com “trabalhadores do Brasil” e tudo o mais…

E para finalizar, apresentamos mais uma raridade da heróica fase mecânica das 76 rotações por minuto. É a polca “No bico da chaleira”, de Costa Júnior, em gravação instrumental da Banda da Casa Edison, de 1907 (Odeon 108086, matriz XR-619). É uma referência à corte de bajuladores que cercava o então senador Pinheiro Machado, gaúcho de Cruz Alta, que era conhecida como “os pega-na-chaleira” (termo equivalente a “puxa-saco”, termo que seria popularizado anos mais tarde por outra marchinha). Pinheiro Machado seria assassinado no saguão do Hotel dos Estrangeiros, no bairro carioca do Flamengo, em 8 de setembro de 1915. Ele levou uma punhalada nas costas  do criminoso  Manso de Paiva (que sempre insistia ter agido por conta própria). As últimas palavras de Pinheiro Machado teriam sido: “Ah, canalha! Apunhalaram-me!”

Enfim, esta é mais uma edição histórica do GRB, constituindo autêntica crônica lítero-musical de nossa história política.

 

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Hebe Camargo – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 37 (2012)

No último sábado, 29 de setembro de 2012, fomos dolorosamente surpreendidos por mais uma perda em nosso meio artístico: a de Hebe Maria Camargo, de parada cardíaca enquanto dormia em sua casa no bairro do Morumbi, em São Paulo. Hebe vinha lutando contra um câncer no peritônio, uma membrana que cobre as paredes abdominais, diagnosticado em 2010. Chegou a curar-se, mas nos últimos tempos o câncer voltou a se manifestar, deixando-a debilitada. Chegou até a assinar um novo contrato com o SBT, onde trabalhou por 25 anos (havia deixado a Rede TV!, onde antes estava, por problemas de salário atrasado), mas o desfecho foi o esperado. E o resultado foi o que todos viram e/ou ouviram: uma comoção geral em todo o país. Afinal, Hebe era como a tia querida, como alguém da família, que transbordava alegria e descontração em seus programas, recebendo entrevistados de diversas atividades em seu sofá (sem esquecer, claro, do selinho), e, quando necessário, demonstrando sua indignação com a situação político-econômica do país. Das grandes emissoras de TV brasileiras, Hebe só não trabalhou na Globo, mas mesmo assim participou de programas da mesma como convidada e homenageada.
Porém, o que poucos sabem é que Hebe começou sua vida artística como cantora. Nascida na cida paulista de Taubaté, em 8 de março de 1929, teve origem pobre, e chegou a trabalhar como arrumadeira aos 12 anos de idade. Em 1943, com os pais e seus seis (!) irmãos, mudou-se para São Paulo. Lá, antes dos 15 anos, começou como cantora, interpretando músicas brejeiras, inclusive chorinhos, na PRG-2, Rádio Tupi, onde assinou seu primeiro contrato profissional. Em 1944. Inspirada nas americanas Andrews Sisters, formou com sua irmã Stela e as primas Helena e Maria o Quarteto Dó-Ré-Mi-Fá (o ré era a Hebe). Quando uma das primas casou, o grupo passou a se chamar As Três Américas. Por fim, com sua irmã, Hebe formou a dupla caipira Rosalina e Florisbela, alcançando sucesso no programa “Arraial da curva torta”, apresentado pelo Capitão Furtado na Rádio Difusora, coligada da Tupi. Mais tarde, por sugestão do diretor das Emissoras Associadas, Gilberto Martins, Hebe optou pela carreira-solo, ganhando o título de “moreninha do samba” (ela só tingiria os cabelos de loiro pela primeira vez em 1957). Gravou seu primeiro disco na Odeon, em 1950, interpretando os sambas “Oh! José” (Esmeraldino Sales e Ribeiro Filho) e “Quem foi que disse?” (Gabriel Aguiar e Valadares do Lago). Em 78 rpm, foram 32 discos com 64 fonogramas, nesse selo e também na RGE e na Polydor. Hebe também lançou seis compactos (quatro duplos e dois simples), e sete LPs, em sua primeira fase como cantora, o último deles em 1967, abandonando o disco em função de seu trabalho na TV. Mas, no final dos anos 1990, Hebe voltaria a gravar, lançando três CDs: “Pra você” (1998), “Como é grande o meu amor por vocês” (2001) e “Mulher” (2010), tendo também participado do CD/DVD “Elas cantam Roberto Carlos”.
Em sua trigésima-sétima edição, o Grand Record Brazil homenageia a querida e agora pranteada Hebe Camargo, apresentando treze gravações por ela realizadas, assim permitindo que se conheça mais a fundo seu trabalho como cantora, ainda hoje pouco conhecido e divulgado. Começamos nossa seleção com o samba “Você quer voltar”, para o carnaval de 1952, de Francisco Alves, Oswaldo Monello e José Roy, gravado na Odeon ainda em 51, no dia 10 de setembro, com lançamento um mês antes da folia, em janeiro, sob n.o 13223-A, matriz 9110. Na faixa seguinte, a marchinha “Sem tambor e sem corneta”, de Dênis Brean e Oswaldo Guilherme, para a folia de 1951, gravada em 18 de novembro de 1950 e lançada também um mês antes daquela folia, em janeiro, com o n.o 13091-A, matriz 8857. Em seguida saltamos para o carnaval de 1955, apresentando o samba “Madalena”, de Oswaldo França e Blecaute (o “general da banda”), gravado em 7 de outubro de 54 e lançado ainda em dezembro, com o n.o 13747-B, matriz 10328. Recuamos depois para a folia momesca de 1954, com outro samba, “Eu não sou Deus”, de José Roy e Fernando Lobo, gravação de 2 de dezembro de 53 lançada um mês antes do carnaval, janeiro é claro, com o n.o 13596-B, matriz 9990. Em seguida, a marchinha “Eu vou de touca”, de Dênis Brean em parceria com outro grande nome do rádio e da TV brasileiros, Blota Júnior, da folia de 1952, que corresponde ao lado B de “Você quer voltar”, matriz 9111. O samba “Cansada de sofrer”, de José Roy e Doca, é o lado A de “Madalena”, matriz 10327. Da Odeon passamos depois para a RGE, apresentando o rock “Serafim”, versão de Clímaco César para “Oh! Josephine”, de Heinz Gietz e Kurt Feltz, lançado em novembro de 1958 com o número 10130-A, matriz RGO-791, e também integrando o compacto duplo “Hebe canta e encanta”. Voltando à Odeon, a clássica marcha natalina “Boas festas (Papai Noel)”, de Assis Valente, originalmente lançada por Carlos Galhardo em 1933, e que Hebe canta aqui junto com Os 4 Amigos. O registro data de 3 de setembro de 1953, lançado em dezembro seguinte com o n.o 13548-A, matriz 9871. Em seguida o samba “Testemunha”, de J. Piedade e Alfredo Godinho, gravado em 28 de maio de 1952 e lançado em julho seguinte com o n.o 13289-B, matriz 9318. Temos depois uma releitura de Hebe para o clássico samba “Não me diga adeus”, de Paquito, Luiz Soberano e João Corrêa da Silva, originalmente lançado para o carnaval de 1948 na voz de Aracy de Almeida. A gravação de Hebe saiu originalmente pela Odeon em um LP coletivo de 10 polegadas, “Carnaval de sempre – Sambas e marchas”, em 1955. Em seguida, mais samba: “Tintim por tintim”, de Portinho e Wilson Falcão, gravação de 17 de julho de 1956 que a Odeon só lançou em abril de 57 com o n.o 14192-B, matriz 11253, incluída também no LP de dez polegadas “Festa de ritmos”. Outra faixa que só saiu em LP, a exemplo de “Não me diga adeus”, é a do samba “Mundo mau”, de Sidney Morais e Júlio Rosemberg, que encerra o álbum “Sou eu”, de 1960. E o encerramento, aqui, fica por conta da polca-dobrado “São Paulo quatrocentão”, de Garoto e Chiquinho, com letra de Avaré (não creditado no selo), que Hebe registrou cantada em 26 de novembro de 1953, com lançamento em janeiro de 54, disco 13594-B, matriz 9986. Enfim, uma seleção em que predominam a alegria e a descontração que Hebe, em todos esses anos de carreira no rádio, no disco e sobretudo na televisão, deu ao público brasileiro, como ninguém!

Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Francisco Alves E Pixinguinha – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 36 (2012)

Neste mês de setembro, mais exatamente no dia 27, estamos comemorando os 60 anos da trágica morte do cantor Francisco Alves, em acidente automobilístico na Rodovia Presidente Dutra, na cidade paulista de Pindamonhangaba, divisa com Taubaté, no Vale do Paraíba, quando um caminhão que estava na contramão colidiu com seu automóvel, um Buick azul. O cantor tinha 54 anos, e a tragédia enlutou todo o país. Seu corpo, carbonizado, foi enterrado no Cemitério São João Batista, em seu Rio de Janeiro natal, para o qual estava regressando quando houve o acidente fatal, no dia seguinte à sua última apresentação pública, acontecida em São Paulo, no Largo da Concórdia, no Brás. A tumba de Chico, até hoje, atrai inúmeros visitantes e fãs do cantor, mesmo depois de tanto tempo passado de sua morte.
O Grand Record Brazil, evidentemente, não poderia deixar a data passar em branco. Em sua edição de número 35, presta uma homenagem à memória do eterno Francisco Alves, apresentando doze fonogramas por ele registrados na Victor (ou RCA Victor, como queiram), gravadora da qual foi contratado entre 1934 e 1937, lá deixando 49 discos com 96 músicas. Em todos eles, os arranjos e regências são do mestre Pixinguinha, em mais uma contribuição fabulosa que deixou para nossa música popular. Em quase todas as faixas, Pixinguinha acompanha Francisco Alves com sua orquestra Diabos do Céu, considerada uma autêntica “jazz band” de sua época. Vamos às faixas, pela ordem:
Para começar, apresentamos um samba da parceria Bide-Marçal: “Durmo sonhando”, que Chico gravou em 20 de abril de 1934 com lançamento em agosto seguinte sob n.o 33812-A, matriz 79610. Damos depois um salto para o carnaval de 1935, apresentando uma marchinha de Lamartine Babo e Hervê Cordovil: “Moreninha sweepstake”, gravação de 21 de dezembro de 1934 lançada um mês antes da folia, janeiro, sob n.o 33894-A, matriz 79803. A marchinha cita o slogan de propaganda do achocolatado em pó Toddy: “Não tem nem pode ter similares”. O sweepstake do título era um prêmio especial, uma espécie de loteria do turfe, cujo resultado era vinculado a cavalos vencedores, instituído pelo Jockey Clube Brasileiro em 1933, nos moldes europeus. Naquele ano, o bilhete vencedor foi o do cavalo Mossoró, que abiscoitou 500 contos de réis. A terceira faixa é o samba “Reclamando a sorte”, de Nilo Almeida Fonseca, o lado B de “Durmo sonhando”, matriz 79611. Mais um samba vem em seguida: “Você chorou”, subintitulado “Me admiro é você”, de autoria de Sylvio Fernandes, o Brancura, gravado por Chico em 8 de julho de 1935 e lançado em agosto seguinte com o n.o 33959-A, matriz 79968, sendo incluído na burleta “Da Favela ao Catete”, de Freire Júnior, encenada no Teatro Recreio carioca, incluindo músicas de vários autores e da qual Francisco Alves também participou. Malandro histórico, temido por sua valentia, Brancura morreu ainda em 1935, com apenas 27 anos de idade. Temos em seguida a marchinha “Olha pra lua”, de autoria de Nássara e Cristóvão de Alencar, o “amigo velho” (aqui assinando com seu nome verdadeiro, Armando Reis), gravação de 13 de abril de 1934, lançada em julho seguinte com o n.o 33801-A, matriz 79602. Depois tem o samba “Me queimei”, também de Nássara, agora em parceria com Walfrido Silva, gravação de 28 de janeiro de 1936 lançada para o carnaval desse ano, em fevereiro, disco 34038-A, matriz 80100. E tem mais samba: “Linda mulher”, de Erlúcio Godoy, Orlando Machado e Orestes Barbosa (este último sem crédito no selo), que Francisco Alves gravou em 17 de abril de 1934, mas a Victor só lançou em dezembro desse ano, com o n.o 33857-B, matriz 79608. Em seguida, a marcha “aux flambeaux” “A melhor das três”, de Lamartine Babo e Alcyr Pires Vermelho, do carnaval de 1935, correspondente ao lado B de “Moreninha sweepstake”, matriz 79804. A letra faz referência ao processo movido pelos irmãos Raul e João Vítor Valença contra a omissão do nome deles, como parceiros de Lamartine, no disco original da marchinha “Teu cabelo não nega”. Lalá participa deste registro como cantor, não creditado no selo original. Do carnaval seguinte, 1936, é outra marchinha, “Marido da Eva”, de Nássara e Sylvio da Fonseca, gravada por Chico Alves em 7 de janeiro desse ano e lançada bem em cima da folia, em fevereiro, com o n.o 34033-A, matriz 80077. Foi uma das dez músicas que o Rei da Voz lançou para aquele carnaval, todas bem cantadas. Da folia de 1937 é a marchinha “Parei com elas”, do prolífico Nássara agora junto com Alberto Ribeiro, gravação de 18 de novembro de 1936, lançada ainda em dezembro sob n.o 34131-A, matriz 80260. Depois, desse mesmo carnaval, a lírica marchinha, do mestre Ary Barroso, “Uma furtiva lágrima”, que aproveita algo da ária de mesmo nome, da ópera “L’elisir d’amore”, de Caetano Donizetti, publicada em 1832. Chico gravou a marchinha em 17 de novembro de 1936, com lançamento ainda em dezembro com o n.o 34113-A, matriz 80244. E, para encerrar com chave de ouro, um clássico do samba: “É bom parar”, de Rubens Soares e Noel Rosa, sendo que este último aceitou ficar de fora dos créditos na edição e no disco. É a única das faixas desta seleção em que Francisco Alves é acompanhado não pelos Diabos do Céu, mas pelo Conjunto Regional RCA Victor. Sucesso estrondoso do carnaval de 1936, corresponde ao lado B de “Me queimei”, matriz 80101, e cita dois versos da valsa-canção “A mulher que ficou na taça”, de Chico Alves e Orestes Barbosa (“Mais cresce a mulher no sonho/ na taça e no coração”). “É bom parar” seria, inclusive, regravado por Francisco Alves na RCA Victor apenas três dias antes de seu trágico falecimento, em 1952, juntamente com ‘A mulher que ficou na taça”, mais “Serra da Boa Esperança” e “Foi ela”, devidamente autorizado pela Odeon, onde então trabalhava. Enfim, estas doze faixas com o eterno Francisco Alves acompanhado por Pixinguinha são o preito de saudade do GRB à memória do Rei da Voz, que, passados 60 anos de seu trágico passamento, ainda é uma importante referência na história de nossa música popular.
Texto de SAMUEL MACHADO FILHO.

Instrumental – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 35 (2012)

Chegamos à trigésima-quinta edição do meu, do seu, do nosso Grand Record Brazil. Nesta semana, apresentamos mais uma seleção do melhor do “easy listening” tupiniquim, ou seja, a nossa música instrumental.

Para começar, apresentamos raridades executadas por um violonista que deixou sua marca na história de nossa música popular: Américo Jacomino, o Canhoto (São Paulo, 1889-idem, 1928). Filho de imigrantes napolitanos, ele foi um dos responsáveis pelo “enobrecimento” do violão, antes considerado um instrumento de menor importância, dizia-se até que só marginais faziam uso do mesmo. Tocava com a mão esquerda, daí o apelido de Canhoto. Sua peça mais conhecida, a valsa “Abismo de rosas”, foi por ele gravada pela primeira vez em 1916, com o nome “Acordes do violão”, recebendo o nome que a consagrou em 1925, numa execução bem mais lenta e elaborada. Canhoto morreu prematuramente, aos 39 anos de idade, por problemas cardíacos. Aqui, duas autênticas preciosidades da fase mecânica de gravação, ambas valsas, gravadas entre os dias 16 e 26 de junho de 1913 pela lendária Casa Edison, selo Odeon, e de autor desconhecido: “Adeus, Helena”, com o grupo do violonista, número 120600, e “Lágrimas de amor”, com Canhoto integrando o Grupo dos Chorosos, disco 120624, matriz SP.36. Esses dois registros fizeram parte da primeira série de gravações paulistas da Casa Edison, que teve um total de 82 matrizes!

Instrumentista, cantor, compositor e maestro, o carioca João Thomaz de Oliveira, aliás J. Thomaz (c.1900-ant.1964) costumava reger suas orquestras de luvas brancas, isso porque, quando ele era baterista, queimou as mãos ao soltar um foguete numa festa de São João. E nada sabia de música! Dele apresentamos o disco Victor 33460, gravado em 28 de julho de 1931 e lançado em setembro do mesmo ano, com dois maxixes. Abrindo-o, a matriz 65203 apresenta  “Levanta, meu nêgo”, de autoria do mestre Pixinguinha. No verso, matriz 65202, uma composição do próprio J. Thomaz em parceria com Sátiro de Melo, “Vê se pode”.

A carioca Carolina Cardoso de Menezes (1916-1999) fazia parte de um clã de ilustres pianeiros, sendo filha de Oswaldo Cardoso de Menezes e da dona Sinhá, que também tocavam, é claro. Carolina começou a estudar piano aos 13 anos, e chegou a ter aulas até mesmo com Chiquinha Gonzaga. Mesmo com idade avançada e problemas de saúde, apresentou-se em recitais até falecer, em 31 de dezembro de 1999. Aqui, Carolina, acompanhada de grupo rítmico, nos brinda com sua arte tão pianística e brasileira com as faixas do disco Odeon 13611, gravado em 20 de outubro de 1953 e lançado em março de 54. No lado A, matriz 9938, o choro “Uma farra em Campo Grande”, de autoria de outro pianista de renome, Romualdo Peixoto, o Nonô, tio dos cantores Cauby Peixoto e Ciro Monteiro, e por ele próprio lançado em 1932. No verso, matriz 9939, um baião de autoria dela própria, “Vem cá, meu amor”.

O paraguaio Luiz Bordón (1926-2006) recebeu incentivo de seus pais desde a infância para dedicar-se à música. Com sua harpa, fez apresentações no Paraguai e no Brasil (onde residiu por vários anos), e seu álbum mais famoso é “A harpa e a cristandade”, com músicas de Natal, editado em 1960 e que mereceu um segundo volume cinco anos depois. Residiu por três anos nos EUA e voltou ao Paraguai, onde morreu aos 80 anos. Aqui, apresentamos o disco Chantecler 78-0238, lançado em março de 1960, que abre com o clássico “Baião de dois” (o arroz com feijão no Ceará), de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, matriz C8P-475, originalmente lançado por Emilinha Borba em 1950. No lado B, matriz C8P-476: uma versão, em ritmo de tango, da marchinha “Me dá um dinheiro aí”, dos irmãos, Homero, Ivan e Glauco Ferreira, hit do carnaval daquele ano na voz de Moacyr Franco, e inspirada no mendigo por ele interpretado na “Praça da Alegria”, na TV. Ambas as gravações também chegaram ao LP, afinal era uma época de transição de formatos: “Baião de dois” saiu em “Harpa paraguaia em hi-fi – volume 3”, e “Me dá um dinheiro aí” em “Recordando carnavais”.

Um dos maiores ‘bandleaders’ brasileiros, o paulistano Sylvio Mazzuca (1919-2003) também foi pianista e exímio executante de vibrafone. Sua orquestra, nos anos 1950/60, era a mais solicitada para animar bailes e festas em São Paulo, além de também se exibir em bailes de formatura no Rio de Janeiro. Continuou atuando até meados dos anos 1990, viajando pelo país a bordo de um ônibus especialmente adaptado. De Mazzuca e sua prestigiadíssima orquestra apresentamos o disco Copacabana 5145, lançado em agosto-setembro de 1953. De um lado, o fox-slow “Limelight”, matriz M-554, composição de Charles Chaplin incluída em seu filme de mesmo nome, o famoso “Luzes da ribalta” no Brasil (só foi lançado nos EUA em 1972, pois Chaplin estava incluído na lista negra do macartismo). No verso, matriz M-555, um choro do próprio Mazzuca, “Travesso”.

Para terminar, apresentamos dois clássicos do mestre Zequinha de Abreu (Santa Rita do Passa Quatro, SP, 1880-São Paulo, 1935), executados pela Orquestra Colbaz, com piano e regência do maestro Gaó (Odmar Amaral Gurgel, 1909-1994), paulista de Salto. Os demais integrantes eram Jonas Aragão (clarineta), Zé Carioca (violino), Petit (violão), José Rielli (acordeão) e Atílio Grany (flauta).  Colbaz era o endereço telegráfico da gravadora Columbia do Brasil, que lançou esse disco em junho-julho de 1931 com o número 22029. Abrindo-o, matriz 381027, a bela valsa “Branca”, que Zequinha compôs em homenagem à filha do chefe da estação ferroviária de Santa Rita, então com 13 anos de idade, e a quem muito admirava, “a gentil senhorita Branca Barreto”, nome dado inclusive a pedido do chefe da estação, muito amigo do compositor. O verso, matriz 381028, é o famoso “choro sapeca” “Tico-tico no fubá”, mundialmente conhecido e gravado inúmeras vezes. Foi composto em 1917 como “Tico-tico no farelo”, e lançado por Zequinha durante um baile animado por sua orquestra. Mas já havia outra música com esse nome, daí o farelo ter sido trocado pelo fubá. Esse disco permaneceria em catálogo por vários anos, e teve outras edições: pela mesma Columbia, com o número 55038, e pela Continental, com o número 15004. E encerra a edição desta semana do GRB, que certamente proporcionará momentos muito agradáveis de recordação e enlevo. Aproveite!

TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO.

Tonico E Tinoco 2 – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 34 (2012)

Ê trem bão… Eis a segunda parte da retrospectiva que o meu, o seu, o nosso Grand Record Brazil dedica aos eternos e inesquecíveis Tonico e Tinoco. Dupla que tem em seu respeitável currículo, inclusive, atuações no cinema. Estrearam na sétima arte em 1949, participando de “Luar do sertão”, primeiro filme brasileiro do italiano Mário Civelli (1923-1993), que teve um remake em 1971, sob a direção de Oswaldo de Oliveira, e do qual a dupla também participou. Também atuaram em “Lá no meu sertão” (1963), “Obrigado a matar” (1965), “Os três justiceiros” (1972), “A marca da ferradura” (do mesmo ano), “O menino jornaleiro” (1982) e “A marvada carne” (1983). Enfim, caipiras versatilíssimos.

Prosseguindo esta retrospectiva da eterna “dupla coração do Brasil”, apresentamos onze preciosos fonogramas, todos originalmente da Continental. Em ordem cronológica de lançamento são estes: para começar, a primeiríssima gravação da dupla: o cateretê “Em vez de me agradecer”, de autoria do Capitão Furtado (Ariowaldo Pires, sobrinho de Cornélio Pires, pioneiro na divulgação da música caipira em disco), em parceria com Jayme Martins e o violonista Aymoré. Feita em 26 de novembro de 1944, matriz 10324, era só um teste, uma “prova”, como se dizia na época. Quando eles foram gravar o verso do 78, cantaram tão alto (como faziam lá na roça)… que o microfone estourou! E a Continental os puniu com seis meses de aulas de canto para educar a voz e voltar a gravar… Para sorte deles, uma música que deveria entrar no último disco lançado pela dupla Palmeira e Piraci, que teria no lado B “Salada internacional”, foi proibida pela censura do Estado Novo, e o jeito foi usar justamente “Em vez de me agradecer” como lado A desse disco, o Continental 15385. Agradaram em cheio!

Depois apresentamos o lado B do primeiro disco completo da dupla, de n.o 15417,  gravado em 4 de agosto de 1945 e lançado em setembro seguinte, matriz 10453: a moda de viola “Porto Esperança”, mesmo nome de um distrito da cidade de Corumbá, Mato Grosso do Sul, onde se passa a narrativa.

O 78 seguinte é o de número 15447-B, gravado em 8 de agosto de 1945 e lançado em outubro do mesmo ano, matriz 10470: outra moda de viola das boas, “Moreninha”, de Tonico sem parceiro.

Temos depois as duas faixas do disco 15655, gravado em 10 de abril de 1946 e lançado em junho seguinte. O lado A, matriz 10581, é outro modaço de viola, “Destino de caboclo”, de Tonico e Aldo Renatti, No verso, a matriz 10580 nos traz o recortado mineiro “Ai, meu bem”, de Piraci e Geraldo Costa.

Completamos depois o disco 15706, gravado em primeiro de junho de 1946 e lançado em setembro seguinte, apresentando o lado B, correspondente à matriz 10605, o rasqueado “Adeus, morena, adeus”, de Piraci e Luiz Alex, este último não creditado no selo original como co-autor.

Nossa próxima faixa é o lado A do disco 15795, gravado em pleno feriado de Tiradentes, 21 de abril de 1947, e lançado em julho seguinte, matriz 10707, a moda de viola ”A cruz do caminho”, de Anacleto Rosas Júnior (autor de inúmeros hits do sertanejo de raiz, como “Baldrana macia”, “Os três boiadeiros” e “Burro picaço”) e Arlindo Pinto, outro compositor bastante considerado no gênero, tendo em seu currículo parcerias com Mário Zan (“Chalana”, “Balanceio”) e Palmeira (“Baile na tuia”). Confira em nossa edição anterior o lado B, que é o clássico “Tristeza do jeca”.

Passamos em seguida às duas músicas do Continental 15796, gravado também em 21 de abril de 1947, e lançado no mesmíssimo suplemento de julho daquele ano. No lado A, matriz 10705, Arlindo Pinto entra novamente em cena, desta vez assinando em parceria com Geraldo Costa a moda de viola “Boiadeiro entrevado”. No verso, matriz 10704, Geraldo Costa assina com o acordeonista Mário Zan (o consagrado autor de “Nova flor”, “Quarto centenário”, “Chalana”, “Festa na roça” etc.)o recortado mineiro “Que lucro dá?”, inclusive com o próprio Mário puxando o fole no acompanhamento.

Por fim, o disco que encerra esta nossa segunda parte é o de número 15819, gravado em 30 de junho de 1947 e lançado entre agosto e outubro do mesmo ano. No lado A, matriz 10727, o cateretê “Você sabe onde eu moro”, de Piraci e Geraldo Costa, de novo com a sanfona do mestre Mário Zan no acompanhamento, mais o violão do co-autor, Piraci. No verso, matriz 10726, a moda de viola “Destinos iguais”, de autoria do mesmo Capitão Furtado que os descobriu, em parceria com o professor Ochelcis Laureano, paulista de Sorocaba e autor do clássico “Marvada pinga”, um dos eternos carros-chefes de Inezita Barroso. Curiosa, aliás, é a composição de seu nome: “O” (artigo masculino), “chel” (segunda sílaba do nome da mãe, Rachel) e “cis” (sílaba do meio do nome do pai, Francisco), ficando “Ochelcis”. Com esta interessante curiosidade, encerramos esta resenha do segundo volume que o GRB dedica a Tonico e Tinoco, a eterna e insubstituível “dupla coração do Brasil”!

* TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO

Tonico & Tinoco – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 33 (2012)

E o Grand Record Brazil chega à “idade de Cristo” (rsrsrsrsrsrs…)… É porque já estamos na edição de número 33, apresentando a primeira parte de uma retrospectiva dos melhores momentos da eterna “dupla coração do Brasil”, Tonico e Tinoco.

Obviamente, os dois eram irmãos, filhos de imigrantes espanhóis. Tonico (João Salvador Perez) era de São Manoel, interior paulista, onde nasceu em 2 de março de 1917. Tinoco (José Perez), por sua vez, era um pouquinho mais novo, nascido em 19 de novembro de 1920 em uma fazenda em Botucatu, perto de São Manoel, que hoje pertence ao município de Pratânia. E foi ouvindo as músicas de Cornélio Pires que foram influenciados na arte de cantar. Ainda adolescentes, compraram suas violas e passaram a cantar em dupla em serenatas nas fazendas da região, sendo que a primeira música que aprenderam foi o clássico “Tristeza do Jeca”, de Angelino de Oliveira, que mais tarde gravariam (e está nesta seleção). Em fins de 1937, a família Perez, ao lado de outras, decidiu tentar a sorte em Sorocaba, Tonico foi ser servente na Pedreira Santa Helena e Tinoco virou engraxate na estação de trem da Sorocabana. Mas, a coisa não deu certo, e a família voltou ao campo, na Fazenda João Cintra, em São Manoel. Isso, porém, deu aos irmãos Perez a chance de se apresentar em rádio, mais precisamente a Rádio Clube de São Manoel, levados pelo administrador da fazenda, José Augusto Barros. Durante a semana eles trabalhavam na roça e aos domingos cantavam na rádio, sem nada ganhar, apenas por amor à arte.

Em 1943, já em São Paulo, os irmãos participaram de programas de calouros do rádio, sem êxito. Nessa ocasião, o Capitão Furtado (Ariowaldo Pires, sobrinho de Cornélio Pires), promoveu um concurso em seu programa “Arraial da Curva Torta”, na Difusora, para preencher uma vaga (o programa estava sem violeiros). É aí que os irmãos Perez, mais um primo, se candidatam como Trio da Roça. Classificam-se para a final, obtendo o primeiro lugar e, sem o primo, são batizados pelo Capitão Furtado com os nomes que os imortalizaram: Tonico e Tinoco.

A primeira gravação da dupla saiu pela Continental, em julho de 1945: o cateretê “Em vez de me agradecer”, do Capitão Furtado, Jaime Martins e Aimoré, lado B de “Salada internacional”, com Palmeira e Piraci (só saiu porque a outra música dessa dupla foi censurada!). Em setembro de 1945 é que sai o primeiro 78 completo de Tonico e Tinoco, gravado em 8 de agosto desse ano, apresentando as modas de viola “Tudo tem no sertão”, de Tonico (lado A, que aliás está aqui, matriz 10454-2), e “Porto Esperança”, de Tonico e Miguel Patetti.

Depois disso, todos sabem o que aconteceu: êxitos sobre êxitos em disco (cerca de mil gravações em 60 anos de estrada!), apresentações em todos os cantos do Brasil (até mesmo no Teatro Municipal de São Paulo, e chegaram até a cantar numa feira de moda junto com nossa rainha-mãe do rock, Rita Lee!), sempre mantendo a fidelidade ao velho e bom gênero caipira, sendo por isso considerada, com justiça, a mais importante dupla caipira brasileira, e a de maior referência no gênero. Ganharam, claro, inúmeros prêmios: Roquette Pinto, Prêmio Sharp de Música, Medalha Anchieta, Troféu Imprensa… Tiveram companhia circense, escrevendo e atuando em 25 peças, e atuaram no rádio paulistano durante mais de 50 anos, na Nacional (atual Globo), na Record e sobretudo na Bandeirantes (então “a mais popular emissora paulista”), onde apresentaram o programa “Na beira da tuia”. Também tiveram esse programa na televisão, nas redes Bandeirantes e SBT. Gravaram, além da Continental, na Chantecler, na RCA Victor, na Copacabana, na Philips e em sua sucessora, a Polygram, onde registraram seu último trabalho em disco.

O último show da dupla aconteceu na cidade matogrossense de Juína, em 1994. Seis dias mais tarde, a 13 de agosto, Tonico falece após uma queda na escada do prédio em que morava, no bairro paulistano da Moóca. Tinoco, porém, após dizer que deixaria de cantar, prosseguiu sozinho, apoiado pelos seus inúmeros fãs e homenageado até mesmo por Roberto Carlos, em 2010, no especial de TV “Emoções sertanejas”. E continuaria na ativa até falecer, em 4 de maio deste 2012, em São Paulo, de insuficiência cardiorrespiratória, aos 91 anos, tornando-se assim o artista sertanejo que mais atuou na história de nossa música.

O GRB começa a trazer um pouco da história musical dos inesquecíveis irmãos Tonico e Tinoco. As gravações que apresentamos são todas de sua primeira fase, na Continental, feitas entre 1945 e 1948. Em ordem de lançamento, são: a já citada “Tudo tem no sertão”; “Sertão do Laranjinha”, motivo popular adaptado pela dupla mais o Capitão Furtado, matriz 10453, tendo no verso do disco 15418, gravado em 22 de julho de 1945 e lançado em setembro seguinte, o cateretê “Percorrendo o meu Brasil”, de João Martins, matriz 10451. Temos depois a moda de viola “Cuiabana” de Tonico e Bonfim Pereira, gravada em 16 de agosto de 1945, com lançamento em outubro (15447-A, matriz 10469). Em seguida o disco 15681, gravado em 10 de abril de 1946 e lançado em agosto do mesmo ano, apresentando a valsa “Cortando estradão”, de Anacleto Rosas Jr., matriz 10578, e no lado B, matriz 10579, uma toada que todo mundo sabe de cor, embora pungente: “Chico Mineiro”, de Tonico e Francisco Ribeiro. Aliás, quando Tonico e Tinoco foram gravar a música, os dirigentes da Continental lhes informaram que esse seria o último disco deles na empresa, pois já haviam gravado outros cinco com nove músicas e os ouvintes reclamavam não entender a pronúncia caipira da dupla. É claro que isso não aconteceu, e, com o dinheiro resultante do sucesso de “Chico Mineiro”, eles conseguiram comprar sua primeira casa para viver com a família. Do Continental 15706, gravado em primeiro de junho de 1946 e lançado em setembro seguinte, vem o lado A, matriz 10606, apresentando a moda de viola “Peão vaqueiro”, de Tonico sozinho. E não há quem nunca tenha ouvido “Tristeza do jeca”, toada clássica de Angelino de Oliveira, originalmente lançada em 1926 por Patrício Teixeira. Esta é a primeira das muitas gravações que Tonico e Tinoco fizeram desta página antológica, em pleno feriado de Tiradentes (21 de abril) de 1947, matriz 10706, com lançamento pela Continental em julho sob n.o 15795-B. Na sequência vem a toada “Vingança do Chico Mineiro”, de Tonico e Sebastião de Oliveira, sequência natural do sucesso de “Chico Mineiro”. Saiu no lado A do Continental 15913, em gravação de 3 de maio de 1948, lançada no suplemento para o trimestre de julho a setembro desse ano, matriz 10867, tendo no verso, matriz 10866, a moda de viola “Goiana”, de Tonico e Teddy Vieira (autor do clássico “O menino da porteira”, entre outras), também aqui apresentada. E é assim que o GRB começa a reviver a gloriosa trajetória de Tonico e Tinoco nas 78 rotações por minuto. E olha: semana que vem tem mais. Combinado?

TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO.

Cristina Maristany – Aracy Côrtes – Olga Praguer Coelho – Laura Suarez – Elisinha Coelho – Elsie Houston – Neide Martins – Helena Pinto De Carvalho – Seleção 78 RPM Do Toque Musical – Vol. 32 (2012)

 

Estamos de volta com o meu, o seu, o nosso Grand Record Brazil, em sua edição de número 32, apresentando mais uma seleção interpretada exclusivamente por cantoras. Nunca esquecendo de mencionar as pessoas da radialista Biancamaria Binazzi e do jornalista Ronaldo Evangelista, idealizadores do blog Goma Laca (www.goma-laca.com), de onde foi extraída a seleção musical completa de nossa edição número 29, e a quem eu e o Augusto agradecemos o toque e a lembrança, inclusive aproveitando fonogramas raros desse mesmo blog sempre que possível, unidos que estamos por um só ideal, que é a preservação de nossa memória musical.

Esta semana, começamos nossa seleção musical com a soprano Cristina Maristany (Porto, Portugal, 1906-Rio Claro, SP, 1966), na pia batismal Cristina Navarro de Andrade Costa, que veio parta o Brasil com poucos meses de idade. Ela gravou seus primeiros discos com o nome de Cristina Costa, e mudou o sobrenome artístico quando casou-se com o jornalista Breno Maristany. Não tiveram filhos, e mesmo depois de se desquitar, Cristina conservou o sobrenome Maristany na vida artística. Cristina aqui comparece com o disco Odeon X-3273, da série azul internacional da “marca do templo”, gravado em outubro de 1941. No lado A, matriz 6824, a clássica modinha “Quem sabe?” (“Tão longe, de mim, distante”…), de autoria do paulista (de Campinas)Antônio Carlos Gomes (1836-1896), aquele mesmo do “Guarani”, com versos do sergipano Bittencourt Sampaio (1834-1895), poeta e futuro governador do Espírito Santo. Foi inspirada em Ambrosina, o primeiro amor de Carlos Gomes, que morava na sua Campinas natal, e composta em 1859, mesmo ano em que o parceiro Bittencourt Sampaio se formou em Direito. Muito gravada, até mesmo por Agnaldo Timóteo. No verso, matriz 6825, a toada “Quando uma flor desabrocha”, de autoria de Francisco Mignone, que por sinal acompanha Cristina com seu quarteto de cordas nesse disco, música também muito conhecida.

Em seguida, tiramos do esquecimento Olga Praguer Coelho (Manaus, AM, 1909-Rio de Janeiro, 2008), cantora e pesquisadora de música folclórica aplaudida no Brasil e no mundo, inclusive nos Estados Unidos, onde residiu por vários anos, e lá moram dois filhos seus atualmente. Olga comparece inicialmente com uma gravação feita em Nova York nos anos 1940: a canção “Azulão”, de Jayme Ovalle e Manuel Bandeira, cuja primeira gravação entre nós é de 1944, na voz de Alice Ribeiro. Depois, tem o ponto de macumba “Estrela do céu”, motivo popular por ela adaptado, em gravação Victor de 30 de julho de 1936, porém só lançada em junho de 1938, disco 34325-B, matriz 80182. No lado A desse disco, matriz 80137, gravação de 22 de abril de 1936, a conhecida modinha “Mulata”, também chamada de “Mucama” ou “Mestiça”, com versos de Gonçalves Crespo e melodia de autor até hoje ignorado, peça também merecedora de inúmeras gravações desde 1902. Olga encerra sua participação neste volume com “Róseas flores”, outro motivo popular por ela adaptado, em gravação Victor de 29 de novembro de 1935, só lançada em abril de 36, disco 34042-A, matriz 80024.

Gaúcha de Uruguaiana, Elisa de Carvalho Coelho(1909-2001)criou-se porém na capital catarinense, Florianópolis. Foi casada com o deputado Lopo Coelho e mãe do jornalista e apresentador de TV Goulart de Andrade, o do bordão “Vem comigo”. Sua discografia, nos selos Victor, Odeon e Parlophon, abrange 15 discos 78 com 30 músicas, entre 1930 e 1932, incluindo hits como “No rancho fundo” e “Caco velho”, ambas de Ary Barroso e a primeira com letra de Lamartine Babo. Dessa discografia, o GRB apresenta a toada “Ciúme de caboca” (assim mesmo, em caipirês), de Josué de Barros, descobridor de Cármen Miranda, e Domingos Magarinos, em registro Victor de 11 de junho de 1930, só lançado, porém mais de um ano depois, em agosto de 1931, com o número 33444-B, matriz 50308 (o lado A é “No rancho fundo”, que fica pra uma próxima).

A paulistana Helena Pinto de Carvalho (1909-1937) foi funcionária pública, trabalhando na Secretaria das Municipalidades de São Paulo. Iniciou sua carreira artística no rádio, em 1929, e dois anos mais tarde participou do primeiro filme sonoro produzido no Brasil, “Coisas nossas”. Helena faleceu prematuramente, com apenas 28 anos, de ataque cardíaco, em sua casa, deixando seis 78 com doze músicas. Ei-la aqui no Columbia 22021, de 1931, interpretando de um lado, matriz 380984, o samba “Já cansei de chorar por você”, e , de outro, matriz 380991, uma deliciosa marchinha de Jayme Redondo, “Chi! Iaiá tá brava”.

De longa carreira no teatro de revista, a carioca Aracy Cortes (Zilda de Carvalho Espíndola, 1904-1985) não gravou tanto quanto poderia, talvez porque a maior parte de seus rendimentos viesse mesmo dos palcos. Já veterana, em 1965, participou do show “Rosa de ouro”, ao lado de Clementina de Jesus, Paulinho da Viola e Elton Medeiros, entre outros. Aracy está presente nesta edição com dois sucessos inesquecíveis lançados em selo Parlophon: o primeiro, lançado em novembro de 1928 em disco 12868, é o samba “Jura”, de Sinhô, lançado por ela na revista musicada “Microlândia”. Ironicamente, porém, ela a foi a segunda a gravá-lo, pois “Jura” teve dois registros na mesma sessão, fato inusitado: o primeiro por Mário Reis (matriz 2070, lançado com o selo Odeon, da qual a Parlophon era subsidiária), e em seguida o de Aracy (matriz 2071), ambos de sucesso e com acompanhamento da Orquestra Pan American de Simon Bountman, aqui como Simão Nacional Orquestra. Em seguida outro clássico, extraído do disco 12926-A, matriz 2366, lançado em março de 1929: “Iaiá”, ou “Meiga flor”, de Henrique Vogeler, Luiz Peixoto e Marques Porto, que ficou mais conhecido como “Ai, Ioiô”, considerado o primeiro samba-canção brasileiro, também cantado por Aracy na revista “Miss Brasil”. Tinha recebido duas letras anteriormente: a primeira por Freire Júnior (“Meiga Flor”), gravada por Francisco Alves, e a segunda por Cândido Costa (“Linda flor”), na voz de Vicente Celestino, mas a que pegou foi mesmo este “Ai, Ioiô”, com Aracy Cortes.

Logo depois, trazemos de volta a cantora-folclorista Elsie Houston (Rio de Janeiro, 1902-Nova York, EUA, 1943), agora interpretando um  motivo popular adaptado por Ary Kerner (também autor de “Na Serra da Mantiqueira” e “Trepa no coqueiro”, entre outras), o samba “Morena cor de canela”, extraído do disco Columbia 5217-A, lançado em junho de 1930, matriz 380649.

Na faixa seguinte, temos a carioca Laura Suárez (1909-c.1990), a primeira “garota de Ipanema” de que se tem notícia, afinal foi Miss Ipanema em 1929. Atuou também em teatro (ao qual dedicou mais de 50 anos de carreira) e cinema, tendo participado de filmes como ‘Tudo azul” e ‘Mulheres cheguei”. Só gravou na Brunswick, marca americana de curta duração entre nós, em 1930/31: 13 discos com 26 músicas, e aqui se apresenta com um samba de sua autoria, “Você… você”, lançado em setembro de 1930 pela Brunswick com o número 10092-B, matriz 422.

Encerrando, trazemos Neide Martins, cantora cuja biografia é uma incógnita. Ela deixou uma discografia escassa, e dela aqui está sua gravação de estreia, o frevo-canção “Que fim você levou?”, de Nélson Ferreira, para o carnaval pernambucano de 1937,  lançado em janeiro daquele ano pela Victor e gravado ainda em 10 de dezembro de 36, disco 34142-A, matriz 80293. Enfim, mais uma edição do GRB com cantoras que deixaram sua marca na história da MPB, e que não podem nem devem ser esquecidas.

TEXTO DE SAMUEL MACHADO FILHO